sábado, 14 de julho de 2012

O “CUSTO INFERNO” DA GUERRA SANTA DA OTAN


A Guerra Santa do Ocidente contra o Oriente (a antiga)

Por Pepe Escobar, no “Asia Times Online” 

 Pepe Escobar

“A Secretária de Estado dos EUA Hillary Clinton está ficando sem munição retórica na Guerra Santa dos EUA contra a Síria. Talvez seja o estresse de declarar uma guerra da OTAN pelas costas do Conselho de Segurança da ONU. Talvez, o estresse de ser almoçada e jantada, todos os dias, pelo ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergei Lavrov.

 Hillary Clinton

Hillary acaba de convocar “as potências ocidentais” e seus fantoches árabes – o CCGOTAN, aglomerado de “Conselho de Cooperação do Golfo” plus “Organização do Tratado do Atlântico Norte”, que ela apresenta como se fosse alguma “comunidade internacional” – para que “deixem claro que Rússia e China pagarão por impedir o progresso” (da mudança armada de regime na Síria).

Em não-novilíngua, significa: “Se impedirem nossa nova guerra, haverá retaliação”.

Não obstante as gargalhadas ouvidas pelos corredores do Kremlin e do Zhongnanhai, a coisa mostra o quão desesperado está o conglomerado CCGOTAN para forçar a mudança de regime na Síria, a ser usada como meio para interromper a conexão privilegiada que liga o Irã ao mundo árabe. Isso tudo enquanto o primeiro-ministro Recep Tayyip Erdogan da Turquia – no comando do flanco oriental da OTAN – comicha de vontade de atacar a Síria, mas não encontra jeito de vender a ideia à opinião pública turca. 

Nesse contexto incandescente, aparece WikiLeaksque divulgou grande quantidade de mensagens de e-mail contra, simultaneamente, o sistema de Assad e os “rebeldes” da OTAN. Um dos efeitos colaterais possíveis, os e-mails talvez inspirem ondas de chamados “progressistas” em todo mundo, que se porão a defender a Guerra Santa contra a Síria. Efeito mais realista, talvez evidenciem o quanto, de fato, os dois lados são horríveis: tanto o estado policial de Assad quanto a oposição armada.

EXPLOSÃO DE CARRO DE TURISMO: ALGUÉM SE INTERESSA?

Útil, neste momento, é examinar o preço que a própria Washington, para nem falar nos seus estados fantoches na OTAN, está pagando por tanto insistir nesse neo-ramo de guerra santa, guerreada contra – nada mais, nada menos – o mesmo bando de “terroristas” que, até ontem, ameaçavam destruir a civilização ocidental, convertendo-a num Califato tamanho gigante.

              Conselho de Segurança da ONU

Washington, Londres e Paris tentaram – duas vezes – arrancar do Conselho de Segurança da ONU a “licença” para mais uma guerra. Foram bloqueadas pela Rússia e pela China.

O “plano B”, então, é esquecer a ONU e deflagrar guerra da OTAN. O problema é que a OTAN não tem estômago – nem dinheiro – para meter-se em guerra de alto risco contra país capaz de se defender.

Plano C”: se nem A nem B, o “plano C” é apostar tudo numa longa guerra civil, usando para tal fim o “Exército Sírio (nada) Livre”, que pulula de mercenários e jihadis, e o bando de exilados oportunistas que atende pela sigla de “Conselho Nacional Sírio” (CNS).

O CNS já pediu uma “zona aérea de exclusão” ao estilo líbio, sobre a Síria – expressão que é sinônima de “guerra da OTAN”. A Turquia também requisitou formalmente à OTAN a dita “zona aérea de exclusão”.

Os comandantes da OTAN são incompetentes, mas até eles aprenderam alguma coisa com as grandes enrascadas em que se meteram e o correspondente embaraço que lhes causam (no Afeganistão, por exemplo). Responderam “não” aos pedidos do CNS e da Turquia.

Nada menos representativo que o “Conselho Nacional Sírio” e o “Exército Sírio (nada) Livre”. Os “Amigos da Síria” – “Hillary & seus Patetas” – nem tomam conhecimento da existência do “Corpo Nacional de Coordenação para Mudança Democrática” [orig. National Coordination Body for Democratic Change (NCB)], principal movimento de oposição verdadeira, composto de 13 partidos políticos, a maioria dos quais da esquerda, nacionalistas árabes e um partido curdo. Esse NBC denuncia, insistente e firmemente, todas as formas de militarização do conflito e, absoluta e radicalmente, o “Exército Sírio (nada) Livre”.

            Hoshyar Zebari

O ministro de Relações Exteriores do Iraque, Hoshyar Zebari – que é curdo – alertou que jihadis salafistas, de molde copiado da al-Qaeda, estão se mudando aos magotes para a Síria. Aparentemente, esses magotes ainda ouvem muito atentamente o que prega o ideólogo “invisível” da al-Qaeda, Dr. Ayman al-Zawahiri. Há cinco meses, al-Zawahiri deu ordem de marcha aos jihadis no Iraque, Jordânia, Líbano e Turquia. E acontece também que muitos deles estão recebendo armas – por diferentes redes – da Casa de Saud e do Qatar.

Já há meses, todos sabem que o “Grupo de Combate Islâmico Líbio” [orig. Libyan Islamic Fighting Group (LIFG)] de Abdul Hakim Belhaj, ligado à al-Qaeda, está ativo na Síria; como todos também sabem que há remanescentes da al-Qaeda no Iraque responsáveis por explosões de carros até em Damasco.

No caso de uma Síria pós-Assad dominada por sunitas linha-dura infiltrados por jihadis wahhabitas e salafistas, a retaliação garantida fará a jihad antissoviética no Afeganistão pós-80’s parecer Disneylândia em Hong Kong.

ACEITAM-SE YUAN E RUBLOS

Quanto à China, ri do desespero de Hillary no caminho até o banco. Enquanto cresce a paranóia na Casa de Saud contra o que os sauditas veem como flerte de Obama com a democracia no mundo árabe, Pequim aquece as turbinas comerciais e entrega a Riad um buquê de novos mísseis.

E, enquanto o “ocidente” flerta com a Guerra Santa, as empresas estatais chinesas compram mercadorias feito doidas, por todo o Oriente Médio, Norte da África e América do Sul – além de ampliar seus estoques de terras raras nas reservas estratégicas. A China produz nada menos que 97% das terras raras do planeta – necessárias para tudo, de iPads àqueles novos mísseis que lá fritam hoje, sob o sol do deserto da Arábia.

Outros efeitos colaterais em matéria de “o preço a pagar” por atropelar a ONU e pela obsessão com a OTAN como Robocop global serão inevitáveis para os EUA. Não se deve esquecer que a Guerra Santa contra a Síria é pit stop na estrada para Teerã. Por exemplo: pode estar nascendo um novo sistema de seguro marítimo, além de um novo mecanismo de câmbio internacional – que ignorará o diktat do ocidente.

Mesmo assim, o elemento mais importante parece ser o movimento de Rússia, Irã e China para reorganizar o mercado global de energia, via transações que marginalizam o petrodólar.

Quer dizer: Washington corta o Irã do sistema SWIFT (Society for Worldwide Interbank Financial Telecommunication)? O banco central iraniano contra-ataca: se vocês quiserem negociar conosco, podem pagar em qualquer moeda, exceto o dólar norte-americano; também aceitamos ouro.

Esse é o Santo Graal da Guerra Santa – não a Síria. Uma coisa, para Teerã, é aceitar euros em pagamento pelo óleo e gás iranianos; outra coisa é aceitar ouro. E, como se não bastasse, com pleno apoio de Rússia e China.

Em resumo: toda a síndrome da Guerra Santa está apressando o fim do dólar norte-americano como moeda global de reserva.

E então? Agora, acontecerá o quê? Uma “Primavera Norte-americana”? Ou as elites dos EUA terão – feito a Máfia – colhões e musculatura para forçar Rússia e China a pagarem o preço?” 

FONTE: escrito por Pepe Escobar, no “Asia Times Online - The Roving Eye”, com o título original There will be hell to pay for NATO's Holy War”. Transcrito no blog “Redecastorphoto” traduzido pelo “pessoal da Vila Vudu” (http://redecastorphoto.blogspot.com.br/2012/07/pepe-escobar-o-custo-inferno-da-guerra.html).

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