Exportação de açúcar
Por Fernando Brito
“Nosso jornalismo investigativo, que é capaz de apurar tudo e mais um pouco quando se trata de alguns escândalos políticos [somente se forem contra o governo federal], “passa batido” quando o assunto é economia.
Semana passada, a ‘Folha de S. Paulo’ publicou matéria dizendo que o Brasil tinha deixado de produzir 4,7 bilhões de litros de etanol. Segundo o jornal, seca, geada, floração e canaviais velhos foram os motivos da redução da produção, de 16,4 bilhões de litros até outubro do ano passado, para 11,6
A palavra açúcar nem sequer é mencionada no texto.
Ora, a cana que produz um, produz o outro. É uma questão de decisão sobre o destino da moagem.
Houve quebra de safra, sim, como o setor sucroalcooleiro afirma. Dizem ter sido de 17% em relação ao ano passado.
Mas o que não dizem é que a cana disponível foi destinada preferencialmente à produção de açúcar.
Até os dados fornecidos pelas próprias usinas revelam isso. Ano passado (2010), até o final de outubro, segundo a associação das usinas paulistas, a fabricação de açúcar utilizou 45% da cana e a de etanol, 55%. Este ano (2011), também segundo os usineiros, foram 48,5% para o açúcar e 51,5% para o etanol. Em 2009, na mesma época, eram 44% contra 56% para o etanol.
Pode-se argumentar que é pequeno aumento e que as perdas do etanol sejam por conta da perda de qualidade da cana, medida num índice chamado de “Açúcares Totais Recuperáveis” (ATR). Mas, a crer nos comunicados dos próprios usineiros, não é essa a razão.
Este ano, dizem eles, “a concentração de ATR atingiu 137,83 kg por tonelada de cana-de-açúcar, 2,70% inferior aos 141,66 kg obtidos na safra anterior no mesmo período”. Nada dramático, considerando que, em 2009, era de 132,6 kg por tonelada.
E aí a gente vai ao ponto: a produção de açúcar não caiu, a não ser residualmente. Segundo os produtores, 4,5% menos que em igual período de 2010 (29,23 milhões de toneladas, contra 30,54 milhões). Bem menos que os 29% de queda na produção de etanol hidratado e que os 20% menos que o volume total de etanol (hidratado + anidro).
Repito, esses são os dados dos usineiros, que já fazem revelações importantes.
O curioso, porém, é que o Brasil continuou exportando açúcar exatamente nas mesmas quantidades. Segundo os dados do ‘Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior’, as exportações de açúcar brasileiro não se alteraram do ano passado para este ano: de 16,56 milhões de toneladas ante 16,77 milhões de toneladas em 2010, uma variação só de 1%.
Mas os ganhos das usinas exportando, ah, este foi mais do que doce: 30% a mais que em 2010: US$ 9,402 bilhões contra US$ 7,28 bilhões do ano anterior.
Dá para entender porque a cana virou açúcar e foi parar no porto em lugar de virar etanol e ir para o posto?
Este é o setor que se diz descapitalizado e precisando de ajuda?
A verdade é que a disponibilidade de etanol combustível brasileira passou a depender da volatilidade do mercado mundial de açúcar.
É só acompanhar a cotação do preço do açúcar no gráfico acima. Entre outubro de 2006, quando o produto custava 11,51 centavos de dólar por libra-peso, para outubro de 2008, antes da crise mundial, quando estava a 11,7 centavos de dólar, a oscilação foi discreta – máxima de 14 centavos e mínima de 9,1 centavos.
Depois, virou um “deus nos acuda”: começou 2009 a 12,24 centavos e ficou por aí enquanto a crise mundial afundava as economias centrais. Elas foram se recuperando e o açúcar terminou 2010 a 28,0 centavos de dólar por libra. Hoje, está a 26,0 centavos, depois de ter atingido 29,5 centavos há três meses.
Essa é a “crise do etanol”. Que não vai ser resolvida senão de duas formas. A primeira, que pode até acontecer em razão da crise europeia, é a queda do preço do açúcar. A outra, é o controle pelo Estado do destino da produção de cana, com o estabelecimento de cotas de exportação de açúcar.
O resto é só ‘press-release’.”
FONTE: escrito por Fernando Brito no blog “Projeto Nacional” (http://blogprojetonacional.com.br/a-cana-que-nao-vai-ao-posto-vai-ao-porto/)[imagem do google e trechos entre colchetes adicionados por este blog ‘democracia&política’].
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