LEY DE MEDIOS DA ARGENTINA E EXEMPLOS DE EQUADOR E URUGUAI
“O portal “Conversa Afiada” reproduz artigo de Altamiro Borges, extraído do seu blog:
AS DERROTAS DA MÍDIA NA AMÉRICA LATINA
Por Altamiro Borges
“Em 2013, a América Latina se manteve na vanguarda da luta pela regulação da mídia. A região conhece bem os estragos causados por uma mídia concentrada e manipuladora. Os golpes e ditaduras que infelicitaram o continente foram bancados pelos veículos de imprensa. O neoliberalismo que dizimou a região também foi apoiado por esse setor. Já os governos progressistas nascidos da luta contra as chagas neoliberais tiveram como principal opositor o “Partido da Imprensa Golpistas (PIG)”. Nada mais natural, portanto, que a regulação se tornasse uma exigência democrática.
“LEY DE MEDIOS” DA ARGENTINA
A derrota mais sentida pelos barões da mídia no ano passado se deu na Argentina. Em outubro, finalmente a Suprema Corte do país declarou a constitucionalidade de quatro artigos da “Ley de Medios” que eram contestados pelo “Grupo Clarín”, principal império midiático da nação vizinha. Essa decisão histórica permitiu que o governo de Cristina Kirchner prosseguisse com a aplicação integral da nova legislação, considerada uma das mais avançadas do mundo no processo de desconcentração e democratização dos meios de comunicação.
Pelas regras agora em vigor, os grupos monopolistas têm um prazo definido para vender parte de seus ativos com o objetivo expresso de “evitar a concentração da mídia”. O “Grupo Clarín”, maior ‘holding’ multimídia do país, terá de ceder, transferir ou vender de 150 a 200 outorgas de rádio e televisão, além dos edifícios e equipamentos onde estão as suas emissoras. A batalha pela constitucionalidade dos quatro artigos durou quatro anos e agitou a sociedade argentina. O “Clarín” – que fez fortuna durante a ditadura militar – agora não tem mais como apelar.
Aprovada por ampla maioria no Congresso Nacional e sancionada por Cristina Kirchner em outubro de 2009, a nova lei substitui o decreto-lei da ditadura militar. Seu processo de elaboração envolveu vários setores da sociedade – academia, sindicatos, movimentos sociais e empresários. Após a primeira versão, ela recebeu mais de duzentas emendas parlamentares. No processo de debate que agitou a Argentina, milhares de pessoas saíram às ruas para exigir a sua aprovação. A passeata final em Buenos Aires contou com mais de 50 mil participantes.
Mesmo assim, os barões da mídia tentaram sabotá-la, apostando suas fichas na Suprema Corte da Argentina. Isso explica porque a sentença de outubro abalou tanto os impérios midiáticos da região, reunidos na “Sociedade Interamericana de Imprensa” (SIP). Num discurso terrorista, eles afirmaram que a nova lei é autoritária. Mas até o “Relator Especial sobre Liberdade de Expressão da Organização das Nações Unidas” (ONU), Frank La Rue, reconheceu que a “Ley de Medios” da Argentina – com seus 166 artigos – é uma das mais avançadas do planeta e visa garantir exatamente a verdadeira liberdade de expressão, que não se confunde com a “liberdade dos monopólios midiáticos”.
EQUADOR E URUGUAI DÃO EXEMPLO
A Argentina não foi a única a avançar nesse debate estratégico na região. Outros dois países deram passos significativos nesse sentido em 2013. Em junho, o parlamento do Equador aprovou o projeto do governo de Rafael Correa que cria um órgão de regulação da mídia com poderes para sancionar, econômica e administrativamente, os veículos da imprensa e que definirá os critérios para as futuras concessões de rádio e televisão no país. O projeto tramitou por quatro anos na Assembleia Nacional e foi aprovado por folgada maioria – 108 a favor e 26 contra.
Além de criar a “Superintendência de Informação e Comunicação”, que terá o papel de “vigilância, auditoria, intervenção e controle”, a lei reserva 33% das futuras frequências de rádio e TV para a mídia estatal, 33% para emissoras privadas e 34% para os grupos indígenas e comunitários. Ela também garante amplo direito de resposta, contrapondo-se ao chamado “linchamento midiático”. Caso julgue que pessoa física ou jurídica foi “caluniada e desacreditada” pela mídia, a Superintendência pode obrigar o veículo responsável a divulgar um ou mais pedidos de desculpas.
Para o deputado Mauro Andino, relator do projeto, a nova lei com seus 119 artigos representa significativo avanço na democracia no Equador e na garantia da verdadeira liberdade de expressão. “Como cidadãos, queremos a liberdade de expressão com os limites dados pela Constituição e pelos instrumentos internacionais, além de liberdade de informação com responsabilidade… Propusemos uma lei que se constrói a partir de um enfoque de direitos para todos, não para um grupo de privilegiados”. Vale lembrar que a mídia equatoriana é controlada por banqueiros!
Para irritar ainda mais os barões da mídia do continente, em dezembro último a Câmara dos Deputados do Uruguai aprovou a “Lei dos Serviços de Comunicação Audiovisual”, proposta pelo governo de José Pepe Mujica. Com 183 artigos, a nova “Lei de Meios” encara os meios de comunicação como um direito humano e define que “é dever do Estado assegurar o acesso universal aos mesmos, contribuindo dessa forma com liberdade de informação, inclusão social, não-discriminação, promoção da diversidade cultural, educação e entretenimento”.
Em seu enunciado, a nova lei enfatiza que os monopólios dos meios de comunicação “conspiram contra a democracia ao restringir a pluralidade e a diversidade que asseguram o pleno exercício do direito à informação”. Visando corrigir essa distorção, o texto propõe “plena transparência no processo de concessão de autorizações e licenças para exerce a titularidade” nas emissoras de rádio e televisão. Ele também prevê a criação de um “Conselho de Comunicação Audiovisual”, com o intento de “implementar, monitorar e fiscalizar o cumprimento das políticas”.
A nova lei uruguaia ainda estabelece cotas mínimas de produção audiovisual nacional, institui o horário eleitoral gratuito nos canais e determina que as empresas telefônicas não poderão explorar concessões de rádio ou tevê. Ela também contempla a proteção à criança e ao adolescente, já que regula a veiculação de imagens com “violência excessiva”. Das 6h às 22h, esse tipo de conteúdo é proibido, com a exceção para “programas informativos, quando se tratar de situação de notório interesse público” e somente com aviso prévio explícito sobre a exposição dos menores.
A REAÇÃO DA MÁFIA MIDIÁTICA DA SIP
As recentes mudanças legais na Argentina, Equador e Uruguai se somam as que já estavam em vigor na Venezuela – o primeiro país da região a encarar esse tema estratégico –, Bolívia e Nicarágua. Não é para menos que o rebelde continente latino-americano é hoje maior entrave ao poder dos monopólios da mídia. Em outubro passado, durante a 69ª Assembleia-Geral da “Sociedade Interamericana de Imprensa” (SIP), os poderosos empresários do setor confessaram que estão perdendo a batalha de ideias na América Latina e decidiram reforçar sua postura oposicionista.
Na maior caradura, o presidente da SIP, Jaime Mantilla, disse que “os governos latino-americanos têm se dedicado a semear o ódio e o medo” contra os meios de comunicação. O objetivo da entidade, sediada em Miami, com famosos vínculos com a CIA e que sempre apoiou os golpes e as ditaduras, é evitar que as novas legislações sejam aplicadas em sua plenitude e que contagiem outros países da região. O Brasil, inclusive, foi citado como preocupação maior dos mafiosos da mídia do continente. Se depender da presidente Dilma Rousseff, porém, eles podem dormir tranquilamente.”
(*) Em nenhuma democracia séria do mundo, jornais conservadores, de baixa qualidade técnica e até sensacionalistas, e uma única rede de televisão têm a importância que têm no Brasil. Eles se transformaram num partido político – o PiG, Partido da Imprensa Golpista.”
FONTE: escrito pelo jornalista Altamiro Borges (http://www.conversaafiada.com.br/pig/2014/01/02/as-derrotas-do-pig-na-america-latina/).
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