“O
terrorismo mediático foi o grande vencedor da semana que findou, construindo o
ambiente de crise, inibindo investidores e consumidores e acuando o governo.
Por Roberto Amaral*, na revista “CartaCapital”
Por Roberto Amaral*, na revista “CartaCapital”
‘O boom, e não a retração, é o momento certo para a austeridade’.
(John Maynard Keynes)
(John Maynard Keynes)
No plano da discussão política, logrou dominar a pauta com as teses da ‘austerismo’ que estão asfixiando a Europa, ao dar prioridade aos credores sobre os trabalhadores. Essa opção está no cerne de um modelo econômico que não se preocupa com baixo crescimento e vê no desemprego e nos baixos salários solução para tudo.
Exultam os traficantes das bolsas e especuladores de todos os naipes. Suas vítimas são os trabalhadores e os assalariados em geral, e o crescimento já é apontado como inimigo do país. A grande imprensa comemora a queda da popularidade da presidenta. Ponto para os jornalões.
A inflação tem várias raízes. Tem as econômicas, as financeiras e tem as subjetivas, derivadas da criação da expectativa de sua eclosão. Se o ‘mercado’ precisa de inflação em alta, ele diz aos seus porta-vozes que haverá inflação e, falando todo dia em inflação, uma mera expectativa (artificial ou não) de inflação se transforma mesmo em inflação. O país que se dane. Esse jogo é o jogo do chamado e decantado ‘mercado’. Quanto mais invisível, mais senhor de baraço e cutelo da economia e da política, e todos conhecem os jogos de boatos fazendo subir e baixar ações para a acumulação dos especuladores.
Toda inflação pede combate, embora o sempre saudoso mestre Furtado nos lembrasse que uma pequena inflação como preço do crescimento poderia – e deveria – ser tolerada, desde que, claro, o crescimento lhe fosse superior. Era um pilar da sua crítica à política de Malan/FHC. Mas entre nós há inflação real, sob controle, e há uma inflação subjetiva, desejada, recessivista, saudosa do ‘austerismo’ estéril que só produz desemprego, queda de poder de compra dos salários, e muita concentração de renda.
As motivações são várias, desde evidentes intenções políticas (na verdade as eleições de 2014 já estão sendo travadas em 2013), às tentativas de desestabilização de governo, a desconstituição da parte boa de uma política econômica, a qual, com erros e acertos, jamais abdicou da busca do desenvolvimento (de que é produto objetivo o virtual pleno emprego), e da distribuição de renda, esta principalmente por intermédio dos reajustes do salário mínimo. Pois os reacionários já gritam como solução para o ‘surto inflacionário’: menos emprego e redução dos salários!
Toda inflação é intolerável, mas essa que aí está, cadente (em cinco meses só mostrou a cara em um!), em hipótese nenhuma representa ameaça ou desarranjo. Sua criação deriva da necessidade de abalar a popularidade da presidente.
Anunciando, há meses, uma pressão inflacionária que a população não vinha sentindo, a grande imprensa construiu a inflação necessária para voltar a falar na necessidade de promover desemprego, redução de salários, revalorização do real, ou seja, tudo aquilo que não interessa ao nosso povo e à nossa economia. Em doses homeopáticas, o receituário neoliberal que esta destruindo a União Europeia.
Quando o respeitável público resiste a se convencer de que a realidade de seu dia-a-dia não é uma tragédia, o mercado especulativo e seu porta-voz, a imprensa, lançam mão de ‘autoridades’ nativas e internacionais. São ‘consultorias’ comandadas por ex-funcionários do BC e até por ex-ministros como a de um ‘economista’ que no governo Sarney levou a inflação a 1.764,86 ano, entregando o ministério em março de 1990 com uma inflação mensal de 84%! As consultorias internacionais são verdadeiros cassinos, aquelas ‘agências’ que vendiam certificados de garantia para os bancos da Europa e dos EUA que estouraram em 2007/2008.
Agora, os ‘economistas mediáticos’ estão encantados porque a “Standard & Poor’s”, uma ‘agência de rating’, ameaça alterar sua própria classificação sobre o Brasil. Diz um comentarista entusiasmado com as notícias que vêm de fora: “Para os agentes do mercado e a mídia maistream, o que conta é a percepção [e não os fatos] de que a política econômica de Dilma Rousseff desandou de vez. O último prego no caixão foi a nota da “Economist”, reiterando criticas que já havia feito seis meses atrás”.
É assim a sabujice ideológica.
Se a Av. Paulista ou a Praça Mauá precisam do aumento do dólar, a alta do câmbio vem a trote. Nas duas hipóteses, várias fortunas se fazem. Não adianta dizer que a inflação, baixa, é cedente porque a grande imprensa diz que estamos sob ‘alta inflacionária’ e de tanto dizê-lo atende aos interesses dos sabidos e induz os incautos ao erro. Não adianta dizer e comprovar mil vezes que é mínimo o risco de a depreciação cambial contaminar a inflação (para cada alta de 10% no câmbio, há um incremento de 0,38 ponto percentual na inflação).
Os rentistas aplaudem, pois a receita é aumentar os juros e gastar divisas comprando dólar no mercado – isto é, enxugar gelo--, reduzir os gastos públicos (o que pode encerrar qualquer esperança de recuperação do crescimento econômico) e, com eles reduzidos, espantar os investimentos privados, magros como cadela abandonada, e o investimento estrangeiro.
Desestimulados diante do quadro mediático de incerteza, os ‘investidores’ optam pela certeza de lucros na jogatina das bolsas, aproveitando a alta dos juros.
A imprensa ecoa os ditames da “The Economist”, serviçal do FMI, responsável, com direito a autocrítica cínica, à receita imposta à Grécia, mais pobre do que jamais foi e, como nunca, sem expectativa de futuro a médio prazo. Contritos como o jacaré que vem de devorar sua presa, batem no peito numa mea culpa cínica para reconhecerem que ‘exageraram’ na receita imposta à Grécia. Quantos já morreram na Grécia? Quantos ainda morrerão? Quem irá para a cadeia ou para a guilhotina? É chegada a hora de um Tribunal Russel para apurar os crimes contra a humanidade, o genocídio cometido pelos tecnoburocratas do FMI e seus chefes, a banca financeira por eles cevada e impune no Brasil e no mundo.
Enquanto a necessidade do país é crescer, crescer e crescer, vêm os neoliberais reclamar da alta dos gastos, pedir a redução dos salários (que em 2013 já cresceram menos do que em 2012) e conclamar por menos emprego, indiferentes ao custo social que será cobrado ao país. Para baixar a inflação. Querem a depreciação do câmbio (isto é, a menor competitividade de nossos exportações de tudo e maior importação de tudo) para, diminuir a inflação. Querem matar o doente para que ele não tenha mais dor de cabeça! E, cínicos, cobram investimentos para acabar com nossos gargalos de infraestrutura e logística em geral e, ao mesmo tempo em que cobram o aumento de gastos e reclamam redução do superávit primário, com que o governo joga para dispor de mais recursos para mais investimentos. Reclamam do aumento do salário real, da ‘agregação de milhões de consumidores sem a necessária expansão da oferta”, reclamam da expansão do crédito e, até, do “crescimento de 7,5% [do PIB] em 2011” (Claudia Safatle, Valor de 14,15 e 16 de junho).
Há um terrorismo mediático. O objetivo de curto prazo é o governo Dilma mas, se não for contido, a vítima será o futuro de nosso pais.
Presidente Dilma, por favor não dê ouvidos aos áulicos da tragédia. Nosso desafio é crescer e nosso povo está interessado em renda (manutenção de seu poder de compra) e emprego. Não deixe o Ministério da Fazenda fazer mais cortes de gastos e ouça – quem diria!- o conselho de um velho liberal, Antonio Delfim Netto, em seu último artigo na “Carta Capital”: “Voltar a elevar a taxa de juros real é um caminho ruim, porque em primeiro lugar valoriza o câmbio e em segundo lugar reduz os investimentos, o que prejudica todo o desenvolvimento futuro”.
FONTE: escrito por Roberto Amaral, cientista político e ex-ministro da Ciência e Tecnologia entre 2003 e 2004. Publicado na revista “Carta Capital” e transcrito no portal “Vermelho” (http://www.vermelho.org.br/noticia.php?id_noticia=216467&id_secao=6 [Imagem do Google adicionada por este blog ‘democracia&política’].
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