A Folha de São Paulo publicou ontem o seguinte artigo de Luiz Carlos Bresser-Pereira. O autor é professor emérito da Fundação Getulio Vargas, ex-ministro da Fazenda (governo Sarney), da Administração e Reforma do Estado (primeiro governo FHC) e da Ciência e Tecnologia (segundo governo FHC). É autor de "Macroeconomia da Estagnação: Crítica da Ortodoxia Convencional no Brasil pós-1994".
A LÓGICA DA GUERRA, TÃO IRRACIONAL QUÃO IMPLACÁVEL, SÓ SERÁ QUEBRADA QUANDO MUDAR A POLÍTICA DOS EUA
“O ataque de Israel a Gaza tem uma lógica -os foguetes de fundo de quintal lançados pelo Hamas- e uma oportunidade: as próximas eleições naquele país.
Mais amplamente, entretanto, o terrorismo do Estado de Israel contra o terrorismo palestino é um capítulo do equívoco geopolítico dos Estados Unidos e de Israel em relação ao Oriente Médio.
Durante a Guerra Fria, fazia sentido para a grande potência apoiar incondicionalmente Israel, já que este era seu aliado mais seguro na competição contra a União Soviética.
Depois que ela terminou, o objetivo de segurança nacional tanto dos Estados Unidos como de Israel deveria ter sido o de estabelecer relações comerciais e políticas de interesse mútuo com os demais países da região.
Infelizmente, não foi isso que aconteceu. A relação próxima entre o presente ataque e as próximas eleições tem sido apontada por inúmeros analistas. Por outro lado, esses e outros analistas informam sobre o crescente pessimismo e insegurança da maioria judaica em Israel. As duas posições são aparentemente contraditórias, mas é possível compreendê-las.
Os israelenses apoiam a guerra porque querem mais segurança, mas no seu íntimo sabem que a guerra não aumentará sua segurança -pelo contrário, a diminuirá porque fortalecerá o ódio dos países muçulmanos vizinhos e porque será mais um capítulo da crescente diminuição de apoio dos demais países devido à intransigência de Israel em relação a um acordo- principalmente se não cumprir as resolução da ONU (Organização das Nações Unidas) determinando que desocupe os territórios que pertencem à Palestina.
É muito difícil para os israelenses saírem da armadilha em que estão metidos. Sociedade desenvolvida e democrática, muitos de seus cidadãos são críticos da política de seu Estado. Mas estes são a minoria. A maioria quer a guerra -o que mostra que também a democracia pode ser origem do nacionalismo étnico e religioso. O nacionalismo econômico faz parte da lógica da globalização e da democracia; é parte da competição internacional. Já o nacionalismo étnico e o religioso são violentos, são fontes de limpeza étnica -foi assim que os palestinos foram expulsos de suas terras e concentrados na faixa de Gaza.
O que é paradoxal é que possam ser sustentados pelo voto popular, como vimos ser o nacionalismo étnico na Alemanha, e vemos hoje o nacionalismo étnico e religioso em Israel.
Quais as conseqüências dessa incapacidade de Israel de negociar com os palestinos e lhes garantir um Estado? No curto prazo, a violência e o ódio dos dois lados serão crescentes. E no longo prazo? O aumento da indignação e do ódio nos países vizinhos não permite otimismo. Se para os Estados Unidos essa é uma ameaça longínqua, para Israel é uma ameaça concreta; por isso, os israelenses estão pessimistas. Os países muçulmanos não submetidos à dominação norte-americana estão se fortalecendo. O Irã e a Turquia, principalmente, mas também a Síria e o Líbano. Em toda a região, novos partidos políticos islâmicos combinam um necessário nacionalismo econômico com um perigoso nacionalismo étnico semelhante ao de Israel.
O que vemos na região não é a lógica da paz, mas a da guerra. Uma lógica tão irracional quão implacável que só poderá ser quebrada quando mudar a política dos Estados Unidos.”
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