Li hoje no site “Carta Maior” o seguinte artigo do filósofo e cientista político Emir Sader:
“O quadro político-eleitoral vai se configurando, conforme nos aproximamos de 2010. Algumas de suas peças não estão claras, entre elas o lugar - ou o não-lugar - de Aécio, se o bloquinho conseguirá manter a candidatura de Ciro Gomes, a posição do PMDB.
Outras das incógnitas é a plataforma da oposição. O diálogo mais significativo das últimas semanas se deu entre Serra - pré-candidato presidencial tucano - e um dirigente do DEM. Este cobrava uma postura mais agressiva, de crítica dura ao governo, porque se estaria deixando a passarela livre para que Lula leve Dilma a desfilar sozinha. Serra respondeu dizendo que ele criticava, havia acabado de criticar o Banco Central e sua tímida e lenta política de redução dos juros. O dirigente do DEM o interrompeu imediatamente: - Não, com o Banco Central nós estamos de acordo, é preciso criticar outras coisas.
Esse desencontro dá idéia da crise de identidade da oposição diante do governo Lula. Conta com os candidatos melhor situados – o que pode ser vantagem ou desvantagem, conforme a solução da disputa interna entre eles – nas pesquisas, mas não dispõem de uma plataforma. A candidatura de Alckmin foi uma possibilidade: um programa neoliberal puro e duro que, se foi derrotado antes da crise, hoje estaria totalmente deslocado, diante do fracasso da centralidade do mercado e do resgate do papel do Estado. Essa opção favoreceu o segundo turno para Lula, que polarizou pela esquerda e venceu com boa margem. Está claro que Dilma personificará essa política, de forma acentuada.
O perfil de Serra é originalmente distinto do de Alckmin. Desenvolvimentista como economista, tentou manter certo espaço próprio dentro do governo FHC – governo coerentemente neoliberal -, especialmente quando assumiu o Ministério da Saúde. Mas na prefeitura e no governo de São Paulo se rendeu aos interesses do grande empresariado paulista – é o queridinho da Fiesp – privatizando e se revelando mais um neoliberal que um desenvolvimentista.
Aécio, mineiramente, já anunciou uma eventual alternativa: seria um candidato pós-Lula e não anti-Lula. Esta seria uma via de derrota, mas a outra permitiria reivindicar aspectos do governo – especialmente políticas sociais -, além de não se comprometer a retomar as privatizações do governo FHC e se distanciar de um governo cuja recordação a oposição tentará ocultar, enquanto a campanha governamental forçará a comparação entre os governos de FHC tucano e petista.
Caso mantenha a dianteira, a candidatura opositora evitará maiores definições, qualquer reivindicação do governo FHC, concentrará algumas críticas ao governo Lula – carga tributária, alianças nas políticas internacionais, gastos estatais -, sem a necessidade de uma plataforma mais clara. Contam que a crise se prolongue e desgaste o ainda imenso apoio governamental de hoje.
O que unifica a oposição é o objetivo de tentar tirar o PT do governo, se reapropriar do Estado, mesmo em um marco de diferenças entre os partidos que a compõem. Mais difícil será se a candidatura governamental, exibindo os sucessos da política governamental e propondo o desdobramento desse horizonte, em um marco de recuperação econômica, avança nas pesquisas, obrigando a oposição a se definir em relação aos projetos do governo. Projetos que a própria oposição considera que deram certo, responsáveis que são pelo apoio ao governo, difíceis de serem atacados. A atitude mesma de que as incorporará, facilita sua legitimidade e dificulta a crítica a elas.
De qualquer maneira, a oposição só conquista um lugar no espectro político diferenciando-se do governo. Ser pós-Lula é mais um jogo de palavras, porque a plataforma da candidatura governamental será a prolongação e o aprofundamento do governo Lula. Será provavelmente uma versão light do neoliberalismo, adaptada aos tempos de crise desse modelo.”
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