Por Pepe Escobar no “Asia
Times Online”, “The Roving Eye”,
sob
o título original “BRICS go over the wall”. Traduzido pelo “pessoal da
Vila Vudu” e postado no blog
“Redecastorphoto”
Pepe Escobar
“Notícias
da morte prematura dos BRICS (Brasil,
Rússia, Índia, China e África do Sul) são muitíssimo exageradas. A
imprensa-empresa ocidental está inundada dessas tolices, perpetradas, nesse
específico caso, pelo presidente do “Morgan Stanley Investment Management”.
[Ver
em: “Broken BRICs. Why the Rest Stopped Rising” (BRICs quebrados. Por que o resto parou de crescer), Foreign
Affairs, nov.-dez.2012]
A
realidade é outra. Os BRICS reuniram-se em Durban, África do Sul, na 3ª-feira,
para, dentre outros passos, criarem sua própria agência de avaliação de riscos,
escapando assim da ditadura – ou, no
mínimo, das “agendas enviesadas”, como diz a diplomacia indiana – das
agências tipo “Moody's/Standard & Poor”. Também tocarão adiante o Banco
de Desenvolvimento dos BRICS, com capital inicial de US$ 50 bilhões, para
ajudar em projetos de infraestrutura e de desenvolvimento sustentável.
Importante,
mesmo, é que EUA e União Europeia não serão acionistas desse Banco do Sul – alternativa concreta, estimulada
principalmente por Índia e Brasil, ao Banco Mundial e ao sistema de ‘Bretton
Woods’ controlados pelo Ocidente.
Jaswant Singh
Como
observou o Ministro das Finanças da Índia, Jaswant Singh, esse banco de
desenvolvimento poderá, por exemplo, canalizar o know-how de Pequim,
para ajudar a financiar as obras massivas de infraestrutura das quais a Índia
carece.
As
grandes diferenças políticas e econômicas entre os países BRICS são
autoevidentes. Mas, já agora reunidos e operando como grupo, o ponto já não é
se podem proteger a economia global contra a crise ‘non-stop’ do
capitalismo-de-cassino avançado.
O
ponto é que, além de medidas para facilitar o comércio mútuo, as ações do bloco
vão-se tornando cada vez mais políticas. Os BRICS não apenas mostram seu poder
econômico como, também, tomam medidas concretas na direção acelerada rumo a
mundo multipolar. Nisso, o Brasil é particularmente ativo.
Inevitavelmente, os míopes
fanáticos atlanticistas de sempre do “consenso de Washington” nada veem – miopicamente – além de “BRICS esperam mais reconhecimento das
potências ocidentais”.
Claro
que há problemas. O crescimento está mais lento no Brasil, China e Índia. Dado
que a China, por exemplo, tornou-se principal parceiro comercial do Brasil – já ultrapassou os EUA – vastos setores
da indústria brasileira sofreram com a concorrência das manufaturas chinesas
baratas.
Mas
há perspectivas futuras inescapáveis. Os BRICS, muito provavelmente, terão mais
poder no Fundo Monetário Internacional. Detalhe crucialmente importante, os
BRICS passarão a negociar em suas próprias moedas nacionais, servindo-se de um “Yuan”
globalmente conversível e afastando do dólar norte-americano e do petrodólar.
A
CHINA EM MOMENTO MENOS ACELERADO
Jim
O’Neill
O inventor da expressão
“BRIC” (no início, ainda sem a África do
Sul) foi Jim O’Neill, do banco “Goldman Sachs”, nos idos de 2001. Muito
interessante e esclarecedor ouvir o que O’Neill tem a dizer hoje, sobre o mesmo
tema em longa entrevista à revista Der
Spiegel (21/3/2013, “BRICS 'Have Exceeded all
Expectations” [Os
BRICS superaram todas as expectativas], Der Spiegel).
O'Neill destaca que a
China, mesmo tendo crescido “meros” 7,7% em 2012, “Criou riqueza equivalente a uma economia grega inteira, a cada 11
semanas e meia”. A desaceleração na China foi “cíclica e estrutural” – um “desligar
a máquina” planejado para controlar o superaquecimento e a inflação.
O impulso adiante que se
vê nos BRICS é parte de uma tendência global irresistível. Boa parte dessa
tendência está bem decodificada num novo relatório do “Programa de
Desenvolvimento das Nações Unidas” [orig. United Nations Development
Programme].
Em resumo: o norte está sendo
ultrapassado na corrida econômica, pelo sul global, que corre à velocidade
estonteante.
Segundo
aquele relatório, “pela primeira vez em
150 anos, a soma dos resultados das três principais economias do mundo em
desenvolvimento – Brasil, China e Índia – é praticamente igual aos PIBs somados
das notórias potências industriais do Norte”.
Chefes de Estado dos BRICS (foto de 2012) (da esquerda para a direita) Dilma Rousseff - Brasil; Vladimir Putin - Rússia;
Manmohan Singh - Índia; Hu Jintao - China; Jacob Zuma - África do Sul
A
conclusão óbvia é que “o crescimento do
Sul global está reformatando radicalmente o mundo do século 21, com nações em
desenvolvimento comandando o crescimento econômico, arrancando da miséria
centenas de milhões de pessoas e empurrando bilhões mais para uma nova classe
média global”.
E
no coração crucial ardente desse processo, encontramos um épico eurasiano: o desenvolvimento de relação estratégica
entre Rússia e China.
Sempre o Oleogasodutostão...
Vladimir Putin
O Presidente Vladimir
Putin da Rússia não quer saber de arrastar prisioneiros: quer empurrar os BRICS no rumo de constituir “um mecanismo de
cooperação estratégica em plena escala, que nos permitirá, juntos, procurar
soluções para as questões chaves da política
global”.
Isso
implicará política externa comum para todos os BRICS – e não só alguma coordenação seletiva em torno de alguns temas. Não
será fácil. Exigirá tempo. Putin está perfeitamente consciente disso.
O
que torna tudo ainda mais fascinante é que Putin já expôs essas ideias ao novo
Presidente da China, Xi Jinping, que o visitou em Moscou, por três dias. Putin
não mediu palavras: fez questão de dizer e repetir que as relações sino-russas “são hoje as melhores, em séculos de
história”.
Não
é exatamente o que os atlanticistas hegemonistas gostariam de ouvir – sempre interessados, eles, em manter todas
as relações no pé em que estavam na Guerra Fria.
Xi Jinping
Xi retribuiu em alto
estilo: “Não viemos visitá-los à toa”
– como se lê, parcialmente detalhado no “China Daily”. E esperem só, que a potência
criativa dos chineses comece a gerar dividendos.
Inevitavelmente, o “Oleogasodutostão”
está no coração do projeto de relações complementares entre esses dois grandes
BRICS.
A
China precisa do petróleo e o gás da Rússia, como item de segurança nacional.
A
Rússia quer vender mais e mais dos dois itens, diversificando a carteira de
clientes na direção do Oriente; mais que tudo, a Rússia receberia com enorme
entusiasmo investimentos chineses no extremo oriental de seu território – a imensa região Trans-Baikal.
E,
por falar nisso, não é verdade que o “perigo amarelo” esteja invadindo a
Sibéria – como diz o ocidente. Só 300
mil chineses vivem hoje na Rússia.
Consequência
direta da reunião de “cúpula Putin-Xi” é que, de agora em diante, Pequim pagará
adiantado pelo petróleo russo que comprar – em
troca de participar em inúmeros projetos, como, por exemplo, na prospecção de
petróleo em alto mar nas áreas da CNPC e Rosneft, no Mar de Barents, e em
outros pontos das águas russas.
A
Gazprom, por sua vez, fechou negócio longamente esperado de gás com a CNPC: 38 bilhões de metros cúbicos por ano
entregues pelo gasoduto ESPO, a partir da Sibéria, começando em 2018. E, já
no final de 2013, será finalizado e assinado um novo contrato chinês com a
Gazprom, envolvendo fornecimento de gás para os próximos 30 anos.
As ramificações
geopolíticas são imensas: importar mais
gás da Rússia ajuda Pequim a, gradualmente, escapar do seu dilema Malacca e Ormuz – para não mencionar a industrialização das
províncias do interior da China, imensas, muito densamente povoadas, duramente
dependentes ainda da agricultura, e que ficaram à margem do boom
econômico.
Eis
como o gás russo encaixa-se no plano máster do Partido Comunista Chinês: para configurar as províncias do interior do
país como base de apoio para a classe média chinesa – 400 milhões de
chineses cada vez mais ricos, mais urbanizados, que vivem na costa leste.
Putin, ao dizer e insistir
que não vê o bloco BRICS como “concorrente
geopolítico” contra o ocidente, fez o que faltava fazer: negou oficialmente, para não deixar dúvidas
de que, sim, sim, se trata exatamente disso. Durban será, provavelmente, a
ocasião em que se sacramentaram apenas os primeiros movimentos dessa
competição. Desnecessário dizer que as ‘'elites'’ ocidentais – ainda que estagnadas e à beira da bancarrota
– não cederão, senão depois de muita luta, qualquer dos seus privilégios.”
FONTE:
escrito por Pepe Escobar no “Asia Times Online”, “The Roving Eye”,
sob
o título original “BRICS go over the wall”. Traduzido pelo “pessoal da
Vila Vudu” e postado no blog
“Redecastorphoto” (http://redecastorphoto.blogspot.com.br/2013/03/pepe-escobar-brics-conseguem-furar-o.html).
3 comentários:
Maria Tereza, excelente texto do Pepe Escobar com impressões de Jim O’Neill.
"...Mas há perspectivas futuras inescapáveis. Os BRICS, muito provavelmente, terão mais poder no Fundo Monetário Internacional. Detalhe crucialmente importante, os BRICS passarão a negociar em suas próprias moedas nacionais, servindo-se de um “Yuan” globalmente conversível e afastando do dólar norte-americano e do petrodólar.
Uma correção, na foto Chefes de Estado dos BRICS (é de 2012) da esquerda para a direita Dilma, Putin, Singh; HU JINTAO - China; Zuma.
Não é o Xi Jinping, abraços,
- - - - - -
A hoje superada solidez econômico-financeira dos EUA, que lhes permitiu tornarem-se a maior economia do planeta, foi alicerçada, entre outros, sobre três pilares: a Liderança da PRODUÇÃO e da INOVAÇÃO Industrial, e o DÓLAR como Divisa Mundial de Reserva necessária a Operações Externas (como a Compra de Petróleo, e os Títulos do Tesouro, entesourados pelos Bancos Centrais e Comerciais e por Investidores de Porte. PAPEL para comprar Bens e Serviços: o melhor negócio do mundo desde que um papa passou a vender indulgências plenárias aos aspirantes ao céu católico.
http://redecastorphoto.blogspot.com.br/2011/08/volta-do-cipo-de-aroeira.html
Probus,
Obrigada pelo ótimo e elucidativo comentário e por apontar o erro. Vou corrigir na postagem (Hu Jintao).
Maria Tereza
Postar um comentário