sábado, 5 de março de 2011

PATRIOTA DIZ QUE BRASIL REJEITA AÇÃO MILITAR NA LÍBIA SEM AVAL DA ONU

Cidadãos de Bangladesh esperam em fila para deixar a Líbia; forças de Gaddafi controlam a saída na fronteira com a Tunísia

O Brasil se opõe a qualquer ação militar na Líbia sem o aval do Conselho de Segurança da ONU (Organização das Nações Unidas), afirmou sexta-feira o chanceler Antonio Patriota.

Em nota lida durante entrevista coletiva em Pequim, o chanceler brasileiro afirma que o Brasil somente apoia zona de proibição de voos no espaço aéreo líbio ou "qualquer outra iniciativa militar naquele país" dentro do "marco estrito do respeito à Carta da ONU, no âmbito do Conselho de Segurança".

A declaração ocorre um dia depois de o presidente americano, Barack Obama, ter levantado a possibilidade de ação militar na Líbia para solucionar a crise no país.

O ministro afirma ainda que o Brasil "se solidariza" com as manifestações pró-democracia no mundo árabe, exorta um tratamento humanitário em caso de "eventuais ondas migratórias" para a Europa e reforça apoio à "proposta de estabelecimento de zonas livres de armas nucleares em regiões com focos de tensão, como o Oriente Médio".

Patriota, que terminou sexta-feira sua visita de dois dias a Pequim, diz que tratou do tema com seu homólogo chinês, Yang Jiechi, mas não detalhou o teor da conversa. A China substituirá o Brasil na Presidência do Conselho de Segurança.

CONFRONTOS

As tropas líbias voltaram a bombardear sexta-feira os rebeldes que controlam Ajdabiya, pelo terceiro dia consecutivo, enquanto os líderes da oposição planejavam protestos na capital Trípoli contra o ditador Muamar Gaddafi.

A força aérea líbia lançou uma bomba sobre a base militar próxima a Ajdabiya, segundo Mohamad Abdalah, insurgente que lutava na última barreira da cidade, na estrada para Brega (70 km a oeste), onde violentos combates ocorreram na quarta-feira e ataques aéreos foram lançados na quinta-feira.

Outros opositores confirmaram o bombardeio, que não teria causado vítimas ou danos materiais.

Brega, um porto petroleiro, e Ajdabiya, são dois pontos estratégicos na estrada que liga Trípoli a Benghazi, transformada em bastião da insurreição iniciada em 15 de fevereiro.

Mas, para Saif al-Islam, um dos filhos de Gaddafi, os ataques aéreos de Brega tinham apenas a intenção de "assustar", sem provocar mortes. "As bombas eram apenas para assustar, para que eles fossem embora", disse.

"Ali não há cidade, a cidade de Brega fica a quilômetros de distância. Estou falando do porto, onde há apenas uma refinaria de petróleo", completou, em entrevista à rede britânica Sky News.

As tropas de Gaddafi, por sua vez, mantêm o controle do oeste, perto da fronteira com a Tunísia, onde milhares de pessoas que fugiram da repressão líbia tentam atravessar a fronteira, indicou em Genebra o Alto Comissariado da ONU para os Refugiados (ACNUR).

A oposição, que na semana passada realizou apenas pequenas manifestações em vários bairros de Trípoli, fará nova tentativa após as orações muçulmanas de sexta-feira. A organização dos protestos pode ser atrapalhada pelo corte da internet na capital, que vigora desde quinta-feira.

PROPOSTA DE PAZ

Tanto os rebeldes quanto o filho de Gaddafi rechaçaram a possibilidade de mediação internacional proposta pelo presidente venezuelano, Hugo Chávez, divulgada quinta-feira pela imprensa.

"Nós os respeitamos, [os venezuelanos] são nossos amigos, mas eles estão muito longe e não sabem como é a Líbia. Somos capazes de resolver nossos problemas sozinhos", afirmou Saif al-Islam. "Seria como [se um líbio] fosse negociar um acordo no Amazonas". [Obs deste blog: ontem à noite, foi noticiado que o primeiro-ministro líbio aceitou formalmente a proposta venezuelana].

A rebelião líbia também rejeitou a proposta venezuelana. "Temos posição muito clara: é tarde demais, já se derramou muito sangue", disse Mustafah Gheriani, porta-voz do Conselho Nacional de cidades, controlado pela oposição, cuja sede fica em Benghazi.

O governo brasileiro e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva também receberam duas sondagens para atuarem como mediadores no conflito líbio, segundo reportagem de Clóvis Rossi, enviado especial da Folha de S. Paulo em Genebra. Mas ambos delegaram qualquer iniciativa a um mandato da ONU.

Lula foi convidado pelo próprio Chávez para ser mediador, mas informou que o assunto diz respeito agora ao governo Dilma Rousseff e que a ONU deve assumir toda iniciativa.

O Brasil recebeu ainda convite do governo líbio para atuar na missão de observadores da crise, que, ainda, segundo Rossi, nem chegou a ser seriamente examinado pelo Planalto, dada a avaliação de que não há interesse de nenhuma parte.

REPATRIAÇÃO

A comunidade internacional, por sua vez, deu início a uma operação de repatriação por ar e mar de milhares de refugiados egípcios que fugiram da repressão na Líbia através da fronteira com a Tunísia.

Mais de 100 mil pessoas já deixaram o território líbio desde o começo da rebelião. Segundo dados da ONU, a virulenta repressão aos protestos deixou cerca de mil mortos; para uma ONG líbia de defesa dos direitos humanos, esse número já passa de 6.000.

O ACNUR afirmou que menos de 2.000 pessoas conseguiram atravessar na quinta-feira a fronteira entre Líbia e Tunísia, sob controle das forças de Gaddafi.

"Nos dias anteriores, entre 10 mil e 15 mil escaparam diariamente para a Tunísia, e ontem menos de 2.000 conseguiram cruzar a fronteira", indicou Melissa Fleming, porta-voz do ACNUR.

"Estamos muito preocupados que a situação da segurança na Líbia esteja impedindo as pessoas de atravessar a fronteira", acrescentou. "O lado líbio da fronteira está sob controle neste momento de tropas pró-governo fortemente armadas".

Além disso, aqueles que por fim conseguiam chegar ao outro lado contaram à ACNUR que "seus telefones celulares foram confiscados, junto com suas câmeras". "Muitos dos que cruzaram a fronteira parecem assustados e não querem falar", explicou Fleming.

Ela disse ainda que 12.500 pessoas ainda precisam ser retiradas da Líbia, mais de 10 mil de Bangladesh. Dois voos para Bangladesh estão programados neste fim de semana.”

FONTE: reportagem de Fabiano Maisonnave publicada na Folha.com e portal UOL (http://www1.folha.uol.com.br/mundo/884271-patriota-diz-que-brasil-rejeita-acao-militar-na-libia-sem-aval-da-onu.shtml)

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