segunda-feira, 18 de março de 2013

O DIFÍCIL CAMINHO DE FRANCISCO



Por Antonio Tozzi

“Miami (EUA) - Após a renúncia inesperada de Bento XVI, que decidiu abdicar do cargo vitalício de papa e se tornar papa emérito, o concílio dos cardeais se reuniu no Vaticano para escolher o novo pontífice, que terá como missão liderar o rebanho de católicos, estimado em 1,2 bilhão de fiéis espalhados por todo o mundo.

Agora, pouco a pouco, vão surgindo informações sobre quem é e o que fez o homem que deve peregrinar pelo mundo pregando fé, caridade e compreensão entre as pessoas num momento em que todos se preocupam mais com acumulação de riquezas do que com a distribuição dos bens.

Pelo menos, essa lição o papa Francisco pretende ensinar aos fiéis. Aliás, o cardeal de formação jesuíta escolheu o nome de Francisco provavelmente em homenagem a São Francisco de Assis, que se notabilizou por ter abdicado de uma vida de riqueza em troca de um voto de pobreza. Igual ao santo que viveu na Itália muito tempo atrás, o novo pontífice segue uma vida sem fausto. Nunca fez questão de morar em dioceses ricamente decoradas nem andar em carros luxuosos. Ele preferiu sempre viver modestamente e se locomover usando o transporte público, mesmo sendo cardeal-arcebispo.

Entronizado no posto mais cobiçado da Igreja Católica, ficará difícil para o pontífice manter a postura de religioso avesso à publicidade e de vida espartana. Afinal, ele comanda um império em termos de bens e patrimônio e precisa juntar, à evangelização e à preocupação com as coisas celestiais, a figura de administrador e investidor. Sério dilema para quem se presta mais ao aspecto divino do que às coisas materiais.

Apesar de valorizar o trabalho social com os mais pobres, o papa Francisco faz questão de frisar que a Igreja Católica tem de ser fiel a Jesus Cristo. Como ele mesmo disse, “uma igreja sem Cristo é como uma ONG de obras caridosas”. Isso pode ser um novo sopro para os cristãos em geral e particularmente para os católicos que precisam de uma injeção de ânimo em sua fé, uma vez que o número de fiéis vem encolhendo por causa do crescimento evangélico, sobretudo dos neopentecostais, e de outras seitas e religiões.

Muitos reformistas defendem, inclusive, um revisionismo na Igreja Católica a fim de modernizá-la e, dessa forma, atrair novos fiéis. Dogmas e rituais, embora guardem o carisma que evoca a Idade Média, nos remetem exatamente para a Idade Média! Ou seja, numa época em que um telefone celular conecta qualquer pessoa com o mundo, aspirar incenso e compenetrar-se com o badalar da sineta do coroinha pode parecer algo de outro planeta. Mas particularmente cumprir esses rituais e as vestes usadas pelos sacerdotes, monsenhores e cardeais denotam o compromisso com as coisas divinas.

O que a Igreja Católica precisa, na verdade, é de um choque de modernismo em suas atitudes. Aos olhos dos leigos, parece inconcebível que padres não possam se casar. Esse celibato tem sido o fermento de relações desaprovadas com mulheres e homens e, pior ainda, gerador de vários casos de pedofilia, conspurcando a imagem sacrossanta da Igreja.

Ironicamente, o papa Francisco já declarou que a Bíblia desaprova relacionamentos homossexuais, contrariando o que muitos padres e bispos fazem às escondidas em sacristias e casas paroquiais. Esse problema, aliás, é a principal chaga a ser enfrentada pelo novo pontífice, juntamente com a extrema riqueza acumulada pelo Vaticano.

Dizem as línguas ferinas que o Vaticano proíbe o casamento dos padres porque não quer dividir os bens e o patrimônio com as famílias geradas por eles. Ou seja, a instituição quer manter-se monolítica a ter que compartilhar o que possui. Exatamente o contrário do que pregou Jesus Cristo e muitos outros santos, como o próprio São Francisco.

Outra pedra no sapato que está à espera do papa Francisco é a politicagem que tomou conta dos principais próceres da Igreja Católica, mormente no Vaticano, que se vem caracterizando como um antro de fofocas e negociatas. Recentemente, um mordomo indiscreto lançou um livro contando segredos pouco abonadores sobre o que se passa dentro dos muros do menor país do mundo.

Por fim, o sumo-sacerdote tem de enfrentar acusações de ter sido conivente com a ditadura instaurada na Argentina na década de 70, uma ditadura cruel e sangrenta que deixou feridas abertas em boa parte do povo argentino. O passado nebuloso do então religioso Jorge Mario Bergoglio deve ser esclarecido rapidamente, sob pena de turvar seu pontificado. Aliás, vem sendo negado veementemente pelo Vaticano que, sem dúvida, deve ter pesquisado muito antes de entronizá-lo como papa. Se ele tivesse mesmo participado desses atos abomináveis, por certo, não teria sido ungido papa. O problema é que as pessoas acusam sem necessidade de provar o que falam.

A boa notícia é o fato de o escolhido ter sido um sul-americano, quebrando a tradição de sempre ter um europeu como pastor supremo da Igreja Católica. Mesmo sendo o novo papa descendente de italianos, sua escolha interrompe o eurocentrismo predominante no Vaticano. 

Vale ressaltar o espírito irreverente dos brasileiros após o anúncio da nacionalidade do novo papa. Mensagens bem-humoradas pulularam nas páginas de facebook e do twitter brincando com a antiga rivalidade entre brasileiros e argentinos. Na minha opinião, a melhor foi esta: “O papa demonstrou mesmo ser um argentino humilde. Ele aceitou um cargo abaixo de Deus”. Pano rápido.”

FONTE: escrito por Antonio Tozzi, de Miami. O autor foi repórter do “Jornal da Tarde” e do “Estado de São Paulo”. Vive nos Estados Unidos desde 1996, onde foi editor da “CBS Telenotícias Brasil”, do canal de esportes “PSN”, da revista “Latin Trade” e do jornal “AcheiUSA”. Publicado no site “Direto da Redação”  (http://www.diretodaredacao.com/noticia/o-dificil-caminho-de-francisco).

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