My Lai, Vietnam
Por Lucas Mendes [da “Rede Globo”, mídia tucana, da direita, defensora dos interesses dos EUA (que, pela reportagem, teriam sido ‘maus’ somente no Vietnam)]
De Nova York para a BBC Brasil
“No meio da entrevista, o veterano do Vietnã foi atrás do enorme alto-falante, tirou um maço de Marlboro, abriu e nos ofereceu. Meu colega, da revista ‘Stern’, e eu acendemos os cigarros e levamos um susto. Pelo maço ou pelo cigarro, era impossível distinguir. Maconha vietnamita. Para um primário como eu, parecia da melhor qualidade e potência. Isso foi em 71 ou 72.
A entrevista foi inútil e não por culpa da maconha. Os depoimentos do veterano que mais tarde se tornou amigo íntimo e professor de vinho - era um provador profissional - não tinham sido testemunhados por ele. Não estava envolvido em combate. As histórias pavorosas foram contadas a ele por outros soldados que participaram e viram chacinas no chão ou dos helicópteros: "fuzilavam tudo que mexia", conforme ordens dos comandantes.
Um dos massacres mais chocantes foi o de “My Lai”, onde entre 347 e 504 vietnamitas, na maioria crianças, mulheres e velhos, foram fuzilados por soldados do Exército americano comandados por um tenente, William Calley. O jornalista que levantou a história, Seymour Hersh, bateu de porta em porta na grande imprensa. Rejeição em massa. Quem teve coragem de publicar a matéria foi uma nova e ainda obscura agência de notícias, “Dispatch News Service” - 32 jornais publicaram. Uma bomba.
Houve até punições, mas a máquina de propaganda do Exército era poderosa. O massacre, na versão oficial, foi uma atrocidade isolada: "Infelizmente, acontecem".
Nick Turse, escritor e jornalista, quase por acaso, tropeçou em uma coleção de documentos no porão do Arquivo Nacional. Eram casos encerrados. Na época, ele era um estudante escrevendo uma tese de pós-graduação sobre o Vietnã e já estava na página 200 quando encontrou as pastas. Todo dinheiro que tinha, mais o que o professor deu a ele, gastou copiando páginas às pressas. Dormia no carro no estacionamento, era o primeiro a entrar e o último a sair, com medo que fossem recolhidas. E sumiram das estantes quando publicou o primeiro artigo.
O resultado é o livro “Kill Anything That Moves: The Real American War in Vietnam”. Enquanto o país ainda está chocado com as cenas de tortura do filme “Zero Dark Thirty” (no Brasil, “A Hora Mais Escura”) e debate se os Estados Unidos perderam a liderança moral no mundo, a história da desumana crueldade americana no Vietnã é uma leitura repugnante que Hollywood jamais vai colocar nas telas.
A estratégia, ditada pelo secretário (de Defesa, Robert) McNamara, era a "contagem de corpos".
Pela lógica empresarial dele, se os vietnamitas vissem diariamente os números de mortos comparados com os americanos, perceberiam que estavam perdidos.
Para o secretário americano, quanto maior o número, melhor. Um comandante no Delta do Mekong era o campeão da contagem. Seus comandados saíam de helicópteros e sobrevoavam as plantações de arroz cheias de camponeses nas colheitas. Os helicópteros baixavam até apavorar os vietnamitas que corriam em busca de abrigos. Eram metralhados com a justificativa: "guerrilheiro tentou ação evasiva". Mexia, morria.
No final do dia, centenas de vietnamitas mortos. Armas capturadas: uma dúzia.
A matança de civis deixou mais de 2 milhões de mortos, 5,3 milhões de feridos, 11 milhões de refugiados e mais de 4 milhões expostos ao agente tóxico desfolhador laranja.
Dezenas de americanos denunciariam a violência e centenas foram investigados pelo Exército, mas arquivados. Foram as pastas que Nick Turse encontrou no porão.
Quase na mesma semana do lançamento do livro sobre a violência e o fracasso americano no Vietnã, foi lançado “The Insurgents: David Petraeus and the Plot to Change the American Way of War”, do escritor e jornalista Fred Kaplan, que escreve a coluna “War Stories” para o site “Slate”.
O foco é no general hoje em desgraça por conduta imoral quando dirigia a CIA e teve um affair com uma biógrafa. Kaplan acompanha o general da guerra na Bósnia, as guerras do Iraque e Afeganistão. [No Iraque], enquanto os americanos enfrentavam insurreições diárias [para a "Globo", a resistência dos nacionais contra as tropas norte-americanas invasoras é chamada de "insurreição" de "terroristas"] em quase todo país, o território comandado por Petraeus, um dos mais perigosos, estava pacificado e próspero. Ele reabriu as escolas, a universidade e a fronteira com a Síria. A população apoiava o Exército e apontava os "terroristas".
Mais tarde, no comando de toda a operação no Iraque, teve resultados excepcionais que permitiram a saída dos americanos, mas a situação já voltou à instabilidade. Petraeus estava conseguindo resultados parecidos no Afeganistão quando foi chamado de volta para dirigir a CIA.
A fórmula dele, ao contrário dos americanos no Vietnã e nos primeiros anos no Iraque, não era capturar e/ou matar insurgentes. O importante era mudar as condições sociais, o que agora se chama "nation building", construir nação, que exige sensibilidade cultural, convivência com as pessoas no território ocupado, proteção e conquista da confiança da população. Os comandantes que sucederam Petraeus não tiveram o mesmo talento de liderança e administração. O futuro é incerto e perigoso nos dois países.
Como em todas situações de conflitos, há oportunistas e empreendedores do bem e do mal como o fabricante do Marlboro com maconha que pode voltar a qualquer momento. Pouco depois daquele encontro com o veterano do Vietnã, levei um maço de Marlboro para o Brasil com um cigarro vietnamita que dei, sem prevenir, para meu pai. Estávamos num restaurante e depois da primeira tragada, ele olhou o cigarro, cheirou a fumaça: "Marlboro diferente este, tem um cheirinho gostoso de mato". Algumas pessoas na mesa sacaram e começaram a rir. A querida velha, muito esperta, percebeu algo errado e jogou o cigarro fora. Pena.
Anos depois, ele ainda perguntava se ainda existia aquele Marlboro especial”.
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Como contraponto ao artigo acima de Lucas Mendes da "Rede Globo" e de sua [demasiado bajulativa] opinião sobre o general Patraeus, [vejamos] a revelação do [jornal britânico] “The Guardian” sobre os centros de tortura montados no Iraque. Notem que James Steele, um dos organizadores da tortura sistemática, veio de experiências em El Salvador e Nicarágua. Os governos dos EUA nem mudam, nem aprendem.
Do “The Guardian”:
Exclusive: General David Petraeus and 'dirty wars' veteran behind commando units implicated in detainee abuse
See the full-length documentary film of the 15-month investigation. Link to video: US special forces veteran links General Petraeus to torture in Iraq.
The Pentagon sent a US veteran of the "dirty wars" in Central America to oversee sectarian police commando units in Iraq that set up secret detention and torture centers to get information from insurgents. These units conducted some of the worst acts of torture during the US occupation and accelerated the country's descent into full-scale civil war.
Colonel James Steele was a 58-year-old retired special forces veteran when he was nominated by Donald Rumsfeld to help organise the paramilitaries in an attempt to quell a Sunni insurgency, an investigation by the “Guardian” and “BBC Arabic” shows.
After the Pentagon lifted a ban on Shia militias joining the security forces, the Special Police Commando (SPC) membership was increasingly drawn from violent Shia groups such as the Badr brigades.
A second special adviser, retired Colonel James H Coffman, worked alongside Steele in detention centers that were set up with millions of dollars of US funding.
Coffman reported directly to General David Petraeus, sent to Iraq in June 2004 to organize and train the new Iraqi security forces. Steele, who was in Iraq from 2003 to 2005, and returned to the country in 2006, reported directly to Rumsfeld.
The allegations made by US and Iraqi witnesses in the “Guardian/BBC” documentary, implicate US advisers for the first time in the human rights abuses committed by the commandos. It is also the first time that Petraeus – who last November was forced to resign as director of the CIA after a sex scandal – has been linked through an adviser to this abuse.
Coffman reported to Petraeus and described himself in an interview with the US military newspaper “Stars and Stripes” as Petraeus's "eyes and ears out on the ground" in Iraq.
"They worked hand in hand," said General Muntadher al-Samari, who worked with Steele and Coffman for a year while the commandos were being set up. "I never saw them apart in the 40 or 50 times I saw them inside the detention centers. They knew everything that was going on there ... the torture, the most horrible kinds of torture."
Additional “Guardian” reporting has confirmed more details of how the interrogation system worked. "Every single detention center would have its own interrogation committee," claimed Samari, talking for the first time in detail about the US role in the interrogation units.
"Each one was made up of an intelligence officer and eight interrogators. This committee will use all means of torture to make the detainee confess like using electricity or hanging him upside down, pulling out their nails, and beating them on sensitive parts."
There is no evidence that Steele or Coffman tortured prisoners themselves, only that they were sometimes present in the detention centers where torture took place, and were involved in the processing of thousands of detainees.
The “Guardian/BBC Arabic” investigation was sparked by the release ‘offclassified’ on ‘WikiLeaks’ that detailed hundreds of incidents where US soldiers came across tortured detainees in a network of detention centers run by the police commandos across Iraq. Private Bradley Manning, 25, is facing a prison sentence of up to 20 years after he pleaded guilty to leaking the documents.
Samari claimed that torture was routine in the SPC-controlled detention centers. "I remember a 14-year-old who was tied to one of the library's columns. And he was tied up, with his legs above his head. Tied up. His whole body was blue because of the impact of the cables with which he had been beaten."
Gilles Peress, a photographer, came across Steele when he was on assignment for the “New York Times”, visiting one of the commando centers in the same library, in Samarra. "We were in a room in the library interviewing Steele and I'm looking around I see blood everywhere."
The reporter Peter Maass was also there, working on the story with Peress. "And while this interview was going on with a Saudi jihadi with Jim Steele also in the room, there were these terrible screams, somebody shouting: 'Allah, Allah, Allah!' But it wasn't kind of religious ecstasy or something like that, these were screams of pain and terror."
The pattern in Iraq provides an eerie parallel to the well-documented human rights abuses committed by US-advised and funded paramilitary squads in Central America in the 1980s. Steele was head of a US team of special military advisers that trained units of El Salvador's security forces in counterinsurgency. Petraeus visited El Salvador in 1986 while Steele was there and became a major advocate of counterinsurgency methods.
Steele has not responded to any questions from the “Guardian” and “BBC Arabic” about his role in El Salvador or Iraq. He has in the past denied any involvement in torture and said publicly he is "opposed to human rights abuses." Coffman declined to comment.
An official speaking for Petraeus said: "During the course of his years in Iraq, General Petraeus did learn of allegations of Iraqi forces torturing detainees. In each incident, he shared information immediately with the US military chain of command, the US ambassador in Baghdad ... and the relevant Iraqi leaders."
“The Guardian” has learned that the SPC units' involvement with torture entered the popular consciousness in Iraq when some of their victims were paraded in front of a TV audience on a program called "Terrorism In The Hands of Justice."
SPC detention centers bought video cameras, funded by the US military, which they used to film detainees for the show. When the show began to outrage the Iraqi public, Samari remembers being in the home of General Adnan Thabit – head of the special commandos – when a call came from Petraeus's office demanding that they stop showing tortured men on TV.
"General Petraeus's special translator, Sadi Othman, rang up to pass on a message from General Petraeus telling us not to show the prisoners on TV after they had been tortured," said Samari. "Then 20 minutes later we got a call from the Iraqi ministry of interior telling us the same thing, that General Petraeus didn't want the torture victims shown on TV."
Othman, who now lives in New York, confirmed that he made the phone call on behalf of Petraeus to the head of the SPC to ask him to stop showing the tortured prisoners. "But General Petraeus does not agree with torture," he added. "To suggest he does support torture is horseshit."
Thabit is dismissive of the idea that the Americans he dealt with were unaware of what the commandos were doing. "Until I left, the Americans knew about everything I did; they knew what was going on in the interrogations and they knew the detainees. Even some of the intelligence about the detainees came to us from them – they are lying."
Just before Petraeus and Steele left Iraq in September 2005, Jabr al-Solagh was appointed as the new minister of the interior. Under Solagh, who was closely associated with the violent Badr Brigades militia, allegations of torture and brutality by the commandos soared. It was also widely believed that the units had evolved into death squads.
“The Guardian” has learned that high-ranking Iraqis who worked with the US after the invasion warned Petraeus of the consequences of appointing Solagh but their pleas were ignored.
The long-term impact of funding and arming this paramilitary force was to unleash a deadly sectarian militia that terrorized the Sunni community and helped germinate a civil war that claimed tens of thousands of lives. At the height of that sectarian conflict, 3,000 bodies a month were strewn on the streets of Iraq.
CV: James Steele:
VIETNAM
Jim Steele's first experience of war was in Vietnam, where from 1965 to 1975 US combat units were deployed against the communist North Vietnamese government and Viet Cong. 58,000 Americans were killed, dealing a blow to the nation's self-esteem and leading to a change in military thinking for subsequent conflicts.
EL SALVADOR
A 1979 military coup plunged the smallest country in Central America into civil war and drew in US training and funding on the side of the rightwing government. From 1984 to 1986 Steele – a "counterinsurgency specialist" – was head of the US MilGroup of US special forces advisers to frontline battalions of the Salvadorean military, which developed a fearsome international reputation for its death-squad activities. Prof Terry Karl, an expert at Stanford University on El Salvador's civil war, said that Steele's main aim was to shift the fight from so-called total war, which then meant the indiscriminate murder of thousands of civilians, to a more "discriminate" approach. One of his tasks was to put more emphasis on "human intelligence" and interrogation.
He became involved in the Iran-Contra affair, which saw the proceeds from covert arms sales by senior US officials to Iran used to fund the Contras, rightwing guerrillas fighting Daniel Ortega's leftwing Sandinista government in Nicaragua. Steele ran operations at El Salvador's Ilopango airport, from where Lieutenant Colonel Oliver North illegally ran weapons and supplies to the Contras.
IRAQ
Soon after the 2003 US-led invasion of Iraq, now retired Colonel James Steele was in Baghdad as one of the White House's most important agents, sending back reports to Donald Rumsfeld and acting as the US defence secretary's personal envoy to Iraq's Special Police Commandos, whose intelligence-gathering activities he oversaw. Drawn mostly from violent Shia militia, the commandos developed a reputation for torture and later for their death-squad activities directed against the Sunni community.”
FONTE: parte inicial escrita por Lucas Mendes [da Rede Globo], de Nova York, para a agência britânica de notícias BBC (Brasil). Parte em inglês adicionada pelo portal de Luis Nassif (http://www.advivo.com.br/blog/luisnassif/a-crueldade-americana-no-vietna). [Imagem do Google e trechos entre colchetes introduzidos por este blog ‘democracia&política’].
TRADUÇÃO:
Guardian/BBC:
EUA EXPORTARAM “GUERRA SUJA” DA AMÉRICA LATINA PARA O IRAQUE
TRADUÇÃO:
Guardian/BBC:
EUA EXPORTARAM “GUERRA SUJA” DA AMÉRICA LATINA PARA O IRAQUE
Os quatros estão envolvidos na “guerra suja” que
os EUA exportaram para o Iraque: de cima para baixo, os coronéis James Steele e James H.
Coffman, Donald Rumsfeld e o general David Patraeus
Guardian/BBC: PENTÁGONO
TEVE LIGAÇÃO COM CENTROS DE TORTURA NO IRAQUE
Por Mona Mahmood, Maggie O’Kane,
Chavala Madlena e Teresa Smith, no
jornal inglês “The
Guardian”
“O Pentágono enviou um veterano da “guerra suja”
na América Central para o Iraque, a fim de supervisionar o comando das unidades
da polícia especial, que estabeleceu centros secretos de detenção e tortura
para obter informações dos insurgentes. Essas unidades conduziram alguns dos
piores atos de tortura durante a ocupação dos Estados Unidos e aceleraram o
mergulho do país em uma guerra civil.
O coronel James Steele era um veterano das forças
especiais de 58 anos quando foi indicado por Donald Rumsfeld
(ex-secretário de Defesa) para ajudar a organizar os paramilitares, na tentativa
de sufocar a insurreição sunita, como mostra uma investigação do Guardian e
da BBC Árabe.
Depois que o Pentágono deixou de proibir o
ingresso de milícias xiitas nas forças de segurança, aumentou muito, entre
grupos xiitas violentos, como as Brigadas Badr, o recrutamento para o
comando da polícia especial.
Um segundo consultor especial, o coronel reformado
James H Coffman, trabalhou lado a lado com Steele nos centros de detenção montados
com milhões de dólares de fundos dos Estados Unidos.
Coffman se reportava diretamente ao general David
Patraeus, enviado ao Iraque em junho de 2004 para organizar e treinar as novas
forças de segurança do país. Steele (ficou
no Iraque de 2003 a 2005 e voltou em 2006), se reportava diretamente a
Rumsfeld.
Pela primeira vez, alegações de testemunhas dos
Estados Unidos e do Iraque, presentes no documentário
do Guardian/BBC, implicam os consultores americanos
em abusos de direitos humanos cometidos pelos comandos. Também é a primeira vez
que Patraeus — forçado a entregar o cargo
em novembro como diretor da CIA após um escândalo sexual — é relacionado a
esses abusos por um consultor.
Coffman respondia a Petraeus e se descreveu em
entrevista ao Stars
and Stripes, jornal do exército
americano, como “os olhos e os
ouvidos” de Patraeus no Iraque.
“Eles
atuavam lado a lado”, disse o general Muntadher al-Samari, que trabalhou
durante um ano com Steele e Coffman, enquanto os comandos eram montados. “Eu nunca os vi separados nas 40 ou 50 vezes
que os vi dentro dos centros de detenção. Eles sabiam tudo o que se passava
ali… a tortura, os tipos mais horríveis de tortura.”
Outras reportagens do Guardian confirmaram, em maiores detalhes, como
o sistema de interrogação funcionava.
“Todos os
centros de detenção tinham seus próprios comitês de interrogação”, disse
Samari, falando pela primeira vez, detalhadamente, sobre o papel dos Estados
Unidos nas unidades interrogatórias.
“Cada
unidade era formada por um oficial de inteligência e oito interrogadores. Esse
comitê usaria qualquer forma de tortura para arrancar confissões dos detentos,
como choques elétricos, pendurá-los de cabeça para baixo, arrancar as unhas e
espancá-los nas partes mais sensíveis do corpo”.
Não existe prova de que Steele e Coffman
torturaram pessoalmente os prisioneiros, apenas que estavam presentes em
centros de detenção onde a tortura acontecia, além de envolvidos com o
processamento de milhares de detentos.
A investigação do Guardian/BBC
começou com a divulgação de documentos secretos do exército americano pelo WikiLeaks, que
detalharam centenas de incidentes nos quais soldados americanos encontraram
detentos torturados e centros de detenção administrados pelos comandos da
polícia no Iraque. O soldado Bradley Manning, de 25 anos, pode ser condenado a
até 20 anos de cadeia depois que confessou ter vazado os documentos.
Samari diz que a tortura era rotina nos centros de
detenção controlados pelos comandos especiais: “Eu me lembro de um rapaz de 14 anos amarrado a uma pilastra da
biblioteca; ele estava amarrado com as pernas acima da cabeça. O corpo dele
estava azul por conta do impacto dos cabos usados para espancá-lo”.
Gilles Peress, um fotógrafo, cruzou com Steele
quando fazia uma reportagem para o New York times, em Samara: “Nós estávamos
em uma sala da biblioteca entrevistando Steele, eu olhava à volta, via sangue
por toda parte”.
O repórter Peter Maass também esteve lá, fazendo
reportagem com o Peress: “E
enquanto essa entrevista com o jihadi saudita e Jim Steele transcorria na
sala, havia gritos terríveis, alguém berrando: “Alá, Alá, Alá!”. Mas não
era como um êxtase religioso ou algo assim, aqueles eram gritos de dor e de
terror”.
O padrão no Iraque fornece um paralelo sinistro
com os bem documentados abusos de direitos humanos cometidos por esquadrões
paramilitares financiados e treinados pelos Estados Unidos na América Central
nos anos 80. Steele foi o chefe de uma equipe de especialistas dos Estados
Unidos que deu consultoria e treinou as unidades das forças de segurança de El
Salvador em táticas antiguerrilha. Petraeus visitou El Salvador em 1986,
enquanto Steele estava lá, e se tornou o principal defensor dos métodos de
contra insurgência.
Steele não respondeu as perguntas do Guardian e da BBC Árabe
sobre o papel dele em El Salvador ou no Iraque. No passado, ele negou qualquer
envolvimento com a tortura e disse publicamente que é “contra abusos de direitos humanos”. Coffman não quis comentar.
Um oficial falando em nome de Petraeus disse: “Durante os anos em que esteve no Iraque, o
general Petraeus foi informado a respeito das alegações de que forças
iraquianas torturavam detentos. A cada incidente, ele passava imediatamente a
informação para o comando militar dos Estados Unidos, para o embaixador
americano em Bagdá… e para os líderes relevantes do Iraque”.
O Guardian descobriu que o envolvimento das
unidades dos comandos especiais com a tortura entrou na consciência coletiva do
Iraque quando algumas das vítimas foram exibidas a telespectadores do programa
de TV chamado Terrorismo
nas mãos da Justiça.
Os centros de detenção dos comandos especiais
compraram câmeras de vídeo, financiadas pelos militares americanos, que foram
usadas para filmar os detentos para o programa. Samara lembra-se de estar na
casa do general Adnan Thabit – chefe dos
comandos especiais – quando ele recebeu uma ligação do escritório do
Petraeus, exigindo que parassem de mostrar homens torturados na TV.
“O tradutor
especial do general Petraeus, Sadi Othman, ligou para passar uma mensagem do
general Petraeus nos dizendo para não mostrar mais os presos na TV depois de
terem sido torturados”, disse Samari. “Vinte
minutos depois, recebemos uma chamada do Ministro do Interior do Iraque dizendo
a mesma coisa: o general Petraeus não queria as vítimas da tortura no programa
de TV.”
Othman, que agora vive em Nova York, confirmou que
fez a chamada, em nome de Petraeus, para o chefe dos comandos especiais para
pedir-lhe que parasse de mostrar os presos torturados. “Mas o general Petraeus não concorda com a tortura”, acrescentou. “Sugerir que ele apoia a tortura é besteira”.
Thabit descarta a ideia de que os americanos com
os quais lidou não soubessem o que os comandos estavam fazendo.
“Até o
momento em que fui embora, os americanos sabiam tudo o que eu fazia, o que se
passava nos interrogatórios e conheciam os detentos. Até mesmo algumas informações
secretas sobre os detentos vieram deles para nós. Portanto, eles estão mentindo”.
Pouco antes de Petraeus e Steele deixarem o
Iraque, em setembro de 2005, Jabr al-Solagh foi indicado como novo Ministro do
Interior. Sob Solagh, que era muito próximo da violenta milícia Brigadas Badr,
as alegações de tortura e brutalidades cometidas pelos comandos dispararam.
Também se acreditava amplamente que as unidades tinham envolvimento com os
esquadrões da morte.
O Guardian descobriu que homens graúdos do Iraque,
que trabalhavam com os Estados Unidos depois da invasão, alertaram Petraeus das
consequências de indicar Solagh, mas as súplicas deles foram ignoradas.
O impacto de longo prazo de financiar e armar as
forças paramilitares foi liberar uma milícia sectária mortal que aterrorizou a
comunidade sunita e ajudou a germinar a guerra civil que matou dezenas de
milhares de pessoas. No auge do conflito sectário, três mil corpos eram jogados
nas ruas do Iraque todo mês.
VIETNÃ
A primeira experiência de guerra de Jim Steele
aconteceu no Vietnã, onde unidades de combate dos Estados Unidos foram
enviadas para combater o governo comunista do Vietnã do Norte e os
vietcongs, entre 1965 e 1975. Nessa guerra, 58.000 americanos foram mortos. Um
soco para a autoestima da nação, que levou a uma mudança no pensamento militar
para os conflitos subsequentes.
EL SALVADOR
Um golpe militar em 1979 mergulhou o menor país da
América Central em uma guerra civil; os Estados Unidos financiaram e treinaram
o governo de direita. De 1984 a 1986, Steele – um “especialista em contrainsurgência” – foi chefe do US
MilGroup das forças especiais americanas. Ele era consultor da frente
de batalha do exército salvadorenho e ganhou reputação internacional por suas
atividades de esquadrões da morte.
O professor Terry Karl, da Universidade Stanford,
especialista na guerra civil de El Salvador, disse que o principal objetivo de
Steele era transformar a chamada guerra total, o que significava a matança
indiscriminada de milhares de civis, em uma abordagem mais “discriminada”. Uma
de suas tarefas era dar mais ênfase à “inteligência humana” e ao
interrogatório.
NICARÁGUA
Ele esteve envolvido no caso Irã-Contras, que
transferiu o lucro da venda secreta de armas de oficiais superiores dos Estados
Unidos aos Contras do Irã. Os Contras eram guerrilhas de direita que lutavam
contra o governo esquerdista do sandinista Daniel Ortega, na Nicarágua. Steele
coordenou as operações no aeroporto Llopango, em El Salvador, de onde o coronel
Oliver North entregou, ilegalmente, armas e suprimentos aos Contras.
IRAQUE
Logo após a invasão americana do Iraque, em 2003,
o agora reformado coronel James Seetle estava em Bagdá como um dos agentes mais
importantes da Casa Branca. Encaminhava relatórios a Donald Rumsfeld e atuava como
enviado especial do Secretário de Defesa dos Estados Unidos para o Comando
Especial da Polícia do Iraque, onde supervisionava a coleta de informações.
Selecionados majoritariamente das violentas milícias xiitas, os comandos
ganharam reputação pela tortura e, mais tarde, por suas atividades de
esquadrões da morte dirigidas à comunidade sunita.”
FONTE: reportagem de Mona Mahmood, Maggie O’Kane,
Chavala Madlena e Teresa Smith, no
jornal inglês “The
Guardian”. Transcrita no portal “Viomundo” traduzida por Heloísa Vilella (http://www.viomundo.com.br/denuncias/guardianbbc-pentagono-teve-ligacao-direta-com-os-centros-de-tortura-no-iraque.html).
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