Li no jornal “Tribuna da Imprensa” o seguinte artigo de Manuel Cambeses Júnior, O autor é coronel-aviador; conferencista especial da Escola Superior de Guerra, membro do Instituto de Geografia e História Militar do Brasil e vice-diretor do Instituto Histórico-Cultural da Aeronáutica:
“Não somente na situação econômico-financeira, mas também na política externa, o novel presidente americano Barack Obama recebeu uma herança incrivelmente pesada. A noção prevalecente durante a Administração de George W Bush, com relação ao poder dos Estados Unidos, foi conceituada, em 1990, por Charles Krauthammer, prestigioso colunista do jornal Washington Post, em um artigo intitulado "O Momento Unipolar".
Nesse instigante trabalho, enfocou, com maestria, a capacidade estado-unidense de desenhar o mundo à sua vontade, impondo regras de jogo universais que respondessem aos valores e interesses da superpotência. Segundo suas palavras "a verdadeira estrutura geopolítica do pós-Guerra Fria é a de um só polo de poder mundial que consiste em manter os EUA no ápice do Ocidente industrializado".
Lamentavelmente, a Administração de George Bush não soube entender que essa capacidade para definir o mundo em seus próprios termos já existia através de uma estrutura hegemônica desenhada à imagem e semelhança dos interesses norte-americanos.
Ao tentar obter o mesmo resultado mediante o exercício prepotente de unilateralismo, somente conseguiu divorciar o poder dos mecanismos que potencializavam e facilitavam seu exercício. Desta forma, projetou-se uma nefasta visão imperialista que deixou sem sustentação os mecanismos sobre os quais repousava sua exitosa hegemonia.
Os diversos instrumentos, mecanismos e embasamentos conceituais que davam sustentação à mesma, foram desarticulados, desativados ou deliberadamente fraturados.
O Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas foi fortemente desestruturado em virtude da nefasta preferência americana em torcer braços, proferir ameaças e atuar à margem dos mecanismos de segurança coletivos, e a própria Aliança Atlântica entrou em curto-circuito funcional em virtude do distanciamento entre os EUA e a maior parte dos sócios europeus.
Também os organismos financeiros internacionais foram deixados à deriva, como resultado do unilateralismo e da falta de atenção de Washington. A Rodada de Doha da Organização Mundial do Comércio, teve seus objetivos obliterados por intermédio da tendência estado-unidense de fazer proliferar seus tratados de livre comércio bilaterais.
O Processo de Paz entre Israel e a Palestina foi deixado sem bases ante o apoio incondicional e descarado do governo norte-americano a Israel. A relação com os governos amigos do Oriente Médio, ficou profundamente afetada como resultado da denominada "cruzada democratizadora".
Desde a fratura dos equilíbrios de poder no Oriente Médio até a erosão da boa vontade existente na América Latina, o certo é que praticamente não ficou uma só área na agenda da política exterior norte-americana que não se visse profundamente desestruturada pela arrogância superlativa de Washington.
Isto nos faz recordar o ocorrido com a hegemonia espanhola na Europa, nos tempos de Felipe IV e de seu fiel conselheiro, o Conde de Olivares, inspirador de uma política centralizadora a todo preço quando aconselhava o rei sobre todas as regras da Espanha "ao estilo e às leis de Castela".
O exercício prepotente de poder assumido pelo rei, na primeira metade do século XVII, esteve a ponto de gerar uma implosão do império espanhol, desencadeando, como corolário, seu inexorável e rápido declínio. Apesar da substituição de Olivares, por figuras moderadas, nada pode inverter a pesada herança deixada pelo mau conselheiro.
Constatamos, com relativa frequência, que os processos de declínio dos impérios são tão antigos como a própria história da Humanidade. Ocorrerá o mesmo com os EUA na Administração Barack Obama, ou poderá o novo presidente reverter essa incômoda situação?”
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