Por Daniel Menezes, do “Carta Potiguar”
“Há várias maneiras de
manipular uma pesquisa de opinião (enviesar
perguntas, concentrar a aplicação em determinados grupos sociais ou regionais
etc). Mas é preciso também ficar atento ao modo como os números são
seletivamente apresentados pela imprensa. É que a manchete e a “análise” acabam
por levar o leitor a uma compreensão diferente do que está posto pelos dados.
Nesse sentido, a sondagem publicada ontem pela “Folha de São Paulo”, em que a
aprovação do governo Dilma cai 8 pontos, é significativa.
Alguns apontamentos:
01
– A pergunta de
escala (ótimo, bom, regular, ruim ou
péssimo) não é a mais indicada para medir “aprovação”. Ela serve para
“avaliar”. Por que ressaltar a diferença? Ora, porque o cidadão pode não estar,
circunstancialmente gostando do desempenho do governo, mas pode aprovar a
presidente. A questão não é só de nomenclatura. Avaliar é diferente de aprovar.
Veja que a confusão conceitual leva à conclusão jornalística de que Dilma está
menos “popular” (texto da Folha se
encontra abaixo, depois das minhas ponderações).
Exemplo concreto de
como a diferença é importante: Fernando
Henrique, durante a sua reeleição, tinha a gestão mal “avaliada”. No
entanto, sua popularidade como aquele que seria, supostamente, o mais capaz
para enfrentar a crise de 1998 fez com ele lograsse êxito em sua jornada.
02
– No infográfico do
levantamento é possível perceber que, dos 8% em queda, 6% saíram do “bom e
ótimo” e passaram para o “regular”. Esse movimento é típico do cidadão que
assim raciociona: “estou desconfiado em
relação a X fatores – daí a queda na avaliação –, mas ainda estou suscetível a aprovar o governo”.
O pequeno revés não
pode ser desconsiderado. Entretanto, está claro que o eleitor não saiu de sua
zona de conforto e ainda elegeria, se a eleição fosse hoje, a candidata do PT.
03
– O levantamento
deveria aliar a pergunta de avaliação (ótimo,
bom, regular, ruim ou péssimo) com a de aprovação (aprova ou não aprova). Desse modo, saberíamos se a queda foi de
avaliação e/ou de popularidade.
Minha sensação? Penso
ser improvável que a pergunta não tenha sido feita. Ninguém aplica uma pesquisa
de tamanha magnitude sem empreender um levantamento sobre diferentes aspectos e
enfoques, como foi o caso, conforme dados demonstrados sobre percepção do
cidadão em relação a outros cenários, corrida eleitoral etc.
Aliás, os jornais
tendem a não publicar aquilo que não “consideram” relevante. Quando faço
levantamentos, sempre entrego a pesquisa integralmente e é o períodico quem
seleciona o que vai entrar na reportagem. A linha ideológica do jornal dá o
viés de como as estatísticas serão demonstradas. E pelo modo como a Folha
sistematicamente [desde a queda da
direita do poder em 2002] pinta o Brasil como sinônimo de caos, acredito
que os números bons foram deixados de lado.
As manchetes negativas
imperam. Quando algo bom ocorre, o fato positivo é sempre contrabalançado com
um “mas”
e um evento desabonador depois – exemplo: Brasil
melhora nisso, mas isso, isso e
aquilo nos mantêm na pior posição e tal…
04
– Diz a Folha: “A presidente perdeu (“)popularidade(“) entre
homens e mulheres, em todas as regiões do país, em todas as faixas de renda e
em todas as faixas etárias, segundo o Datafolha”.
Qual é a base de tais
afirmações (terroristas)!?! Para isso ocorrer, seria necessário que todas as
submudanças regionais, de sexo e de renda ocorressem para além da margem de
erro em comparação a um contexto anterior. E é improvável que isso tenha
acontecido, dado o revés de 8% (subamostras
têm margem de erro maior). É uma fala jogada ao vento sem nenhum
embasamento técnico mínimo.
Tanto é que nenhum
número foi exposto.
05
– O texto diz
ainda: “Os números do Datafolha indicam
que a deterioração da imagem de Dilma é um reflexo do aumento do pessimismo dos
brasileiros com a situação econômica do país e mostram que a população está
mais preocupada com a inflação e o desemprego”.
Acho que estou sendo
repetitivo, mas é inevitável: qual a base de tais afirmações!?! Até acredito na
inflação como argumento (a matéria
demonstra um dado concreto quanto à inflação), mas não estamos em período
de “pleno emprego” e “renda acima da inflação”?!
O que fundamenta
análise tão “perspicaz”!?!
AUSÊNCIA
DE RIGOR CONCEITUAL
Produzo o meu doutorado
sobre o impacto, grosso modo, de pesquisas de opinião e eleitoral. E
impressiona o modo descuidado com que o “Instituto Datafolha” constroi conceitos
empregados nas suas sondagens. O assunto é preocupante, pois uma simples
palavra trocada/mal situada pode alterar a maneira como o respondente atribuirá
uma sentença.
Exemplo prático:
“Você
é a favor da homossexualidade?
Ou
Você
é a favor do homossexualismo?”
Em estudo recente, o
DataFolha aplicou a segunda indagação. Ora, a noção “homossexualismo”, ao
contrário de “homossexualidade”, tem carga valorativa negativa e carrega o
estigma de ter sido utilizada no passado como enquadramento patológico das
relações homoafetivas, algo que a Organização Mundial de Saúde já rechaçou.
Em que pese o erro
gritante, a Folha de São Paulo mobilizou alguns colunistas a se prestarem ao
vergonhoso papel de defender o uso do abolido termo médico.
CIRCUITO
DE LEGITIMAÇÃO
Na década de 1970, o
sociólogo Pierre Bourdieu já tinha “cantado a pedra” – a imprensa forma a opinião, repetindo-a pelos mais diferentes caminhos
e aspectos (vide o terrorismo contemporâneo no que tange o tema inflação,
tecendo comparações esdrúxulas entre o período anterior ao controle
inflacionário e o atual) e, ao término,
aplica uma pesquisa mostrando a suposta novidade – a “opinião pública existe e tem medo da inflação”.
É por essas e outras
que o estatístico americano George Gallup também denominava a pesquisa de
opinião como “método de manipulação da
opinião pública”.
Transcrição:
Da Folha:
A
popularidade da presidente Dilma Rousseff caiu pela primeira vez desde o início
de seu mandato, há dois anos.
Pesquisa
feita pelo Datafolha na quinta e na sexta-feira mostra que 57% da população
avalia seu governo como bom ou ótimo. São 8 pontos a menos que no levantamento
anterior, feito em março.
A
presidente perdeu popularidade entre homens e mulheres, em todas as regiões do
país, em todas as faixas de renda e em todas as faixas etárias, segundo o
Datafolha.
Os
números do Datafolha indicam que a deterioração da imagem de Dilma é um reflexo
do aumento do pessimismo dos brasileiros com a situação econômica do país e
mostram que a população está mais preocupada com a inflação e o desemprego.
Para
51%, a inflação vai subir. Em março, esse índice era de 45%. A mesma tendência
pode ser observada em questões sobre desemprego, poder de compra do salário,
situação econômica do país e do próprio entrevistado.
Apesar
da queda de popularidade, a presidente Dilma Rousseff continua sendo a favorita
para vencer a eleição presidencial do ano que vem.
No
cenário mais provável da disputa, em que teria como adversários a ex-senadora
Marina Silva (Rede), o senador Aécio Neves (PSDB) e o governador de Pernambuco,
Eduardo Campos (PSB), Dilma teria 51% das intenções de voto, segundo o
Datafolha.
São
sete pontos a menos que o verificado no levantamento anterior, de março. Mas
ainda assim é o suficiente para liquidar a eleição já no primeiro turno.
Em
segundo lugar, com os mesmos 16% da última pesquisa, aparece Marina, atualmente
engajada na criação de um novo partido político, a Rede Sustentabilidade.
Aécio
foi o único que cresceu em relação ao levantamento de março. Ele tem agora 14%
das intenções de voto, quatro pontos a mais que na pesquisa anterior.
Nessas
oportunidades, Aécio criticou o governo com muita ênfase na inflação, objeto de
crescente preocupação da população, conforme a mesma pesquisa.
Em
quarto lugar na pesquisa, com 6% das intenções de voto, aparece o governador de
Pernambuco, Eduardo Campos (PSB). O índice é mesmo obtido por ele no último
levantamento.
A
pesquisa foi realizada nos dias 6 e 7 de junho. Foram feitas 3.758 entrevistas.
A margem de erro é de 2 pontos percentuais para mais ou para menos.”
FONTE: escrito pelo doutorando Daniel Menezes, do “Carta Potiguar”. Transcrito no portal de Luis Nassif
(http://www.advivo.com.br/blog/luisnassif/o-que-a-pesquisa-datafolha-nao-mostrou).[Imagem
do Google e trechos entre colchetes adicionados por este blog
`democracia&política`].
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