domingo, 4 de setembro de 2011

Paulo Nogueira Batista Jr: A QUEDA DOS JUROS


Por Paulo Nogueira Batista Jr

“Escrevo de Paris, leitor, onde estou para reuniões do G-20 e do FMI. Essas reuniões costumam ser longas e penosas. A primeira durou dez horas! Já havia resolvido não escrever a coluna para o sábado.

Eis que fui surpreendido pela decisão do Banco Central de reduzir em 0,5 ponto percentual a taxa básica de juro. Bela surpresa. Ora, o economista que lhes escreve passou anos e anos reclamando da política de juros do Banco Central. Nada mais justo, nada mais apropriado do que fazer um esforço especial para escrever hoje –mesmo depois de uma reunião de dez horas.

Pega no contrapé, a turma da bufunfa deve estar ventando fogo pelas narinas. Daqui de longe, fico imaginando investidores e economistas de banco dando os proverbiais arrancos triunfais de cachorro atropelado. Mas a decisão do Banco Central foi correta, e traz mais benefícios do que custos e riscos, no meu entender.

O Banco Central usou três argumentos para explicar a sua decisão: a) a marcada deterioração do cenário internacional; b) a desaceleração da economia brasileira; e c) a revisão do cenário para a política fiscal.

O principal argumento é o primeiro. Alguns críticos da decisão estão dizendo que o Banco Central exagerou na descrição do quadro externo. Parece bem claro, entretanto, que a piora do contexto mundial, principalmente nos EUA e na zona do euro, foi realmente abrupta; eu diria mesmo: dramática. Falei a esse respeito na coluna de sábado retrasado.

O meu local de trabalho, a diretoria do FMI, é um ponto de observação privilegiado. Posso lhe assegurar, leitor, que o clima no Fundo é de extrema preocupação, quase alarme. Teme-se que a economia dos principais países desenvolvidos possa sofrer crise semelhante àquela que ocorreu depois do colapso do banco Lehman Brothers em 2008.

O que não poderia acontecer de modo algum era o Banco Central repetir o seu comportamento daquela ocasião. Em 10 de setembro de 2008, a taxa básica de juro havia sido aumentada de 13% para 13,75% no Brasil. Menos de uma semana depois, no dia 15 de setembro, veio o colapso do Lehman, fato que desencadearia uma crise financeira em escala global com forte efeito recessivo na economia brasileira. Mesmo assim, numa inexplicável inércia, o Banco Central manteve a taxa em 13,75% nas reuniões de outubro e dezembro, reduzindo a taxa apenas em janeiro –só depois que o nível de atividade econômica despencou no Brasil!

Recorde-se que, naquela época, antes de sofrer o violento choque externo, a economia brasileira vinha crescendo rapidamente. Agora, ao contrário, ela se encontra em franca desaceleração. Mais uma razão para se antecipar aos fatos e começar a reduzir, desde logo, a estratosférica taxa de juro brasileira. Diga-se de passagem que, mesmo depois dessa redução, ela ainda é, e por larga margem, a mais alta do mundo em termos reais.

A chave é manter uma política fiscal ultradisciplinada, o que permitirá continuar diminuindo a taxa de juro gradualmente. Até agora, os resultados das contas públicas são favoráveis: o superávit primário tem sido maior e o déficit nominal menor do que em 2010. O governo acaba de aumentar a meta para o superávit primário em 2011, um movimento programado para dar cobertura à redução dos juros.

A queda da taxa de juro ajudará no equilíbrio das contas públicas ao reduzir o custo da dívida pública, inclusive o de carregar as reservas internacionais do país. Além disso, juros menores combinados com controles de capital e medidas macroprudenciais ajudarão a corrigir o grave problema da sobrevalorização cambial.

Abriu-se uma oportunidade para corrigir o mix de políticas monetária e fiscal no Brasil, um problema antigo que causa distorções importantes. Com a Fazenda e o Banco Central atuando de maneira coordenada, essa oportunidade pode ser aproveitada com grandes benefícios para o desenvolvimento do país, notadamente a superação do custoso binômio juro alto/câmbio sobrevalorizado que nos atormenta há décadas.”

FONTE: escrito por Paulo Nogueira Batista JR, publicado no jornal “O Globo” e transcrito no blog “Projeto Nacional”  (http://blogprojetonacional.com.br/a-queda-dos-juros/)

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