terça-feira, 29 de julho de 2008

ESTADOS UNIDOS PREJUDICAM SATÉLITES BRASILEIROS

Li essa notícia hoje no site www.inovacao.unicamp.br. Ela nos mostra como é real e presente o monitoramento norte-americano para impedir o nosso desenvolvimento nas áreas que agregam mais valor aos produtos nacionais.

As áreas espacial, aeronáutica, de eletrônica, química e mecânica finas, de fármacos, informática, biotecnologia, fortes geradoras de produtos de alto valor agregado, têm o desenvolvimento nacional inibido ao máximo pelos países detentores dessas tecnologias. Para as grandes potências industriais e militares, o papel ideal do Brasil é de exportador contido e disciplinado de produtos agrícolas, matérias-primas ou de semimanufaturados, e de importador de produtos que valem milhares de dólares por quilo. É assim, hoje, a diferença entre metrópole e colônia. Vejamos a notícia de hoje que selecionei sobre o assunto:

SATÉLITE SINO-BRASILEIRO

EUA IMPÕEM RESTRIÇÕES À COMPRA DE COMPONENTES PARA O CBERS


“As restrições impostas à importação de componentes para a fabricação do Satélite Sino-Brasileiro de Recursos Terrestres, o CBERS-3, provocaram alterações no cronograma de lançamento do satélite. Inicialmente previsto para ir ao espaço em 2009, o CBERS-3 só estará pronto para lançamento em 2010. As dificuldades de importação de componentes resultam da ação dos Estados Unidos. O governo dos EUA teme que exportações de produtos de empresas norte-americanas a ser embarcados no CBERS-3 resultem em transferência de tecnologias sensíveis para os chineses, que podem ser usadas por estes com fins militares.

As restrições atrasaram as entregas de partes dos subsistemas do CBERS-3 que eram de responsabilidade do Brasil na parceria com a China. O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), que gerencia o programa CBERS, contrata empresas no País para desenvolver e produzir parte desses subsistemas. Algumas dessas firmas tiveram problemas na importação dos componentes. Em julho, o instituto recebeu a notícia de que mais três componentes importantes não serão vendidos para o projeto.

A informação foi dada dia 17 de julho por Jânio Kono, gerente da área espacial do programa CBERS, durante mesa-redonda sobre o programa e a formação de recursos humanos para a indústria aeroespacial na 60ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Kono não revelou quais são os três componentes que não serão entregues.

Os subsistemas do satélite sino-brasileiro sob responsabilidade do Brasil são: estrutura; suprimento de energia; telecomunicações de telemetria e telecomando; imageadores; transmissores de dados; gravador de dados; carga útil de coleta de dados. Além desses subsistemas, o Brasil fabrica os computadores de supervisão de bordo e controle de atitude. Em todos os subsistemas houve restrições de importação dos EUA que causaram atrasos no desenvolvimento, testes e fabricação. O país é líder em tecnologias espaciais.

AS RESTRIÇÕES DOS EUA

Uma das empresas impedidas de comprar componentes nos EUA foi a Opto Eletrônica, de São Carlos (SP). A empresa ficou encarregada de montar duas câmeras do CBERS-3, e teve de cancelar um contrato de US$ 45 mil com a International Rectifier (IR), da Califórnia, em 2007. O componente comprado — um conversor de corrente altamente sensível — não pôde ser embarcado para o Brasil, mesmo depois de pago, porque as severas regras do governo dos EUA impediram a empresa californiana de fornecer o produto. Empresas norte-americanas que exportem tecnologia considerada sensível pelo Departamento de Estado dos EUA são fortemente penalizadas. O receio dessas penalidades, impostas pelo governo, fazem-nas desistir de negócios com países como China, Coréia do Norte, Cuba e Irã, entre outros.

As empresas dos EUA pedem a seus compradores no exterior para assinar o que chamam de "bomb letter". Na carta, o comprador se compromete a não dar a esses produtos nenhuma destinação que os EUA não aprovariam, como a fabricação de bombas — daí o nome. Limitar a transferência de tecnologia também é preocupação de outros países, que os faz adotar medidas e restrições semelhantes às dos EUA.

No caso norte-americano, há uma norma específica sobre isso, conhecida pela sigla ITAR — International Traffic in Arms Regulations. Nela, há uma lista que classifica os países em graus de proibição de exportação, segundo o desenvolvimento tecnológico e as relações comerciais e políticas de cada um deles com os EUA. A ITAR também enumera quais componentes devem ter a exportação restringida ou impedida. As firmas norte-americanas, ao cumprir a norma, deixaram de exportar vários componentes para o Brasil, em razão da participação da China no CBERS.

ESTADOS UNIDOS PREJUDICAM SATÉLITES BRASILEIROS

Jarbas Caiado de Castro Neto, presidente da Opto, foi o primeiro a mencionar o embargo às importações por parte dos EUA durante a mesa-redonda na reunião anual da SBPC. A Opto desenvolve e constrói duas câmeras para o CBERS-3: uma multiespectral de alta resolução, conhecida pela sigla MUX, que a empresa desenvolve sozinha e que servirá para monitoramento ambiental e gerenciamento de recursos naturais; e uma câmera imageadora de amplo campo de visada, conhecida pela sigla WFI, desenvolvida em consórcio com a empresa Equatorial Sistemas. Esse último tipo de câmera cobre grandes extensões territoriais, maiores do que as cobertas pela MUX, por exemplo, que registra mais detalhes. "No caso da WFI, que é muito mais simples do que a MUX, se não fosse o boicote norte-americano, já estaríamos em uma etapa mais avançada", contou Castro Neto.

O empresário afirmou que, sem o embargo dos EUA, a câmera estaria sendo qualificada em modelo de vôo, praticamente a fase final de testes no desenvolvimento de um satélite. Em qualquer programa espacial, como lançamento de satélites, há uma série de testes feitos para qualificar os componentes, subsistemas, todas as tecnologias utilizadas. Qualificar significa verificar se os subsistemas e componentes atendem aos requisitos técnicos dados por quem encomendou o satélite. Esses requisitos definem o que cada componente ou subsistema deve fazer e dão os parâmetros para que estes "sobrevivam" às condições de vôo e ao ambiente espacial. Por exemplo: os componentes devem operar perfeitamente em ambientes sem gravidade, resistir a grandes variações de temperatura, etc.

Contudo, Castro Neto destacou que os problemas de importação, por conta da norma ITAR, não são de todo negativos, pois estão se transformando em oportunidade. Podem tornar o País mais independente de nações mais desenvolvidas no que se refere às tecnologias para os satélites, comentou ele na apresentação na SBPC.

SOLUÇÃO PARA O BLOQUEIO DE IMPORTAÇÕES

Como participante da platéia, Jânio Kono, do INPE, usou o espaço de debates para oferecer mais informações sobre o assunto. Segundo ele, o maior problema no desenvolvimento do CBERS-3 foi o embargo às importações de componentes. Quando o Brasil e a China construíram o CBERS-2, já houve alguma restrição, lembrou. Para o CBERS-3, disse ele, as câmeras e todos os subsistemas que ficaram sob responsabilidade do Brasil foram afetados pelas dificuldades impostas pelos norte-americanos. "Projetos foram recomeçados, refeitos, componentes foram trocados, causando atrasos", enumerou Kono.

Por e-mail, Kono contou a Inovação, de maneira mais detalhada, a forma encontrada pelo INPE para ajudar as empresas parceiras a atender as encomendas, de modo a não aumentar ainda mais o atraso no lançamento do satélite causado pela restrição na importação de componentes de alta confiabilidade e qualificados para uso no espaço. "Os problemas e os atrasos foram diferentes para cada subsistema e estão sendo resolvidos caso a caso", contou. Procuram-se, em primeiro lugar, componentes qualificados com funções similares que possam substituir os restritos. "Se não forem encontrados, há um impacto maior no projeto. Em certos casos, optou-se por mudanças substanciais na concepção do subsistema", completou. Em outros casos, procura-se qualificar para o uso no CBERS, por meio de testes adicionais (chamados de up-screening), componentes para os quais não há garantia de qualificação dos fabricantes. "Isso deve ser feito com cuidado para não comprometer a confiabilidade do satélite", alertou.

SETOR ESPACIAL NO BRASIL É MARCADO POR POUCAS ENCOMENDAS

O embargo na importação amplia os problemas das empresas do setor espacial no Brasil, que dependem muito do governo. Na Europa, as empresas do setor espacial têm encontrado um mercado em expansão por atuarem também em telecomunicações, por exemplo. Nos Estados Unidos, o programa espacial é estratégico e recebe grandes volumes de recursos por parte do governo, o que sustenta o setor.

Já no Brasil, há forte sazonalidade, devido à instabilidade no repasse de recursos, por parte do governo, aos projetos que integram o programa espacial brasileiro. César Ghizoni, presidente da empresa Equatorial Sistemas e um dos palestrantes da mesa-redonda sobre a importância do CBERS na formação de recursos humanos nas indústrias, e Jarbas Caiado de Castro Neto, da Opto, falaram das estratégias diferentes para sobreviver também a essa sazonalidade.

Os dois primeiros satélites do programa, CBERS-1 e 2, quase não contaram com a participação de empresas privadas. Praticamente tudo do CBERS-1 foi desenvolvido pelo INPE, dentro dos subsistemas que eram de responsabilidade do País. No CBERS-2, empresas participaram discretamente, e isso se ampliou no CBERS-2B e no CBERS-3. Mas, por quase cinco anos, o programa CBERS não fez nenhuma encomenda para a iniciativa privada.

Empresas como a Opto, que atua em outros nichos de mercado, conseguem gerar caixa com outras atividades para se manter enquanto o governo não faz uma encomenda. No caso da Opto, ela utiliza a expertise conseguida pela divisão aeroespacial, que trabalha com sistemas imageadores (câmeras) para satélite e ópticos para defesa, para desenvolver e fabricar produtos para uso civil. Daí ela ter uma divisão médica, com foco em oftalmologia, e de filmes finos, que trabalha com lentes de óculos anti-reflexo.

Já a Equatorial, que atua exclusivamente no setor, seguiu outro caminho: fez parceria com empresas internacionais para participar de projetos de outros países. O programa espacial brasileiro não gera demanda que consiga manter uma empresa funcionando por muito tempo, devido à sazonalidade das encomendas. A saída, segundo Ghizoni, foi se internacionalizar. A Equatorial tem como acionista minoritária a European Aeronautics Defence and Space Company (EADS), e isso facilita a entrada da empresa brasileira em outros mercados.

Apesar dos problemas envolvendo o setor espacial no Brasil, ambas as firmas destacam como ponto positivo do programa espacial brasileiro o projeto CBERS. Trata-se do único projeto ativo do programa espacial nacional de longa duração. Completou 20 anos em 2008. E quando as empresas participam de um projeto como o CBERS, destacou Ghizoni, ganham ao se capacitar e formar pessoas capazes de lidar com tecnologias de última geração, pois os requisitos para trabalhar na área espacial são maiores do que os para desenvolver um produto para uso civil.

A Opto ilustra bem isso: a participação no CBERS é fundamental para suas outras atividades, porque amplia sua capacidade de inovar. Um exemplo: por ser muito sofisticado, o sistema de imagem do CBERS exigiu da Opto a montagem de uma equipe de físicos e engenheiros treinados em desenho óptico. Essa mesma equipe trabalhou na câmera de fundo de olho, produto da área oftalmológica da empresa. Essa câmera fotografa toda a retina do olho. Apenas duas outras empresas em todo o mundo — uma japonesa e outra alemã — produzem equipamentos similares.

OS PRÓXIMOS PASSOS PARA O LANÇAMENTO DO CBERS-3

Segundo Jânio Koko, no momento o INPE está realizando testes para qualificação do projeto estrutural do satélite, em São Jose dos Campos (SP). Os modelos de engenharia dos subsistemas estão sendo entregues pelas empresas contratadas e deverão ser enviados para a China em agosto. A partir de setembro, um modelo de engenharia do satélite será integrado e o funcionamento e desempenho do satélite serão verificados. "Esses modelos de engenharia são semelhantes aos equipamentos que irão integrar os satélites de vôo, mas são fabricados com componentes não qualificados e não são submetidos aos testes ambientais de qualificação", explicou. Os componentes qualificados serão utilizados em modelos de qualificação e modelos de vôo dos equipamentos.

Além da Opto e da Equatorial, outras empresas, como Mectron, Cenic e Fibraforte, participam do projeto do CBERS-3, contratadas pelo INPE para desenvolvimento e montagem de partes dos subsistemas do satélite.”

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