Itamar Franco (PMDB) poderia ter dado queixa do roubo da glória do Real pelo PSDB
Por Paulo Moreira Leite
"Com ideias que o eleitor já rejeitou em 2002, 2006 e 2010, o aniversário do Real vira encontro de nostalgias
Muitas coisas me incomodam nos festejos de 20 anos do Real.
Nem vou falar que estão comemorando o Real quando quem faz aniversário, nesses dias, é a URV. Marketing?
Nem vou falar que o presidente que criou o Real foi Itamar Franco [PMDB], que merecia um lugar de honra em cada celebração, em cada discurso.
Talvez para dar a impressão de que era uma obra única, exclusiva, muitos tucanos gostam de fingir que o presidente que assinou o URV e o Real foi uma Rainha da Inglaterra nessa história. Está errado. Para quem até hoje reclama direitos autorais pelo "Bolsa Família", é muito feio ignorar o papel de Itamar Franco.
Outro aspecto é que a celebração tornou-se um encontro de nostalgias da década de 1990, quando o pensamento neoliberal dava a impressão que iria durar para sempre.
De lá para cá, nós tivemos o colapso da paridade cambial, que levou à falência grandes grupos econômicos brasileiros, que chegaram de joelhos ao final do governo FHC.
Também tivemos a crise de 2008, a maior da história do capitalismo desde 1929.
Nesses momentos, como o PSDB reagiu?
Sempre se recusou a fazer o contra-ciclo da recessão econômica, lição básica de John M Keynes para principiantes.
A política monetária de Pedro Malan apenas aprofundava as crises, aumentava o desemprego. Pagando juros cada vez mais altos, explodiu as contas do Estado e gerou mais inflação.
Apesar disso, nossos sábios comemoram o Real, e reclamam que a população não tem memória. É exatamente o contrário. E é isso que torna difícil competir em 2014.
Sonham em fazer o mundo voltar a 1994 quando, por merecidas razões, Fernando Henrique e o PSDB tiveram, pela primeira e até hoje única vez em sua existência, uma ligação real com as camadas pobres do povo.
É curioso que Gustavo Loyola, um dos inúmeros presidentes do BC no governo Fernando Henrique – o que dá uma ideia da instabilidade de uma instituição que os tucanos querem tornar independente – chegou a reclamar que tudo ficou pior na economia brasileira depois de 2008.
Pois é. Em 2008, o mundo quebrou e o Brasil ficou de pé depois de um tropeção. A economia voltou a crescer. Os empregos continuaram em alta, o mercado interno se ampliou, a distribuição de renda prosseguiu. Ainda hoje, o desemprego é o menor da história e o crescimento em 2013, que todo mundo sabe que não foi grande coisa, já superou a média dos oito anos de FHC.
A partir de uma injeção generosa de recursos públicos nas linhas de crédito e outros estímulos, o Estado brasileiro faz o contra-ciclo a partir de 2008. Quem estava no ciclo virou a Grécia, Espanha, Itália, subjugados pela prioridade máxima do Banco Central europeu em preservar os investimentos financeiros alemães. Queriam ajudar o mercado a fazer seu serviço, destruindo benefícios e conquistas históricas do bem-estar social.
O Brasil foi para o contra-ciclo. Não vamos falar que ficou tudo às mil maravilhas. Mas imagine quem se deu melhor.
Eu sei, você sabe.
Mas a turma que se reuniu para festejar a URV dizendo que era "aniversário do Real" sempre acreditou no fim da história e na supremacia definitiva do mercado sobre todas as coisas.
Acreditou tanto que seu Banco Central tinha criado uma moeda imortal que estimulou os empresários a enfiar o pé na jaca das dívidas em dólar. Quando a canoa virou, todos naufragaram. Nossas reservas eram uma casca de ovo, o que deveria levar a turma a lembrar que, em 2014, temos reservas de 300 e tantos bilhões de dólares em vez de estimular o terrorzinho das agências de risco, o que é muito feio para autoridades que já ocuparam postos de alta responsabilidade num Estado nacional e sabem a diferença que isso faz.
Em 2008, o governo tucano de São Paulo preparou um plano de demissão em massa para enfrentar a crise. Queriam até suspender a CLT por seis meses – o que iria dar até uma crise política de bom tamanho.
Loucura?
Nem tanto. Para Pérsio Árida, um dos presentes na festa da URV, o “Estado deveria funcionar com uma empresa privada.”
Ninguém esqueceu como o ministro do Trabalho de FHC falava de desemprego. Era “empregabilidade.” Não era vida real. Era debate teórico.
Assim, na crueldade.
Com tais receitas, a Dilma deveria abrir mão do horário politico e pedir para esse povo defender essas ideias na TV. Deveria mandar o Eduardo Cunha levar sua turma para a campanha da oposição.
Assim, eles teriam todo tempo do mundo para explicar como o Brasil era tão bom que foi parar no FMI, que só assinou a acordo depois que os sucessores de FHC também assinaram. Quanta credibilidade, não?
Poderiam lembrar que o governo era tão querido que tinha popularidade negativa em 13 pontos, coisa de protestos de junho sem os protestos de junho."
FONTE: escrito por Paulo Moreira Leite, diretor da sucursal da revista ISTOÉ em Brasília. É autor de "A Outra História do Mensalão". Foi correspondente em Paris e Washington e ocupou postos de direção na VEJA e na Época. Também escreveu "A Mulher que Era o General da Casa" (http://www.istoe.com.br/colunas-e-blogs/colunista/48_PAULO+MOREIRA+LEITE). [Imagem do google adicionada por este blog 'democracia&política'].
"Com ideias que o eleitor já rejeitou em 2002, 2006 e 2010, o aniversário do Real vira encontro de nostalgias
Muitas coisas me incomodam nos festejos de 20 anos do Real.
Nem vou falar que estão comemorando o Real quando quem faz aniversário, nesses dias, é a URV. Marketing?
Nem vou falar que o presidente que criou o Real foi Itamar Franco [PMDB], que merecia um lugar de honra em cada celebração, em cada discurso.
Talvez para dar a impressão de que era uma obra única, exclusiva, muitos tucanos gostam de fingir que o presidente que assinou o URV e o Real foi uma Rainha da Inglaterra nessa história. Está errado. Para quem até hoje reclama direitos autorais pelo "Bolsa Família", é muito feio ignorar o papel de Itamar Franco.
Outro aspecto é que a celebração tornou-se um encontro de nostalgias da década de 1990, quando o pensamento neoliberal dava a impressão que iria durar para sempre.
De lá para cá, nós tivemos o colapso da paridade cambial, que levou à falência grandes grupos econômicos brasileiros, que chegaram de joelhos ao final do governo FHC.
Também tivemos a crise de 2008, a maior da história do capitalismo desde 1929.
Nesses momentos, como o PSDB reagiu?
Sempre se recusou a fazer o contra-ciclo da recessão econômica, lição básica de John M Keynes para principiantes.
A política monetária de Pedro Malan apenas aprofundava as crises, aumentava o desemprego. Pagando juros cada vez mais altos, explodiu as contas do Estado e gerou mais inflação.
Apesar disso, nossos sábios comemoram o Real, e reclamam que a população não tem memória. É exatamente o contrário. E é isso que torna difícil competir em 2014.
Sonham em fazer o mundo voltar a 1994 quando, por merecidas razões, Fernando Henrique e o PSDB tiveram, pela primeira e até hoje única vez em sua existência, uma ligação real com as camadas pobres do povo.
É curioso que Gustavo Loyola, um dos inúmeros presidentes do BC no governo Fernando Henrique – o que dá uma ideia da instabilidade de uma instituição que os tucanos querem tornar independente – chegou a reclamar que tudo ficou pior na economia brasileira depois de 2008.
Pois é. Em 2008, o mundo quebrou e o Brasil ficou de pé depois de um tropeção. A economia voltou a crescer. Os empregos continuaram em alta, o mercado interno se ampliou, a distribuição de renda prosseguiu. Ainda hoje, o desemprego é o menor da história e o crescimento em 2013, que todo mundo sabe que não foi grande coisa, já superou a média dos oito anos de FHC.
A partir de uma injeção generosa de recursos públicos nas linhas de crédito e outros estímulos, o Estado brasileiro faz o contra-ciclo a partir de 2008. Quem estava no ciclo virou a Grécia, Espanha, Itália, subjugados pela prioridade máxima do Banco Central europeu em preservar os investimentos financeiros alemães. Queriam ajudar o mercado a fazer seu serviço, destruindo benefícios e conquistas históricas do bem-estar social.
O Brasil foi para o contra-ciclo. Não vamos falar que ficou tudo às mil maravilhas. Mas imagine quem se deu melhor.
Eu sei, você sabe.
Mas a turma que se reuniu para festejar a URV dizendo que era "aniversário do Real" sempre acreditou no fim da história e na supremacia definitiva do mercado sobre todas as coisas.
Acreditou tanto que seu Banco Central tinha criado uma moeda imortal que estimulou os empresários a enfiar o pé na jaca das dívidas em dólar. Quando a canoa virou, todos naufragaram. Nossas reservas eram uma casca de ovo, o que deveria levar a turma a lembrar que, em 2014, temos reservas de 300 e tantos bilhões de dólares em vez de estimular o terrorzinho das agências de risco, o que é muito feio para autoridades que já ocuparam postos de alta responsabilidade num Estado nacional e sabem a diferença que isso faz.
Em 2008, o governo tucano de São Paulo preparou um plano de demissão em massa para enfrentar a crise. Queriam até suspender a CLT por seis meses – o que iria dar até uma crise política de bom tamanho.
Loucura?
Nem tanto. Para Pérsio Árida, um dos presentes na festa da URV, o “Estado deveria funcionar com uma empresa privada.”
Ninguém esqueceu como o ministro do Trabalho de FHC falava de desemprego. Era “empregabilidade.” Não era vida real. Era debate teórico.
Assim, na crueldade.
Com tais receitas, a Dilma deveria abrir mão do horário politico e pedir para esse povo defender essas ideias na TV. Deveria mandar o Eduardo Cunha levar sua turma para a campanha da oposição.
Assim, eles teriam todo tempo do mundo para explicar como o Brasil era tão bom que foi parar no FMI, que só assinou a acordo depois que os sucessores de FHC também assinaram. Quanta credibilidade, não?
Poderiam lembrar que o governo era tão querido que tinha popularidade negativa em 13 pontos, coisa de protestos de junho sem os protestos de junho."
FONTE: escrito por Paulo Moreira Leite, diretor da sucursal da revista ISTOÉ em Brasília. É autor de "A Outra História do Mensalão". Foi correspondente em Paris e Washington e ocupou postos de direção na VEJA e na Época. Também escreveu "A Mulher que Era o General da Casa" (http://www.istoe.com.br/colunas-e-blogs/colunista/48_PAULO+MOREIRA+LEITE). [Imagem do google adicionada por este blog 'democracia&política'].
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