Li no jornal Tribuna da Imprensa o seguinte artigo de Manuel Cambeses Júnior. O autor é coronel-aviador, conferencista especial da Escola Superior de Guerra, membro titular do Instituto de Geografia e História Militar do Brasil e vice-diretor do Instituto Histórico-Cultural da Aeronáutica:
“Transcorreram apenas vinte anos da queda do Muro de Berlim e a ingênua e efêmera euforia dessa época converteu-se em um passado remoto. A "Nova Ordem Mundial", embasada na unipolaridade e na "Pax Americana", que despertou as ilusões de alguns e os temores de outros, encontra-se profundamente desgastada e esquecida, juntamente com os jornais da época da Guerra do Golfo.
Samuel Huntington, em um interessante artigo publicado na revista Foreign Affairs intitulado "A superpotência solitária", afirma que estamos vivendo um sistema internacional de transição, ou seja, um estranho híbrido a que ele batizou de "unimultipolar". O momento unipolar já expirou e, dentro de duas décadas ingressaremos em um verdadeiro sistema multipolar. Segundo Zbigniew Brzezinski, os Estados Unidos serão a primeira, última e única superpotência global. Nesse período transitório, esse país continuará sendo o único com preeminência em todas as dimensões do poder, em suas diversas expressões: política, econômica, social, ideológica, militar, tecnológica e cultural, com o alcance e a capacidade de promover os seus interesses, a nível global.
Entretanto, a solução dos problemas fundamentais do sistema requer, necessariamente, a ação conjunta da superpotência e de alguma combinação com outras grandes potências.
Os Estados Unidos mantêm, no momento, o direito de veto nos assuntos de maior relevância internacional. Várias potências regionais estão fortalecendo suas posições em suas esferas de atuação geopolítica. A China e, potencialmente, o Japão, na Ásia Oriental; a União Européia, liderada, em minha opinião, pela Alemanha, ainda quando encontramos quem advogue a liderança de um condomínio franco-alemão. A Rússia, na Eurásia; a India, no Sul da Ásia; o Irã, na Ásia Sul-Ocidental; a África do Sul e a Nigéria, no continente africano e, o Brasil, na América Latina.
Estamos, portanto, vivendo um período de transição e, como sói acontecer, toda mudança sempre implica em contradições e riscos. A globalização econômica e o cosmopolitismo cultural ocorrem, conjuntamente, com um extraordinário ressurgimento do medo e da desconfiança com o diferente, com o estranho e com o desconhecido .
Assistimos ao retorno do tribalismo, dos etnicismos, da xenofobia, dos racismos e dos fundamentalismos religiosos. Estas forças desintegraram a União Soviética, pulverizaram a Iugoslávia, dividiram a Checoslováquia e converteram em Estados fracassados alguns países como Congo, Afeganistão, Libéria, Somália, Ruanda e Serra Leoa, entre outros.
A Indonésia e vários países da Ásia Central correm o risco de cair no mesmo despenhadeiro. As forças da desagregação assolam, também, a países avançados como Canadá, Bélgica e Espanha. A América Latina, felizmente, até o presente momento, não tem sofrido, de forma avassaladora, a pressão dessas forças centrífugas, ainda que alguns Estados com grande proporção de populações indígenas descuram-se em prevenir-se contra potenciais explosões raciais e étnicas.
Estamos vivendo em um mundo perigoso, na qual a soberania, já bastante limitada, dos pequenos e médios Estados, vê-se cada vez mais ameaçada, não somente pela presença das grandes potências e pelas forças secessionistas mas, também, pelo crescente poder globalizado das máfias, da criminalidade organizada, dos grupos terroristas de cunho fundamentalista e pelas seitas apocalípticas. Para reduzir nossa vulnerabilidade frente a essas ameaças é necessário, em primeiro lugar, que nos fortaleçamos internacionalmente, aumentando a capacidade da sociedade e o potencial do Estado brasileiro. Isto implica, fundamentalmente, num verdadeiro Estado de Direito. Sem o império da lei, sem segurança jurídica, sem regras econômicas bastante claras e estáveis, não existirá criação de riqueza, somente distribuição desigual da miséria.
Certamente não haverá um projeto histórico mais ou menos autônomo para a América Latina, neste alvorecer do terceiro milênio, sem unidade e coesão dos Estados-Membros. Ademais, é urgente e necessário que transformemos a integração latino-americana em um imperativo geopolítico, se desejamos deixar de ser considerados exóticos e marginais espectadores no cenário internacional.”
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