quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016

TRATAMENTO DA JUSTIÇA E DA MÍDIA PARA O PSDB E O PT VIROU TRAGICOMÉDIA DE TÃO DESIGUAL




Pau que bate em Luiz bate em Fernando?

"FHC é tratado pela mídia como "grande estadista" e nunca foi incomodado pelo MP ou pela PF. Em relação a Lula, a disposição é outra: uma canoa vira iate.


Por Guilherme Boulos

No apagar das luzes de seu mandato, o ex-presidente promoveu [com dinheiro público] um jantar no Palácio do Planalto para a nata do PIB nacional - Odebrecht, Gerdau, Lázaro Brandão, entre outros - com direito a [caríssimo] vinho francês e refinado menu. Mas o prato principal era obter dinheiro [linguagem eufêmica para "propina"] para o financiamento de seu instituto após sair da Presidência. Conseguiu naquela noite a bagatela de R$ 7 milhões [equivalentes hoje a R$ 18 milhões].

O filho do ex-presidente teve as contas de um hotel de luxo em Ipanema, onde morou por certo período, pagas por um grupo empresarial do setor têxtil. Andava pra lá e pra cá de BMW e tinha um jatinho permanentemente à sua disposição. Isso tudo com o pai ainda na Presidência da República.

O ex-presidente e seu partido foram acusados por certo senhor, que foi seu Ministro de Estado e figura ativa na campanha eleitoral, de terem apropriado nada menos que R$ 130 milhões de "sobras de campanha" em sua primeira eleição, sendo R$ 100 milhões de "caixa dois" [equivalentes hoje a R$ 615 milhões]. Disse ainda que o recurso foi provavelmente enviado ao exterior.

O nome desse ex-presidente é Fernando Henrique Cardoso. O filho pródigo é Paulo Henrique Cardoso. E o acusador dos desvios na campanha de 1994 é José Eduardo de Andrade Vieira, banqueiro que foi ministro da Agricultura de FHC.

Nenhum desses fatos é novidade. Mas não renderam dez minutos no "Jornal Nacional" por dias a fio nem repetidas manchetes da "Folha". Não fizeram também com que FHC e seu filho fossem intimados a depor pelo Ministério Público.

Se fosse o Lula...

Aliás, o mesmo Ministério Público de São Paulo que intimou Lula e sua esposa não denunciou nenhum agente político no escândalo do "trensalão" tucano e arquivou o caso das irregularidades no monotrilho, que apareciam numa planilha apreendida com Alberto Youssef.

Seguindo a toada, o Ministério Público de Minas Gerais também pediu o arquivamento do caso do aeroporto de Claudio-MG. O então governador Aécio Neves (PSDB) desapropriou a fazenda de seu tio para construir [com dinheiro público] um aeroporto, cuja chave (do aeroporto "público") ficava em poder de sua família. O MP mineiro não viu motivo algum para intimar Aécio ou oferecer denúncia.

FHC é tratado pela mídia como grande estadista e nunca foi incomodado pelo MP ou pela Polícia Federal. Em seu governo, aliás, ambos eram controlados na rédea curta. 

Suas transações com o pecuarista e empresário Jovelino Mineiro, seja na controversa fazenda de Buritis (MG), seja na hospedagem frequente em [caríssimo] apartamento na capital francesa, nunca geraram grande alarde. Atibaia desperta mais interesse que Paris.

Aécio, por seu lado, desfila em Brasília como "defensor da moralidade". Tal como FHC, é aplaudido em restaurantes e não tem porque se preocupar com investigações. Seu nome apareceu em mais de uma delação da Lava Jato, mas não cola.

Em relação a Lula, a disposição é outra. Uma canoa vira iate. E o depoimento de um zelador é tratado como condenação transitada em julgado.

É verdade que Lula e o PT pagam o preço de suas escolhas. Não enfrentaram em seu governo a estrutura arcaica do sistema político brasileiro, onde interesses públicos e privados sempre conviveram promiscuamente. Mantiveram intocado o monopólio midiático empresarial, que hoje os dilacera. E optaram por uma aliança com a elite econômica, pensando talvez que seriam tratados como os "de casa". Chocaram o ovo da serpente.

Mas criticar suas escolhas estratégicas - como é o caso aqui - não significa legitimar um linchamento covarde e com indisfarçado interesse político. Se há acusações em relação a favorecimentos da OAS ou da Odebrecht, que Lula seja investigado. Como Fernando Henrique nunca foi e os grão-tucanos não costumam ser.

Contudo, investigação - e jornalismo investigativo - não podem carregar as marcas das cartas marcadas e da seletividade. Definir que Lula é o alvo e, depois, fazer uma devassa pelo país em busca de um argumento factível é transformar investigação em achincalhamento, e argumento em pretexto.

Como gosta de dizer um famoso morador de Higienópolis: "assim não pode, assim não dá".


FONTE: escrito por Guilherme Boulos, coordenador do MTST. Publicado no site "Carta Maior"  (http://cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/Pau-que-bate-em-Luiz-bate-em-Fernando-/4/35466). [Título e trechos entre colchetes acrescentados por este blog 'democracia&política'].

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