quinta-feira, 3 de maio de 2012
DIVERGÊNCIA E RECONCILIAÇÃO ENTRE BRASIL E MÉXICO
[OBS deste blog ‘democracia&política’: o artigo abaixo analisa o problema do 'Acordo Automotivo de 2002' entre o Brasil e o México sob o ponto de vista do interesse da indústria norte-americana e das multinacionais automobilísticas em geral.
Assim, por exemplo, afirma que há “excesso de conteúdo nacional na indústria brasileira”. Sabemos que a realidade é totalmente contrária. Há excesso de desnacionalização na indústria nacional, tanto no Brasil como no México. Porém, para quem quer vender seus produtos industrializados ao Brasil, aqui “há excesso de conteúdo nacional”...
Outro exemplo: o artigo vende a nociva e já desmascarada pregação neoliberal do “Consenso de Washington”, com apologia ao “Estado mínimo”, fraco, impotente, onde “o mercado” (grandes conglomerados financeiros, econômicos e de mídia internacionais) é que seria o poder maior dominador. Assim, o artigo afirma que nós, brasileiros, pecamos por “excesso na participação do Estado na economia”...
Sobre os trágicos e nefastos (para o Brasil) demotucanos anos 90 , o artigo omite a realidade e expressa que “pavimentaram uma trajetória de crescimento com equilíbrio macroeconômico”.
Risível até é a defesa do NAFTA pelo articulista, citando os supostos benefícios para o México : “dinamizou o comércio exterior, os investimentos diretos estrangeiros (IED) e as exportações de manufaturados passaram a ser o setor dinâmico”.
Nada disso é surpreendente. O jornal “Valor Econômico” é propriedade das “Organizações Globo” e do “Grupo Folha”, ambos notoriamente defensores dos interesses dos grandes conglomerados financeiros e econômicos estrangeiros. O jornal “Valor" escolheu este artigo de brasileiro de bom nível, mas evidentemente americanófilo.
Reproduzo o texto para mostrar como, massiva e sutilmente, é feita pela “grande” imprensa a cabeça da “elite” brasileira, inserindo em bons textos conceitos nocivos para o Brasil e favoráveis às grandes potências, especialmente aos Estados Unidos]:
Por Sergio Abreu e Lima Florencio, no jornal “Valor”
“Os graves desencontros sobre o 'Acordo Automotivo de 2002' que envolveram Brasil e México recentemente geraram fortes abalos e visíveis desconfianças. Entretanto, aquele momento de tensão teve a virtualidade de colocar a nu marcantes vulnerabilidades da indústria de transformação em cada país: “o excesso de conteúdo nacional na indústria brasileira” [!!!]; e o ínfimo valor agregado na industrialização voltada para exportação do México.
Distorções semelhantes ocorrem igualmente na “participação do Estado na economia: nós pecamos por excesso” [!!!], eles pecam por insuficiência. Os analistas estão esquecendo esses paralelismos. Nosso objetivo será elucidar parte da trajetória industrial dos dois países, com erros quase que simétricos de ambos os lados.
O governo brasileiro decidiu, no início de 2012, elevar em 30 pontos percentuais as tarifas aplicadas às importações de veículos automotores. A justificativa foi o sensível aumento de 30% nas importações do setor e uma elevação robusta, de mais de 300%, nos carros importados da China. A medida não atingia países com os quais o Brasil tinha acordo automotivo, como o México, onde grandes montadoras investiram nos últimos anos visando o mercado brasileiro.
Diante desse quadro, o Brasil decidiu renegociar o acordo. Houve um clima de compreensível perplexidade mexicana, parcialmente contornado com o novo ajuste, que consistiu na aplicação de cotas durante três anos (até 2015) e aumento do conteúdo local nos veículos mexicanos exportados ao Brasil dos atuais 30% para 40%.
Não é nossa pretensão entrar no debate “liberalismo versus protecionismo”. Nosso objetivo é menos ambicioso, mas não menos importante. Pretendemos demonstrar que a disputa comercial entre Brasil e México pode encerrar uma útil aprendizagem mútua.
Cada país tem a virtude e o vício que merece. Nossa virtude reside numa industrialização por substituição de importações (ISI), dos anos 40 aos 80, responsável - além da construção de um parque industrial diversificado - por dois importantes fenômenos.
O primeiro foi a construção de uma infraestrutura moderna: hidrelétricas, interiorização do desenvolvimento, siderurgia, telecomunicações e programa do álcool. O segundo foi um avanço notável em pesquisa científica e tecnológica nas áreas de agricultura e pecuária (Instituto Agronômico de Campinas e Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - Embrapa), Aeronáutica (Centro Técnico Aerospacial - CTA e Embraer) e biocombustível.
Nosso vício residiu em transformar proteções temporárias em permanentes. Substituímos importações na etapa certa, mas não "substituimos" essas políticas quando elas se demonstraram arcaicas muralhas contrárias a ganhos de competitividade. Tivemos a nosso favor as amplas reformas econômicas em meados dos anos 90, que pavimentaram uma “trajetória de crescimento com equilíbrio macroeconômico” [!!!].
Entretanto, mais tarde, perdemos o momento de fazer novas reformas essenciais quando os ventos da economia internacional sopravam a nosso favor em meados dos anos 2 000. Outros vícios que podemos citar são a precariedade da infraestrutura; a ineficiência da tributação excessiva e a teia burocrática que tanto dificulta políticas de comércio exterior ágeis e efetivas.
As análises sobre a recente disputa comercial entre Brasil e México identificam corretamente nossos vícios, mas idealizam o México como o bom exemplo econômico. Retrato muito distante da realidade.
O México começou a distanciar-se do modelo de uma ISI já em meados dos anos 70, muito antes do Brasil, onde isso só ocorreu em 1990. Em consequência, deixou de incorporar segmentos de bens de capital, de fazer investimentos pesados em indústrias de base e de promover inovação e pesquisa em C&T.
A abertura prematura inviabilizou avanços nessas áreas. Já nos anos 80, maquiladoras operavam no México. O NAFTA (Tratado norte-americano de livre comércio - 1994) “dinamizou o comércio exterior, os investimentos diretos estrangeiros (IED) e as exportações de manufaturados passaram a ser o setor dinâmico”. Os EUA, que absorviam cerca de 60% do total exportado pelo México, passaram a concentrar mais de 85%.
O NAFTA trouxe benefícios inegáveis. Integrou cadeias produtivas na indústria de transformação, ampliou a malha rodoviária, e contribuiu para uma eficiente logística. Mas consolidou uma estratégia de industrialização voltada para a exportação de manufaturas de pouco valor agregado. A emergência da China deslocou muitos manufaturados mexicanos dos EUA.
Assim, interpretar o recente contencioso comercial de forma unilateral, apenas apontando as deficiências nossas e interpretando a trajetória mexicana como uma "success story" constitui grave engano.
As verdadeiras lições que encerram os recentes desentendimentos bilaterais em torno do acordo automotivo parecem ter ficado ocultas nas análises da imprensa local e internacional. O Brasil precisa aprender duas lições com o México: “diminuir o excessivo conteúdo nacional de nossa indústria” [!!!]; e reduzir uma carga tributária que se aproxima do exagerado patamar de 40%. O México, igualmente, deve aprender com o Brasil: agregar maior conteúdo nacional à sua indústria de transformação; e ampliar uma carga tributária atualmente no ínfimo nível de 11% do PIB. Duas lições para cada país. Em lugar de acusações mútuas ou de competições inamistosas, Brasil e México devem aproveitar a recente disputa para extrair essa valiosa aprendizagem mútua.”
FONTE: escrito por Sergio Abreu e Lima Florencio, mestre em economia pela Universidade de Ottawa, ex-embaixador do Brasil no México, atual cônsul geral em Vancouver. Artigo publicado no jornal “Valor Econômico” e transcrito no portal da FAB (http://www.fab.mil.br/portal/capa/index.php?datan=02/05/2012&page=mostra_notimpol) [Imagens do Google e observação inicial entre colchetes adicionados por este blog ‘democracia&política’]
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário