“Os paraísos fiscais não são
segmentos marginais da economia mundial: a
sua dimensão demonstra que fazem parte da sua estrutura íntima. Esses pequenos
céus fiscais são componente chave do setor financeiro mundial e das suas
operações de rotina.
De Alejandro Nadal, do portal “Esquerda.Net”, de Portugal
De Alejandro Nadal, do portal “Esquerda.Net”, de Portugal
O episódio mais recente da crise econômica
coloca os chamados paraísos fiscais no centro da cena. Chipre é uma pequena
economia e uma grande dor de cabeça, mas o essencial é que revelou, uma vez
mais, a importância desses espaços na economia mundial: a globalização neoliberal não teria podido desenvolver-se sem a ajuda
desses instrumentos da acumulação financeira.
Começamos com uma definição: um paraíso
fiscal é um espaço econômico com impostos muito baixos (ou zero) sobre
capitais e seus rendimentos. Também
oferecem regras de regulação muito fracas sobre todo o tipo de transações
financeiras (especialmente as realizadas com derivados) e mantêm o sigilo bancário de maneira quase
absoluta sobre titulares de contas e beneficiários, assim como da origem e
destino dos depósitos e levantamentos. Em suma, é o campo ideal para a
evasão de impostos e para introduzir recursos de procedência ilegal mos fluxos
convencionais da economia mundial. Se a crise em Chipre adquire relevância é porque estamos em presença de um dos
paraísos fiscais mais importantes do mundo.
E aqui
vem o bom. É
precisamente porque Chipre estava em boa posição para continuar a desempenhar o
seu papel de nirvana fiscal que a pequena ilha foi admitida na esfera do euro
em 2008. Você leu bem. Não é um acidente que Chipre faça hoje parte da zona
euro.
Isso não deveria surpreender-nos. O
grande programa da globalização financeira assenta de maneira fundamental na
presença de paraísos fiscais. Como era de esperar, essas economias, ainda que
pareçam pequenas, têm setores financeiros superdesenvolvidos. Calcula-se que,
em conjunto, têm depositados cerca de 13 trilhões (13.000.000.000.000) de
dólares e dão refúgio a cerca de 2 milhões de entidades corporativas do mundo
inteiro.
Esse tipo de magnitudes já nos diz
algo importante sobre os paraísos fiscais. Não se trata de segmentos marginais
da economia mundial, mas sim de uma dimensão que faz parte da sua estrutura
íntima. Mais que um simples instrumento para evasão de impostos, esses pequenos
céus fiscais são um componente chave do setor financeiro mundial e das suas
operações de rotina. No desenvolvimento do capital financeiro, os paraísos
fiscais são o espaço privilegiado da gestão especulativa, porque facilitam as
operações de arbitragem (isto é, aquelas
em que os agentes escolhem instrumentos financeiros e divisas em função de
diferenças entre taxas de câmbio e taxas de juro real). Dessa perspetiva, é
claro que os paraísos fiscais têm sido essenciais na globalização financeira. E,
portanto, também desempenharam papel importante na gestação da crise financeira
mundial.
Na lista típica dos países que se
consideram paraísos fiscais, abundam as ilhas ensolaradas e os principados mediterrânicos. A enumeração
tradicional inclui, quase sempre, em primeiro lugar, as ilhas Caiman, Bermudas,
Bahamas, Barbados, Antigua e Barbuda,
Mônaco, São Marino e Liechtenstein. Mas a lista é bem mais extensa e contém
países como Luxemburgo, Suíça, Panamá,
Singapura e Hong Kong. De fato, uma análise mais cuidadosa sobre a
estrutura e dinâmica do capital financeiro revela que existem paraísos fiscais
em países bem mais importantes. Nos Estados
Unidos, existem espaços que cumprem com
a definição de paraíso fiscal que apontamos acima. Os estados de Nevada e
Delaware reúnem todos os requisitos para serem membros do seleto clube de
paraísos fiscais. E mais, nos Estados Unidos não se taxam os pagamentos de
juros e rendimentos de capital recebidos por não residentes. Por esse motivo,
as análises mais rigorosas sobre paraísos fiscais incluem nas suas listas
economias como os Estados Unidos e o Reino
Unido. Recentemente, a Alemanha defendeu resolutamente o segredo bancário
dos paraísos fiscais.
Os paraísos fiscais também têm
servido como instrumentos de pressão para moldar a política fiscal em todo o
mundo. Quando o processo de globalização financeira arrancou, no final da
década de 70, as taxas marginais máximas do imposto sobre o rendimento das
pessoas físicas e das empresas nos países desenvolvidos eram, em média, de 67 e
50 por cento, respectivamente. Na atualidade, essas taxas médias são de 40 e 27
por cento. Em grande medida, essa redução da pressão fiscal deve-se à presença
dos paraísos fiscais como alternativa de tratamento fiscal muito mais benigno.
A “solução” para a crise em Chipre
destapou a lixeira da globalização financeira. Quando se introduziu a moeda
única na Europa, insistiu-se muito nas suas vantagens porque se reduziriam os
custos de transação. O que não se disse é que os diversos paraísos fiscais na
zona euro encarregar-se-iam de multiplicar os lucros derivados da especulação.
É bom momento para recordar as palavras de John Milton quando nos recorda
em “O Paraíso
Perdido” como virão ‘os
lobos cruéis que só procuram saciar a sua vil ânsia de ambição e lucro’.”
FONTE: artigo de Alejandro Nadal, do portal “Esquerda.Net”, de Portugal, publicado
no “La Jornada” e transcrito no portal de Luis
Nassif (http://www.advivo.com.br/blog/luisnassif/a-importancia-dos-paraisos-fiscais-para-o-neoliberalismo). [Imagem do Google adicionada por este blog ‘democracia&política’].
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