Por Rogério Guimarães Oliveira
Abro o “Correio do Povo” de quinta-feira (15/8/2013), página 3, e começo
a ler:
“O prefeito José Fortunati (PDT)
decidiu exonerar os cargos em comissão (CC) ocupados por indicação dos três
vereadores de sua base aliada que assinaram o requerimento de criação da CPI da
PROCEMPA na Câmara da Capital, protocolado ontem. As exonerações dos CC
indicados pelos vereadores Cláudio Janta (PDT), Lourdes Sprengler (PMDB) e
Séfora Mota (PRB) serão publicadas no Diário Oficial da Prefeitura de hoje.”
Para os desavisados, vamos traduzir isso. Algum tempo atrás, o prefeito
de Porto Alegre, José Fortunati (PDT), ao montar sua base de apoio na Câmara de
Vereadores, negociou da seguinte forma com os vereadores Janta, Sprengler e
Mota: “se vocês, que são vereadores
eleitos pelo povo, me indicarem pessoas de suas relações para ocuparem cargos
de confiança (CC) na prefeitura, eu nomeio essas pessoas e elas passam a ganhar
uma grana do erário público da cidade todos os meses. Então, em contrapartida a
esse meu generoso gesto com os seus amigos, assegurando a eles um dinheiro
público todo mês, vocês passam a votar lá Câmara conforme eu disser, OK?”
Acordo fechado! Os três vereadores toparam e indicaram pessoas de suas
relações para os cargos de CC na prefeitura. O prefeito nomeou todos os
indicados e os vereadores passaram a votar como quer o prefeito. E tudo ficou
“perfeito", diria o alcalde, “certinho”.
Porém, agora, quando estourou um escândalo de roubalheira na PROCEMPA,
nas gestões do PPS e do próprio PDT do prefeito (a PROCEMPA é a empresa pública que cuida do gerenciamento tecnológico
dos dados do município), vereadores da Câmara Municipal de Porto Alegre
resolveram criar uma CPI, o que causou imediatas urticárias na pele do prefeito
Fortunatti.
Alguns vereadores da colenda começaram, então, a colher assinaturas de
outros vereadores para o requerimento necessário para a criação desta CPI. Foi
então que os três referidos vereadores acima, os que entregaram seus mandatos
ao prefeito em troca da investidura de amigos aos cargos de CC na prefeitura,
resolveram assinar o requerimento de abertura da tal CPI.
O que ocorreu então? O prefeito, desgostoso com a indisciplina dos “transaentes”,
considerou rescindida a negociação e, imediatamente, retaliou-os, exonerando do
cargo de CC todas as pessoas indicadas pelos três vereadores rebeldes. É isso o
que retrata a notícia acima. É isso o que significará a publicação das
exonerações no Diário Oficial do município.
Ora, o que temos então é a confissão pública, lisa, pacífica e rematada,
do mais descarado mensalão praticado pelo governante do município de Porto
Alegre. Ou será que? Tudo exatamente igual ao mensalão que gerou a condenação e
a execração pública de José Dirceu, José Genuíno e de vários outros políticos
que integraram o primeiro mandato do PT no Palácio do Planalto. Repare bem: é
exatamente o mesmo tipo de negócio: a “compra” de parlamentares para compor a
base de apoio do governo à custa do erário público que paga os salários dos
tais cargos em comissão.
Isso torna acertadíssima a manifestação de estréia do novo ministro do
Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, quando ele afirmou que a
corrupção não pode ser politizada, com o que descolou do PT o esquema ocorrido
em 2005: "Não existe corrupção do PT, do PSDB ou do
PMDB. Existe corrupção. Não há corrupção melhor ou pior, dos ‘nossos’ ou dos
‘deles’. Não há corrupção do bem. A corrupção é um mal em si e não deve ser
politizada", disse o ministro Barroso em seu voto. E ele foi adiante,
tocando no nervo exposto que é o sistema político eleitoral do país, mostrando
que há uma matemática financeira que não pode ser fechada no campo da ética na
política, numa ‘coa’ simples: o custo médio de uma campanha para deputado
federal é de R$4 milhões, cargo esse cujo salário mensal é de R$20mil reais.
Evidentemente, temos aí uma conta que não fecha, pois, se eleito, o deputado
terá que trabalhar para os seus financiadores, estando aí aberto o caminho para
a corrupção dos mensalões.
Enquanto o STF gasta uma preciosa fatia de seu orçamento público
julgando as filigranas processuais relativas às condenações do processo do
mensalão, em Brasília, o país segue sua vida com todos os demais mensalões que
são operados em todo o país, em todos os níveis, como esse de Porto Alegre, que
foi publicamente assumido e confessado pelo próprio prefeito.
Enquanto isso, o país se debruça sobre um outro mensalão, que já é
chamado de “trensalão”, o escândalo da roubalheira dos governos tucanos de São
Paulo desde Mário Covas, passando pelas gestões dos ex-presidenciáveis José
Serra e Geraldo Alckmin. Só nesse caso, segundo dizem, mais de meio bilhão de
dólares teriam sido desviados do erário público para pagamento de propinas a
políticos corruptos de São Paulo. Onde está a CPI, onde está a ação penal?
Aliás, o Brasil é gerido por mensalões e mensalinhos há séculos. Onde
está a repercussão do mensalão da aprovação da emenda da reeleição no Congresso
articulada pelo FHC, enquanto era (nada menos) do que o Presidente da
República? Onde está a ação penal dos mensalões do Governador Azeredo [PSDB],
de MG (operado pelo mesmo Marcos Valério), e o do Roberto Arruda, do DEM, no
Distrito Federal (neste, chegaram até a filmar parlamentares enfiando dinheiro
vivo nas meias, bolsas e cuecas)? Cadê o estardalhaço da imprensa em torno das
denúncias comprovadas de roubos nas privatizações denunciadas no livro
“Privataria Tucana”? E a CPI e a ação penal agora, relativamente ao trensalão
do PSDB de São Paulo?
A imprensa repetiu à exaustão a entrevista de Geraldo Alckmin de que irá
processar a empresa alemã Siemens, por que ela é “ré confessa”. Conforme disse
o humorista José Simão, isto é o mesmo que o marido, após flagrado pela esposa
com marca de batom na camisa ao chegar em casa, reunir a imprensa para dizer
que irá processar o fabricante do batom!
O problema no Brasil é que a profusão de mensalões é tão intensa quanto
a hipocrisia que transborda no entorno de todos eles. Ou, como disse um outro
humorista: “mensalão ruim é o dos outros!”
Já agora, em agosto, começo a achar que todos aqueles que protestaram nas ruas
em junho passado podem ter desperdiçado suas energias e seus cartazes. Alguém
me comprove que estou errado, ‘pelamordedeus’!”
FONTE: contribuição do leitor Rogério
Guimarães Oliveira, advogado, para o site “Direto da Redação” (http://www.diretodaredacao.com/noticia/mensalao-ruim-e-o-dos-outros).
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