David Wearing
Por David Wearing, no “New Left Project”, sob o título
original “Prospects for 2013: David
Wearing on the Middle East and North Africa”. Artigo traduzido pelo “pessoal da Vila Vudu” e postado no “Redecastorphoto”
Oriente Médio e Nordeste da África
“Uma revolução é um processo, não um
evento, e os levantes árabes não são exceção. Revoluções acontecem quando
muitas disfuncionalidades nas nações, sempre escamoteadas por governos
monárquicos ou ditatoriais, já não podem continuar a ser escamoteadas. Quando a
tirania explode nas costuras que a mantêm coesa, é preciso mais do que alguns
dias de catarse e euforia nas ruas, para que as questões sejam, de fato,
reencaminhadas.
Eis uma regra que jamais falha: se as questões não resolvidas nem
encaminhadas que fizeram eclodir uma revolução continuam ativadas, sem qualquer
modificação de fundo, nada garante que o movimento leve à mudança de governo.
Tome-se o caso da Tunísia, tantas vezes festejada como caso de sucesso nos dois
últimos anos. O fator que disparou a revolução contra Bem Ali foi
o sofrimento gerado pelos desmandos no campo da economia – mas
ainda não se vê nem sinal de aquele sofrimento ter acabado. Quem suporá que
um povo que já uma vez levantou-se tolerará governo pós-revolucionário que não
pode ou não quer atacar as questões pão-e-manteiga-na-mesa que, no final de
2010 levaram multidões às ruas?
Costa mediterrânea do Egito
O mesmo vale ao longo da costa, no Egito, onde entre crescente crise monetária e
as exigências do FMI, a maioria
desesperadamente pobre vê-se hoje ante a iminência de novo grande ‘'choque'’
(cortes, cortes, cortes!) no seu padrão de vida. As divisões criadas pela abordagem destrutiva, pelo presidente Mursi, na
crise constitucional do mês passado, e a já visível desilusão da opinião pública ante
a nova ordem política, são o cenário já pronto para novas e profundas
convulsões sociais, se a desgraça econômica alastrar-se
ainda mais nas próximas semanas e meses. Mas se a “Fraternidade Muçulmana” desperdiçar sua grande
chance de governar, quem há, no Egito, que a substitua?
Alguém capaz de atacar os problemas econômicos que
preocupam a maioria dos egípcios? Nesse caso, quem?
A região crítica do Golfo Pérsico e o Estreito de Ormuz
A Jordânia continua a ferver
em fogo ainda baixo, e o mesmo se pode dizer do Bahrain e Kuwait.
Qualquer reação brutal desses governos aliados dos britânicos contra o próprio
povo criará graves embaraços para Londres, mas dificilmente afastará os
britânicos da rota que consideram atender melhor aos seus interesses estratégicos e econômicos na região.
Mas a repressão indefinida e o impedimento
cada vez mais evidente de qualquer tipo de reforma de fundo só fará aprofundar
e disseminar a separação entre governo e povo, minando a legitimidade dos
governos e encurtando-lhe a sobrevida.
As monarquias
do Golfo, sacudidas também pelos levantes regionais, tentam resolver tudo
com dinheiro. Mas, com estimados um em cada quatro sauditas vivendo em condições de miséria,
por exemplo, difícil crer que medidas desse tipo consigam conter por muito
tempo o avanço da maré.
Em fevereiro passado, o autor do relatório
da Anistia Internacional sobre a Líbia pós-Gaddafi
disse que França, Grã-Bretanha e os EUA “têm de
abandonar a atitude autocongratulatória e autocomplacente” quanto à situação de segurança na Líbia. À
luz de eventos subsequentes, esse
ainda parece ser bom conselho.
No Iêmen, a instabilidade
continua a ser ameaça, com o país posto como alvo da guerra dos drones do governo Obama.
Palestina: Gaza e Cisjordânia (território roubado por Israel; ver assentamentos exclusivos para judeus marcados no mapa)
A estabilidade na Palestina ocupada permanece em questão, enquanto ali se mantém o
colonialismo israelense patrocinado pelos EUA. Com a economia da Cisjordânia cada vez menos
estável, e com o “processo de paz” de Washington morto e
enterrado há muito tempo, uma terceira intifada parece estar madura, a ponto de
eclodir. Mahmoud Abbas talvez ainda insista em tentar movimentos diplomáticos,
como a bem-sucedida operação na ONU, em novembro passado, da qual resultou o
reconhecimento da Palestina como país-membro observador, num esforço cada dia mais desesperado
para reforçar sua posição doméstica.
Na Síria,
as perspectivas continuam muito sombrias (...).
“A
região preocupa-se com a Síria”, observam Hussein Agha e Robert Malley.
“E está obcecada com a situação no Iraque”. E,
no Iraque, a história está longe de
estar resolvida. O retumbante fracasso da opção feita por Bush e Blair, em
guerra planejada com o objetivo de ali implantar estado superficialmente
democrático, estado-cliente – parte uma colônia-acantonamento militar para os EUA,
parte um posto-gigante de gasolina a
baixo preço –
acabou por impor no Iraque um regime cada dia mais
autoritário, aliado do Irã, que mal se sustenta
sobre nação profundamente dividida. A
abordagem linha-dura do Primeiro-Ministro Maliki contra
os adversários políticos levarão o Iraque de volta à velha guerra civil?
Surgirá ali uma nova aliança nacionalista que reúna sunitas e xiitas contra Maliki?
Como isso afetaria o cenário político e o posicionamento do Iraque no quadro
internacional? Considerada a extraordinária importância material e estratégica
do Iraque, essas respostas interessam enormemente ao Oriente Médio e ao resto
do mundo. Interessam, sobretudo, ao povo iraquiano que sofre muito, há muito
tempo, e cujas misérias parecem sem fim, agora que já se aproxima o décimo
aniversário da invasão anglo-americana.”
FONTE: escrito por David Wearing, no “New
Left Project”, sob o título
original “Prospects for 2013: David Wearing on the Middle East
and North Africa”. Artigo
traduzido pelo “pessoal da Vila Vudu”. Castor Filho no blog
“Redecastorphoto” (http://redecastorphoto.blogspot.com.br/2013/01/previsoes-para-2013-oriente-medio-e.html).
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