Por Eduardo Guimarães
“O filme já se tornou velho. Ao longo da década passada, escândalos
envolvendo o governo tucano do Estado de São Paulo explodiram várias vezes na
internet e durante semanas, e até meses, a grande imprensa, o Judiciário e o
Legislativo paulistas fingiram que não viram, mesmo nos casos em que tais
escândalos, no exterior, rendiam capas e capas de jornais e revistas.
O caso Alstom, por exemplo, explodiu em 2008. Houve denúncias de
pagamentos de propina pela empresa francesa Alstom a políticos do PSDB. As
denúncias eram feitas sistematicamente por órgãos de imprensa estrangeiros como
“Wall Street Journal” e “Der Spiegel”, mas, no Brasil, ficavam restritas à
internet até que não fosse mais possível segurar.
Meses após o surgimento da denúncia, a imprensa paulista soltou algumas
matérias de modo absolutamente episódico, sem martelar como faz quando a
denúncia é contra o PT, que, por sua vez, sempre pede CPI na Assembleia
Legislativa de São Paulo para investigar a profusão de escândalos tucanos e
nunca consegue por não ter deputados estaduais em número suficiente.
Agora, surge a autodenúncia da empresa alemã Siemens, de que corrompeu
os governos Mario Covas, Geraldo Alckmin e José Serra. Exatamente da mesma forma
que a francesa Alstom. E, como naquele caso, tucanos voltam a debitar as
denúncias, da própria roubalheira, ao PT, como se esse pudesse obrigar duas
grandes transnacionais de dois países diferentes e grandes órgãos de imprensa
de alcance mundial a envolverem o PSDB em denúncias falsas de corrupção.
É longa a lista de escândalos envolvendo o PSDB que jamais foram
investigados até o fim tanto por leniência do Ministério Público de São Paulo
quanto da Justiça e da grande imprensa local, que segura o quanto pode
denúncias como essa da Siemens, que, mais uma vez, demorou semanas para chegar
a grandes jornais, revistas e televisão, apesar da forte repercussão na
internet.
O esquema de corrupção no metrô de São Paulo foi denunciado pela
primeira vez em 2008 pelo jornal norte-americano “The Wall Street Journal”. A
matéria revelou investigação conduzida pela polícia suíça acerca de pagamento
de propinas estimadas em 6,8 milhões de dólares pela francesa Alstom a
funcionários do governo paulista a fim de obter contrato de 45 milhões de reais
para fornecer equipamentos utilizados nas obras de expansão do metrô
paulistano.
As polícias suíça e francesa repassaram às autoridades brasileiras uma
lista com nomes de suspeitos de participar do esquema em diferentes países.
Entre os acusados, um brasileiro. Ele teria negociado com a Alstom um contrato
com o governo paulista em troca de “comissão” de 7,5%.
Naquele ano, a bancada do Partido dos Trabalhadores (PT) na Assembleia
Legislativa paulista tentou abrir uma CPI por conta das informações das
autoridades europeias sobre contratos julgados irregulares pelo Tribunal de
Contas do Estado de São Paulo (TCE), envolvendo a Alstom, o metrô, a CPTM e a
Companhia Energética de São Paulo (CESP).
A maior parte daqueles contratos foi firmada nos governos Mário Covas e
Geraldo Alckmin. No governo José Serra, houve aditivos nos contratos com a
Alstom para fornecimento de 22 trens, no valor de dois bilhões de reais (!!!)
Para que se tenha uma ideia do tamanho do escândalo, um dos contratos
entre a Alstom e o metrô foi mantido por dez anos a mais do que o estipulado
inicialmente. Só um conselheiro do TCE votou a favor desse contrato: Robson
Marinho, que foi ex-secretário da Casa Civil durante o governo Mário Covas e
que fora assistir à Copa do Mundo na França em 1998 com despesas comprovadamente
pagas pela francesa Alstom (!!!).
As investigações foram sumariamente enterradas pela Justiça e pelo
Legislativo paulistas. A CPI da Alstom, pedida pelo PT, foi suspensa pelo
desembargador Armando Toledo, do Tribunal de Justiça de São Paulo. Na imprensa,
silêncio.
O caso voltou episodicamente à imprensa em 2011. O “portal R7” publicou
reportagem sobre novas informações sigilosas fornecidas por testemunha anônima
que teria acompanhado de perto os contratos entre o governo paulista e a Alstom.
Entre as novidades, o envolvimento de outra multinacional europeia com o PSDB
paulista, a alemã Siemens.
Como no caso envolvendo a empresa francesa três anos antes, ressurge
acusação de pagamento de propinas a membros do governo paulista para a obtenção
de contratos com o Metrô de São Paulo e com a CPTM. Agora, uma empresa alemã
chega a confessar que corrompeu o governo do PSDB.
Mais uma vez, em 2011 tampouco houve investigação séria no Brasil. Como
subproduto dessa licença para roubar concedida ao PSDB paulista, em Julho de
2013 explode novo escândalo. Desta vez, foi preciso o corruptor confessar que
comprou autoridades do governo paulista para que saísse alguma coisa na
imprensa local.
Apesar de cabeças estarem rolando na Siemens da Alemanha, com demissões
e prisões e com confissões no Brasil por conta de um escândalo que envolve
desvios de 425 milhões de reais [valor não atualizado], o assunto só chegou à
grande imprensa brasileira na semana que finda.
Como de costume, os detalhes da roubalheira no governo de São Paulo
denunciada por duas empresas distintas de dois países europeus distintos vão
perdendo espaço na imprensa brasileira para acusação tucana contra o Conselho Administrativo de Defesa Econômica
(CADE), de que “teria inventado tudo a mando do PT” (o órgão é controlado pelo governo federal).
Essa extensa rede de corrupção na administração pública do Estado de São
Paulo, fenômeno que já dura quase duas décadas, tornou o metrô paulistano o
mais lotado do mundo, com incidência frequente e crescente de pequenos
acidentes que, mais dia, menos dia, produzirão um grande desastre, pois o
sistema opera, há muito, acima de sua capacidade.
O metrô de São Paulo foi inaugurado em 1974 com apenas seis estações e
extensão de 16,7 quilômetros. À época, a cidade tinha cerca de seis milhões de
habitantes. Hoje, são cerca de onze milhões, enquanto que a rede de metrô
possui 74,3 quilômetros – a menor do
mundo para uma cidade de grande porte.
O conceito internacional sobre lotação aceitável – porém não ideal – de trens de metrô e de subúrbio é de seis
passageiros por metro quadrado; o metrô de São Paulo tem hoje nas suas três
principais linhas – que atraem quase 80%
dos passageiros do sistema – lotação entre 7 e 8 passageiros por metro
quadrado. E, nos trens de subúrbio, a situação é bem pior.
Em uma época em que a tragédia em que se converteu a mobilidade urbana
em São Paulo levou dezenas de milhares de paulistanos à rua para protestar
contra o preço das passagens no transporte público, não se entende por que aqueles
protestos não se deram por conta de toda essa roubalheira do governo do Estado,
que tornou tão dura a vida das pessoas independentemente de classe social, pois
o transporte precário da cidade afeta até quem anda de carro, poupando só uma
minoria infinitesimal que fez dessa mesma cidade a campeã mundial em frota de
helicópteros.
O surgimento das denúncias da Siemens, porém, acordou o movimento social
que conseguiu pôr bastante gente na rua para fazer um protesto ridículo pela
redução de vinte centavos nas tarifas de ônibus e metrô, enquanto centenas de
milhões de reais que poderiam tornar o transporte melhor [e até gratuito] são
roubados escandalosamente sem que ninguém seja responsabilizado.
Se a energia despendida inutilmente para transferir o custo dos vinte
centavos a menos nas passagens para os impostos que o paulistano paga for usada
para exigir investigações sérias contra um esquema mafioso para o qual os
cidadãos afetados não dão bola, a máfia tucana pode, finalmente, pagar pelos
seus crimes ao longo dos últimos vinte anos.
No próximo dia 14 de agosto, o “Movimento Passe Livre” promete fazer um
protesto contra essa barbárie que vige na maior cidade do país. É um protesto
que não interessa apenas aos paulistanos, mas a todo o país. Se CPI e outras
investigações contra a máfia tucana forem finalmente abertas sob pressão das
ruas, a eterna impunidade dela poderá chegar ao fim.”
FONTE: escrito por Eduardo Guimarães em
seu blog “Cidadania” (http://www.blogdacidadania.com.br/2013/08/so-as-ruas-podem-por-fim-a-mafia-tucano-midiatica-de-sao-paulo/).
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