segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

DECADENTES E EMERGENTES

O jornal Folha de São Paulo ontem publicou o seguinte artigo de Aloizio Mercadante, economista e professor licenciado da PUC-SP e da Unicamp e senador da República pelo PT-SP:

Ao contrário dos EUA, as economias emergentes estão em situação relativamente mais favorável, sobretudo os Brics

"A HISTÓRIA NADA ENSINA, APENAS CASTIGA QUEM NÃO APRENDE SUAS LIÇÕES" (V. KLINCHEVSKY, HISTORIADOR RUSSO)

“Crises Financeiras são fenômenos recorrentes na evolução das economias capitalistas.

Apesar de seus efeitos desestabilizadores e desorganizadores, elas têm um caráter saneador.

São movimentos de correção de excessos de valorização de ativos reais ou financeiros -em geral, de natureza especulativa- que costumam ocorrer nas fases de expansão do ciclo econômico.

Quando desbordam a esfera financeira, as crises atuam também como vetores de ajustes estruturais, espécie de incubadora do processo de transição de um para outro padrão de alocação de recursos e de ordenamento das relações econômicas internacionais.

Foi assim, por exemplo, em 1929, nos EUA, quando o liberalismo exuberante dos anos precedentes implodiu e gerou uma prolongada e intensa depressão econômica. A reversão desse quadro só se materializaria no pós-guerra, no marco de um novo padrão de organização e dinâmica do capitalismo -que passa a ter na regulação estatal um dos seus eixos centrais- e um rearranjo na estrutura e hierarquia do poder mundial, com o deslocamento da Inglaterra, já manifesto desde 1914, e a consolidação da hegemonia norte-americana.

A crise atual embute tendências similares de desajuste e transformação. É verdade que o quadro econômico mundial é hoje distinto. Os EUA têm um menor peso relativo (25% do PIB mundial, contra 42% em 1929), em parte devido à desterritorialização da sua base industrial e, ao contrário do que ocorria no passado, há na periferia capitalista economias emergentes de grande porte e dinamismo.

Por outro lado, as conexões e interdependências geradas pelo avanço da globalização e financeirização da economia mundial amplificaram notavelmente a propagação e o impacto desestabilizador das crises, sobretudo quando originadas, como a atual, no núcleo do sistema capitalista.

A crise do "subprime" transmutou-se em crise de crédito norte-americana e, na fase seguinte, em crise financeira global. Agora, em crise econômica global. Praticamente todos os países mais avançados já estão em recessão, e mesmo economias de maior dinamismo, como a chinesa, já dão mostras de desaceleração. Não é provável, mas é possível a ocorrência de uma depressão acentuada da economia norte-americana, com desdobramentos em escala planetária.

Todo esse processo tem implicações que não são triviais.

A crise revelou as debilidades e inconsistências do modelo de auto-regulação do mercado que prevaleceu nas últimas décadas, cujo desmoronamento está a exigir enorme volume de recursos públicos e ampla e generalizada intervenção salvadora do Estado.

Sua reformulação é inevitável.

Revelou também a incapacidade do ordenamento financeiro erigido a partir da ruptura do acordo de Bretton Woods -que transformou o dólar em moeda padrão internacional e constitui um dos elementos estratégicos de preservação da hegemonia norte-americana- para assegurar a estabilidade e simetria das relações econômicas internacionais.

O processo de endividamento do Estado e das famílias (estas devem, em média, 140% da sua renda disponível), que sustentou a expansão do consumo interno e o crescimento do PIB norte-americano nos últimos anos, esgotou-se.

A evolução da crise embute, nesse contexto, vetores que apontam em direção ao declínio da primazia norte-americana. O que não significa subestimar a capacidade de recuperação dos EUA -pela dimensão de sua economia e sua capacidade tecnológica e militar- e seu papel na definição de um novo modelo de ordenamento e governança da economia mundial.

A eleição de Barack Obama é, nesse sentido, promissora. É um sinal de revitalização da democracia norte-americana e uma esperança de mudança, que oxalá não seja tardia, dada a dimensão do desastre atual.

Ao contrário dos EUA, as economias emergentes estão em situação relativamente mais favorável, especialmente os Brics (Brasil, Rússia, Índia e China), o que não significa que não serão atingidas pela contração da economia mundial.

O Brasil, por exemplo, certamente será afetado, mas tem condições de sair na frente no processo de retomada pós-crise. Para isso, além do equacionamento das dificuldades existentes nas áreas creditícia e cambial, é essencial a adoção, desde já, de política monetária e fiscal anticíclica, que preserve a capacidade produtiva da economia, o investimento e o emprego e assegure proteção social aos segmentos sociais mais vulneráveis.

Um comentário:

phobus disse...

-Nova Ordem- Nações e pessoas ignoram que o poder e riquezas são efêmeros.É histórico que grandes impérios e sociedades ruíram.O sistema financeiro atual foi mantido pelos E.U. enquanto lhe era conveniente e pode mantê-lo, assim como são mantidos os desacreditados sistema político e a mídia no Brasil, com sensacionalismo e propagandas enganosas, atendendo mais a interesses particulares e gananciosos, visando ao lucro a qualquer custo. Todos acima possuem algo em comum: os sistemas se exauriram, sendo que o primeiro implodiu antes destes últimos.Uma nova ordem mundial exige novos parâmetros como observação éticos e dos valores morais da maioria e com a participação de todos, para terem credibilidades e evoluírem em beneficio de todos.