Um dos inúmeros “assentamentos” judeus em território da Palestina invadido e ocupado, com os palestinos expulsos
“Se confirmadas as notícias que circulam em Israel e em Washington, os sionistas terão de sair da Palestina, que se tornará Estado independente em 2014. Sob os auspícios de Barack Obama.
Por Baby Siqueira Abrão
Os objetivos da visita de Barack Obama a Israel, em 20 de março, resumem-se a dois. Um deles, já anunciado, é o Irã. O outro, inesperado, é o fim da ocupação sionista da Palestina. Ao menos é o que afirma o jornal estadunidense ‘World Tribune’.com. No domingo, 3 de março, o ‘World’ publicou que, segundo fontes israelenses, Obama exigirá do primeiro-ministro Benjamin Netanyhau um plano detalhado para a retirada do exército sionista e do meio milhão de colonos que vive ilegalmente na Cisjordânia. A medida está sendo considerada uma “iniciativa dos Estados Unidos para o estabelecimento do Estado palestino na Cisjordânia” em 2014. Surpreendentemente, as fontes não citam Gaza.
“Obama já deixou claro a Netanyhau que a visita tem como pauta o Irã e o Estado da Palestina”, disse uma das fontes, sediada em Jerusalém. “A implicação disso é que, se Israel não der o que ele quer, Obama agirá por conta própria”, diz o jornal.
A decisão de Obama, segundo as fontes, tem causado preocupação no gabinete do primeiro-ministro, incapaz, até agora, de formar uma coalizão para o futuro governo. Isso, em função de um boicote dos partidos de esquerda e de uma aliança entre as duas novas forças políticas israelenses, “Yesh Atid” [Há um futuro] e “Jewish Home” [Lar Judeu]. Juntos, ambos contam com 31 das 120 cadeiras do Parlamento israelense. E ambos se opõem à devolução das terras [roubadas] da Cisjordânia aos palestinos.
“Os laços entre ‘Yesh Atid’ e ‘Jewish Home’ estão se estreitando”, afirmou Uri Ariel, o dirigente número 2 do Jewish Home.
Esse estreitamento de laços faz com que Netanyhau não consiga atrair nenhum partido para formar o novo governo, com exceção do “The Movement” [O movimento], de Tzipi Livni, ex-ministra das Relações Exteriores, que é apoiado pelos Estados Unidos. Por esse motivo, o presidente Shimon Peres concedeu mais duas semanas para Netanyhau compor seu novo gabinete.
SURPRESA E TRAIÇÃO
A aliança entre o “Yesh Atid”, o mais votado nas eleições parlamentares de janeiro, e o “Jewish Home” foi uma surpresa para Netanyhau. Mais do que isso, foi uma traição. Por um lado porque o primeiro-ministro sempre favoreceu os colonos que vivem ilegalmente na Palestina e esperava, em troca, obter milhares de votos. No entanto, recebeu um golpe ao vê-los formar a base e o eleitorado do “Jewish Home”. Por outro porque, encerradas as eleições, Yair Lapid, fundador e líder do “Yesh Atid”, prometeu apoio total a Netanyhau e acabou não honrando a palavra.
Já Naftali Bennet, colono nacionalista de extrema-direita e homem forte do “Jewish Home”, jamais escondeu sua pretensão de influir nas decisões do governo. Quase conseguiu. Por pouco não ultrapassou Netanyhau em vários momentos das pesquisas de intenção de voto, levando os analistas a dar como certa a vitória de seu partido. Isso conduziria os colonos ao topo da política israelense. No fim, porém, eles tiveram de se contentar com o terceiro posto, atrás do “Yesh Atid” e da coligação entre o “Likud” e o partido de extrema-direita “Yisrael Beitenu” [Israel é nosso lar], fundado pelo polêmico ex-ministro das Relações Exteriores Avigdor Lieberman, hoje respondendo a processo por fraude e corrupção.
“Tentei formar um governo o mais amplo possível nas quatro últimas semanas”, disse Netanyhau. “Mas não completei a tarefa e isso se deve ao boicote de certo setor”, lamentou, numa referência indireta ao “Yesh Atid”.
FIM DA OCUPAÇÃO DA PALESTINA?
O troco não tardou. Mas trata-se de um troco impensável no atual quadro da política israelense, e que somente seria possível por pressão externa pesada. A de Obama? Talvez. Em 1º de março, o diário israelense “Makor Rishon” publicou que a primeira medida do próximo governo de Netanyhau seria pôr fim a um grande número de colônias judaicas na Cisjordânia. Quem acompanha o dia a dia de Israel sabe que Netanyhau nem mesmo cogitaria algo assim – até porque seu partido, o “Likud”, opõe-se ao estabelecimento do Estado palestino e advoga a anexação do que resta da Palestina histórica a Israel.
De todo modo, segundo o “Makor”, esse projeto dependeria de o “Yesh Atid” romper o acordo com o “Jewish Home”. Não para impedir o desmantelamento das colônias, como pode parecer à primeira vista. O objetivo é obter ajuda para efetivar a medida. O comentário de um negociador do “Likud” a um parlamentar do “Yesh Atid” reforça a impressão de que existem mesmo forças externas poderosas agindo sobre o governo sionista: “Teremos de tomar decisões difíceis”, disse o negociador. “Se vocês não quebrarem o pacto com Bennet, não seremos capazes de tirar as colônias [da Cisjordânia], caso tenhamos necessidade de fazer escolhas difíceis. Mas juntos podemos tocar isso.”
Outros jornais israelenses publicaram notícias semelhantes, citando fontes do “Likud”. O problema é que o desmantelamento das colônias judaicas ilegalmente construídas na Cisjordânia carece de apoio político dentro de Israel. Isso, porém, não constitui novidade. Mas, se a ordem para a retirada das colônias partiu realmente do governo dos Estados Unidos, Netanyhau terá de arrumar esse apoio.
O LOBBY SIONISTA PERDE PODER
Outra espada a pesar sobre a cabeça do primeiro-ministro é a possibilidade de Obama cortar parte considerável da ajuda financeira e militar dos Estados Unidos a Israel. Isso vem provocando arrepios e movimentações frenéticas do lobby sionista estadunidense, em especial de seu carro-chefe, a AIPAC (American Israeli Public Affairs Committee, ou Comissão de Negócios Públicos Estadunidense-Israelense).
Mas nenhum lobby sionista, por mais endinheirado que seja, consegue vencer a opinião pública. E a dos Estados Unidos vem engrossando a voz contra os 3,1 bilhões de dólares aprovados pelo Congresso como verba destinada a Israel em 2013, e contra as posições habituais dos congressistas, acusados de legislar a favor de Israel e não segundo os interesses da população estadunidense, obrigada a carregar o ônus da crise financeira do país. Para setores combativos dessa população, o dinheiro da ajuda a Israel deve ser investido na geração de empregos, na educação e na saúde dos estadunidenses.
Ativistas desses setores encontraram um modo criativo e direto de mostrar sua posição e suas prioridades. No encontro anual da AIPAC, no primeiro fim de semana de março, os membros da organização foram obrigados a encarar protestos populares de rua. Em frente ao local da reunião, militantes “vestidos” de prédios de apartamentos criticavam as colônias judaicas construídas em território palestino, considerando-as o maior obstáculo à paz.
UM GOLPE NO ESTADO ÚNICO
Confirmado o xeque-mate de Obama a Netanyhau quanto à retirada dos colonos e do exército dos territórios palestinos, os apoiadores da solução do Estado único terão de mudar de tática. Na Palestina, a agenda é encontrar meios de garantir direitos plenos ao povo nativo, o que só é viável com o fim do regime do apartheid e com a neutralização política do movimento sionista. Em Israel, a proposta é anexar formalmente Gaza e Cisjordânia – ou só a Cisjordânia, pois até nisso há opiniões divergentes – e reforçar as leis do apartheid, para que os palestinos não votem em eleições gerais e não possam, desse modo, mudar o atual quadro político.
Nessa proposta, eles seriam cidadãos de segunda categoria – como já o são os palestinos nascidos e domiciliados em Israel –, para que o crescimento demográfico, bem maior entre os palestinos do que entre os israelenses, não ameace o sionismo. Além disso, de acordo com uma lei de 2011, eles seriam obrigados a jurar lealdade ao “Estado judeu”, o que, definitivamente, nenhum palestino faria.
Se o governo dos Estados Unidos, na certa apoiado por outras superpotências, conseguir o fim da ocupação e o estabelecimento do Estado palestino nas “fronteiras” anteriores à Guerra dos Seis Dias (junho de 1967) – conhecidas como “Linha Verde” –, a solução de dois Estados terá vencido e a do Estado único, democrático e secular, com direitos iguais para todos os cidadãos, terá de esperar melhor oportunidade.
NETANYHAU CONTRA O MURO
Caso seja efetivamente obrigado a destruir as colônias judaicas na Palestina, o primeiro-ministro Benjamim Netanyhau estará pagando o preço de uma arrogância sem limites, do absoluto pouco-caso em relação ao direito internacional e às resoluções das Nações Unidas, do ouvido mouco às admoestações da comunidade internacional quanto ao terrorismo cometido contra os palestinos pelos soldados e colonos e quanto à expansão das colônias ilegais, e do apoio dado por ele a Mitt Romney, contra Obama, nas eleições presidenciais dos Estados Unidos, ano passado.
As relações entre Netanyhau e Obama, que nunca foram boas, azedaram de vez com a vitória de Obama. O presidente dos EUA jamais falou abertamente no assunto, mas fontes da Casa Branca se encarregaram de dizer que ele haveria de se vingar do primeiro-ministro sionista quando chegasse a hora.
Parece que a hora chegou. Fontes do governo israelense afirmam que a visita de Obama será a prova de fogo à liderança e à credibilidade de Netanyhau. A Casa Branca já teria alertado o primeiro-ministro de que o clima e as decisões da visita devem caracterizar a relações entre Estados Unidos e Israel nos próximos quatro anos. Os assessores de Obama fizeram questão de enfatizar que o mesmo Congresso que aprovou os US$ 3,1 bilhões a Israel também apoia o estabelecimento do Estado palestino como “prioridade dos EUA”.
“A base de Obama no Congresso enviou a Netanyhau essa mesma mensagem”, finalizou a fonte do ‘World Tribune’.
Agora, é aguardar para ver se Barack Obama passará à história como o homem que conseguiu – sem prejuízo da resistência heroica e diária dos palestinos – concretizar o fim da ocupação da Palestina. Já esperar a pacificação dos sionistas indica apenas gosto excessivo pela ficção.”
FONTE: escrito por Baby Siqueira Abrão, jornalista, autora de diversos livros e pós-graduanda em Filosofia. Mora em Ramallah, Palestina, onde é correspondente do jornal “Brasil de Fato”. Transcrito no site “Carta Maior” (http://www.cartamaior.com.br/templates/analiseMostrar.cfm?coluna_id=6001). [Imagem do Google e trecho entre colchetes introduzidos por este blog ‘democracia&política’].
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