sexta-feira, 12 de junho de 2015

O FALSO COMBATE DOS EUA AOS TERRORISTAS NO "SIRIAQUE"



   ISIS/ISIL/Daesh desfilam por vilas na Síria 


E o vencedor da Copa do Mundo Terrorista é...

Por Pepe Escobar, no "RT – Russia Today", com o título "And the winner of the Jihad World Cup is…". Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu e postado no "Redecastorphoto" 


   Pepe Escobar

"A coalizão de vontades que os EUA reuniram e que – supostamente – estaria combatendo contra os terroristas do "ISIS/ ISIL/ Daesh" em todo o “Siriaque” reuniu-se em Paris essa semana. Em teoria, examinaram o que fazer a seguir, depois de perderem Ramadi no Iraque e Palmyra na Síria.

Mas o roteiro parece saído diretamente do Manifesto Surrealista.

O nº 2 do Departamento de Estado dos EUA, Tony Blinken, jurou que Washington não tem qualquer dúvida quanto à sua estratégia “vencedora”. Insistiu que a estratégia “vencedora” matou no mínimo 10 mil jihadistas do "Califato fake". Um coro de espiões da CIA foi obrigado a arregalar os olhos.

Blinken também insistiu no “progresso”. Deve ter confundido essa história e o caso do FBI resolvendo prender uns figurões da FIFA. A coalizão, como era de esperar, apoiou Bagdá – com muita retórica e vagas promessas de mais armas, e exortou o governo a ser mais inclusivo na relação com tribos sunitas.

Ninguém tratou do assunto de que foi a base de apoio de Ba’athists entre os sunitas – pode-se chamá-los, à moda Donald Rumsfeld, de “remanescentes” do governo de Saddam – que assegurou o sucesso do "Califato fake" na província de Anbar. E por isso Bagdá não pode ser muito “inclusiva”.

A coalizão, também previsivelmente, praticamente nem falou da Síria. Não há absolutamente qualquer diferença ideológico-religiosa entre a "Frente al-Nusra" – ramo da al-Qaeda na Síria – e o "ISIS/ ISIL/ Daesh". Pois o Qatar e a Turquia dormem na mesma cama com a "Frente al-Nusra", ao mesmo tempo em que fazem crer que se oporiam ao "Califato fake".

Permanece a ficção de que a coalizão apoiaria “rebeldes moderados” remanescentes do "Exército Sírio Livre". Não resta nenhum rebelde “moderado”; todos eles migraram para a "Frente al-Nusra" ou para o "ISIS/ ISIL/ Daesh", porque é onde está a ação – de toneladas de armas, a verdadeiras proezas militares em solo.

E então há também o "Jaish al-Fatah" – o "Exército da Conquista"; fantástico híbrido gerado em novilíngua, que encobre o fato de que o Ocidente “progressista” – mancomunado com as proverbiais petromonarquias do Golfo vassalas – faz chover armamento e dinheiro sobre a "Frente al-Nusra". O "Exército da Conquista" não passa de coletivo nebuloso de formações variadas de takfiris dentre as quais a "Frente al-Nusra"; quaisquer supostas “alianças” que pareçam haver entre eles somem sempre nas areias do deserto.

A coisa fica ainda mais feia quando se sabe que Doha – via "al-Jazeera Arabic" – posa agora como patrocinadora oficial da "Frente al-Nusra", convidando seus líderes e tentando empenhadamente erigir uma (virtualmente inexistente) barreira entre a "Frente al-Nusra" e o "ISIS/ ISIL/ Daesh". Numa daquelas entrevistas, al-Nusra disse-o claramente:

(...) "o Ocidente não será atacado, à moda al-Qaeda, enquanto continuar a chover armas por lá, além de muitos dólares norte-americanos e euros."

A “missão” deles na Síria continua a ser “mudança de regime”; exatamente o que Doha, Ancara, Riad, Telavive e – por falar nisso – também Washington desejam.

A nova normalidade chama-se "al-Qaeda"

O jornal turco Cumhuriyet publica um vídeo em que se vê a agência turca de espionagem MIT entregando armas à al-Qaeda na Síria, em caminhões.

E isso enquanto Ancara insiste na ficção de que estaria treinando “moderados” para lutar com o "Califato fake". Nonsense: mais uma vez, não há mais “moderados”, só formações "takfiris". E só os “moderados” cruzarem a fronteira turco-síria, que viram "takfiris".


Siriaque - situação em campo (31/5/2015)

Entrementes, o "ISIS/ ISIL/ Daesh" prossegue firmemente em direção a Aleppo (Síria), tentando tomar vilas no nordeste da cidade. Desnecessário dizer, a “coalizão” só assiste ao movimento. O que torna tudo ainda mais absurdo é que uma série de grupos de oposição que se recusam a deixar-se rotular como "takfiris" – por exemplo os "Revolucionários Sírios" ou a "Frente do Levante" – mas estão lutando ao lado dos takfiris – pediram ao Pentágono que bombardeie sem piedade os bandidos do Califa.

Assim, enquanto o Pentágono reclama que está ficando sem alvos, e ao mesmo tempo em que é incapaz até para bombardear colunas de caminhonetes brilhantes no meio do deserto, e enquanto prosseguem as “conversações” em Paris, o "ISIS/ ISIL/ Daesh" está próximo de conquistar área extremamente estratégica, de Aleppo no norte, direto até a fronteira turca.

Se isso acontecer, todos – de soldados de Assad aos supostos “moderados” rebeldes – estarão sitiados.

Outro grupamento “moderado”, a "Frente al-Izz", está perto de separar-se da coalizão. O líder, Mustafa Sijari, fez uma declaração extraordinária: disse que teria recebido ordens do Pentágono para dar combate ao "ISIS/ ISIL/ Daesh" e esquecer Damasco. Assumindo que não seja mentira, será mais uma prova de que o Pentágono age como espectador – tipo “árabes que matem árabes”, qualquer árabe e acredite no que acreditar.

Quanto à “estratégia” de Washington, não há estratégia nenhuma. Os conselheiros de política exterior do autodescrito governo “Não faça merda coisa estúpida” de Obama são piada.

Facções pró-governo no Departamento de Estado argumentam que Washington não pode alienar Teerã, atacando Damasco, porque os EUA precisam do apoio iraniano – e farto sortimento de milícias xiitas – para dar combate ao "ISIS/ ISIL/ Daesh" no Iraque. Mesmo assim, na Síria, os EUA dependem dos tais impalpáveis “moderados” não só para lutarem contra do "Califato fake", mas também para ferir Damasco.

Pode-se começar a contar desde já as múltiplas variantes de tiros pelas culatras nesse cenário turvo. O "Império do Caos" é excelso fomentador – e do que seria? – de Caos. E quanto à destruição resultante, os locais que carreguem às costas as ruínas, enquanto o Império observa das coxias.

É sempre importante lembrar que as milícias tribais sectárias soltas no Iraque – e, em seguida, anos depois, na Síria – são consequência direta da “política” Made in USA de "Dividir para Governar", posta em ação depois da destruição inicial do estado no Iraque.

Resumo disso tudo: o caos continuará prevalente. O "ISIS/ ISIL/ Daesh" continuará a avançar na Síria, imune ao poder de fogo do Pentágono; mas pode ser efetivamente contra-atacado no Iraque, graças a milícias xiitas, não ao poder de fogo do Pentágono. Isso é o que o Departamento de Estado define como “estratégia vencedora”.

FONTE: escrito por Pepe Escobar, no "RT – Russia Today", com o título "And the winner of the Jihad World Cup is…". Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu e postado no "Redecastorphoto"  (http://redecastorphoto.blogspot.com.br/2015/06/pepe-escobar-e-o-vencedor-da-copa-do.html).
O autor, Pepe Escobar (1954), é jornalista, brasileiro, vive em São Paulo, Hong Kong e Paris, mas publica exclusivamente em inglês. Mantém coluna no Asia Times Online; é também analista de política de blogs e sites como: Sputinik, Tom Dispatch, Information Clearing House, Red Voltaire e outros; é correspondente/ articulista das redes Russia Today e Al-Jazeera. Seus artigos podem ser lidos, traduzidos para o português pelo Coletivo de Tradutores da Vila Vudu e João Aroldo, no blog redecastorphoto.
Livros do autor:
 Globalistan: How the Globalized World is Dissolving into Liquid War, Nimble Books, 2007.
 Red Zone Blues: A Snapshot of Baghdad During the Surge, Nimble Books, 2007.
 Obama Does Globalistan, Nimble Books, 2009.
Empire of Chaos, publicado no final de 2014 pela Nimble Books.

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