quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Love story: O PENTÁGONO E A PRIMAVERA ÁRABE

Bandeira da Arábia Saudita



“Quem tenha acreditado que a ‘Primavera Árabe’ tomaria o Golfo Pérsico e aquelas terras conhecidas antigamente como ‘Arabia Felix’ [1] tem hoje muitos motivos para afundar em tristeza.

Por Pepe Escobar, no “Asia Times Online”

A contrarrevolução árabe está mais forte que nunca – comandada pela ‘Casa de Saud’ e suas monarquias aliadas do ‘Clube Contrarrevolucionário do Golfo’ (CCG), conhecido oficialmente como ‘Conselho de Cooperação do Golfo’ (CCG). E seu mais precioso aliado é o Pentágono.

O ‘New York Times’ oficializou a coisa, repetindo discurso dos especialistas da Casa Branca/Pentágono. Considerando-se que o NYT não é exatamente um ícone da credibilidade jornalística desde que, em 2002/2003, publicou como matéria de capa aquelas estrondosas mentiras sobre o arsenal atômico e/ou armas de destruição em massa que haveria no Iraque e as relações carnais que haveria entre o Iraque e a al-Qaeda, a fala dos especialistas tem de ser traduzida.

A crescente militarização do Golfo Pérsico contrarrevolucionário – que se dá, sobretudo, pelo aumento no número de coturnos no solo do Kuwait, e mais navios de combate – está sendo vendida como “resposta a um colapso da segurança no Iraque ou a um confronto militar com o Irã”.[2]

Observe-se que as duas ‘respostas’ são pura futurologia e desejo. As fontes marciais do NYT insistem: “a retirada [saída dos EUA, do Iraque] pode deixar instabilidade”. O fato é que o governo de Nuri al-Maliki em Bagdá efetivamente pôs os EUA para fora de lá (o Pentágono queria deixar pelo menos 20 mil pares de coturnos no solo iraquiano, depois do fim de 2011).

Daí a necessidade de rearranjar a novilíngua do ‘Comando Central do Pentágono’ [Pentagon Central Command (Centcom)], como se houvesse um Plano B, uma nova grande “arquitetura da segurança” para o Golfo Pérsico, já engarrafado de aviões e navios de guerra e até de mísseis de defesa, tudo vendido como se fosse mero “marcar presença na região, pós-Iraque”.

Quanto à “ameaça de um Irã beligerante”, interesses bem precisos – partes do complexo industrial-militar, todo o Partido Republicano, o lobby pró-Israel, a maior parte das corporações de mídia – pedem, há anos, um ataque ao Irã.

O major-general Karl R Horst, chefe do estado-maior do Centcom, é grande fã do “empenho em construir capacidades parceiras e parceiros capazes” (traduzindo: “ou vai, ou racha”). Horst vendeu ao NYT o aumento de poder de fogo no Golfo Pérsico como se fosse doce estratégia hollywodiana, tipo “de volta para o futuro”, focada em “deslocamentos menores, mas de melhores capacidades, e treinamento de parcerias com militares regionais”.

Traduzindo: muitas forças especiais, muitos aviões-robôs comandados à distância, os drones armados, e uma inflação das tais “parcerias” de que o Pentágono e a ‘Organização do Tratado do Atlântico Norte’, OTAN, tanto gostam. Isso é vendido como “modos mais eficientes para deslocar tropas e maximizar a cooperação com parceiros regionais”; ou como o melhor modo para “expandir relações de segurança”, sobretudo quando haverá “acentuado decréscimo no número de ‘analistas de segurança’ designados para a região” (traduzindo: os do lençol na cabeça que façam o trabalho pesado).

Também ajuda que o Catar e os Emirados Árabes Unidos (EAU) provaram seu ilimitado amor pela OTAN na guerra da Líbia (enquanto o Bahrain e os EAU garantem os coturnos no solo, no Afeganistão). Essa prontidão árabe para satisfazer os patrões vai um passo além do mantra padrão (“os EUA não abandonarão seus compromissos no Golfo Pérsico”).

Resumo da ópera: pensem nisso tudo com o ‘Clube Contrarrevolucionário do Golfo’ (CCG), também conhecido como ‘Conselho de Cooperação do Golfo’ (CCG), lá implantado como um anexo de fato, da OTAN.

POR TRÁS DA “ARQUITETURA DA SEGURANÇA”

Lá, longe, no Tadjiquistão – por onde andou examinando a não-proliferação da ‘Primavera Árabe’ na Ásia Central – a secretária de Estado dos EUA Hillary Clinton encorajou o que imediatamente foi vazado para o NYT como “robusta presença continuada” numa região que “deve ser liberta de qualquer interferência externa para que persevere num caminho para a democracia”.[3]

Quer dizer que... maior militarização do Golfo Pérsico é resposta contra a interferência externa de EUA/Arábia Saudita que atrapalham o curso para a democracia? Não, não pode ser. Alguém aí terá de reescrever o script.

Todo esse cenário já era previsível desde quando Washington fechou negócio com Riad [Arábia Saudita] para consolidar a contrarrevolução árabe: você nos dá o voto da Liga Árabe para derrubarmos Muamar Kadafi; e nós deixamos você em paz para fazer o que quiser no Golfo Pérsico (ver “Exposed: The US-Saudi”, Asia Times Online,2/4/2011em http://www.atimes.com/atimes/Middle_East/MD02Ak01.html).

Em seguida, a ‘Casa de Saud’ invadiu o Bahrain; o Catar pôs-se a treinar os ‘rebeldes’ líbios da OTAN em seu próprio território, ao mesmo tempo em que enviava forças especiais catarenses para a Líbia. E, agora, aí está: uma “aliança de segurança multilateral, mais forte” entre o ‘Clube Contrarrevolucionário do Golfo’ (ou ‘Conselho de Cooperação do Golfo’), CCG, e o Pentágono.

Senadores norte-americanos perdidos no espaço, a repetir que a retirada dos EUA do Iraque será interpretada “como vitória estratégica dos nossos inimigos no Oriente Médio”[4], é ‘business’, como sempre.

Mas coisa muito diferente é ver o NYT fazendo papel de bobos ¬ou, de fato, tratando os leitores como idiotas– e engolindo a ideia da propaganda saudita, segundo a qual “o Irã é a mais grave ameaça” que preocupa(ria) todos os países do CCG, “além do próprio Iraque”. É como se o jornal fosse editado em Riad.

Mas a verdade é que toda a política externa do governo Barack Obama para o Oriente Médio parece mesmo editada em Riad. Basta ver as grandes empresas de mídia curvadas até o chão para beijar a barra da túnica do novo príncipe coroado (o primeiro, na linha sucessória) da Casa de Saud, príncipe Nayef bin Abdul Aziz.

Nayef, 78 anos, sempre apoiado pelo ‘nec plus ultra’ do medievalismo e da contrarrevolução, maldita ‘Primavera Árabe’, é, em pessoa, o Inquisidor-mor da Casa de Saud. Desde 1975, comanda o aparelho de segurança no Ministério do Interior, o qual, com a Guarda Nacional treinada nos EUA, fiel ao frágil rei Abdullah, 87 anos, são os dois corpos mais bem armados da Arábia Saudita.

Nayef é o ‘Darth Vader’ de uma força paramilitar de 130 mil homens, de toda a polícia local e nacional, da alfândega, da imigração, da guarda costeira, da guarda de fronteira e da temida polícia religiosa. A resposta de seu ministério à ‘Primavera Árabe’ foi pancadaria sem parar. Todos os suspeitos de algum dia ter tentado iniciar uma manifestação política, para nem falar em movimento político, estão presos. O que inclui a rapaziada que distribuiu vídeos por YouTube.

Há, pelo menos, 20 mil presos políticos em prisões sauditas. Desde abril, é crime “ameaçar a segurança nacional” ou “insultar o Islã”. Nayef foi responsável pela imprecisão do texto da lei e tudo que isso implica. Quem se meter a tentar “Occupy Riad” ou “Occupy Jeddah” será decapitado.

E, para seus incontáveis fãs em Washington, que se emocionam com seus 36 anos de currículo ‘no contraterrorismo’, Nayef é um “conservador pragmático”. Virou título honorífico, desde que se leu a expressão em telegrama secreto, de 2009, ao Departamento de Estado dos EUA, revelado por WikiLeaks [5].

Não surpreende que Nayef seja amado em Washington. Santíssima Trindade, para ele, é Washington e Riad unidos pela pélvis: odeia o Irã e todos os xiitas (inclusive os xiitas sauditas); e é uma vida dedicada a combater a al-Qaeda.

Ninguém fala do ódio visceral que nutre por todos os direitos da mulher e por todos os direitos democráticos. É onde entra, utilíssimo, o rótulo de “conservador nas questões sociais”. No início da ‘Primavera Árabe’, Nayef declarou que os tunisianos eram “franceses, basicamente”. Dos habitantes da cidade do Cairo, disse que não passavam, todos, de “urbanos desavergonhados” [origiginal: “louche urbanites”]. Os únicos verdadeiros árabes eram os sauditas: democracia, para os sauditas (ou é o que a Casa de Saud pensa, por todos) é coisa para maricas.

Na política interna da Casa de Saud, aquele reino de intrigas palacianas, de machões solitários dos desertos que amam pintar os bigodes de negro-cor-da-asa-da-graúna, a principal oposição a Nayef não vem de seus irmãos, os poderosos “sete Sudayri”, que já são cinco (depois da morte do rei Fahd e, recentemente, do príncipe Sultan), batizados com o nome da tribo da mãe, Hassa, esposa favorita de Ibn Saud.

Gerontocracia é o nome do jogo: as condições de saúde dos irmãos Bandar, Musaid e Mishaal são precaríssimas. Quanto ao irmão Salman, governador de Riad, gosta de posar de jornalista: é dono do jornal ‘Asharq al-Awsat’.

Os principais opositores de Nayef são os sobrinhos de Ibn Saud, começando pelo matreiro ex-embaixador em Washington, Bandar bin Sultan, também conhecido como “Bandar Bush”; o príncipe Talal, pai do bilionário príncipe al-Waleed; o vice-ministro da Defesa Khaled bin Sultan; e o príncipe Turki al-Faisal, ex-chefe da inteligência nos anos 1980s e ex-amigão de Osama bin Laden.

Mas nenhum desses ameaçará Nayef; o que interessa à Casa de Saud é que a dinastia sobreviva. Com o rei Abdullah já às vésperas de reunir-se ao Criador, o Pentágono não poderia encontrar parceiro regional mais confiável: Nayef, o Inquisidor-mor.

Em breve, a OTAN reinará sobre todo o Mediterrâneo, lago da OTAN. O AFRICOM está implantando-se cada vez mais fundo, e fundo, na África. O CENTCOM reina no Golfo Persa, com todo o CCG em fila. Democracia é coisa para maricas. Não há ‘business’ como o ‘business’ da “arquitetura da segurança”.

NOTAS:

[1] Ptolomeu referiu-se à região como "Eudaimon Arabia" (gr.), em latim "Arabia Felix", “feliz Arábia” [NTs].

[2] NYT, 29/10/2011, Thom Shanker e Steven Lee Myers, “U.S. Planning Troop Buildup in Gulf After Exit From Iraq”, em http://www.nytimes.com/2011/10/30/world/middleeast/united-states-plans-post-iraq-troop-increase-in-persian-gulf.html?_r=1&pagewanted=all

[3] "The South Asian Times", “Clinton to Iran: Stay off Iraq”, em http://www.thesouthasiantimes.info/content/clinton-iran-stay-iraq

[4] Senador John McCain, 21/10/2011, em "Politico", em http://www.politico.com/politico44/perm/1011/respectfully_yours_3c6ac763-0157-4884-8c9d-bc4c8bc926c1.html

[5] “... mas, mais acuradamente, se pode descrevê-lo como um conservador pragmático, convencido de que segurança e estabilidade são imperativos para preservar o reino saudita e garantir prosperidade aos cidadãos sauditas” (trecho do telegrama 09RIYADH1402, 23/10/2009, em http://www.cablegatesearch.net/cable.php?id=09RIYADH1402)”.

FONTE: escrito por Pepe Escobar, no “Asia Times Online”. O autor é correspondente para o “Asia Times” de Hong Kong e Thailand e analista do “The Real News”, de Toronto e Washington. Transcrito no portal “Vermelho”  (http://www.vermelho.org.br/noticia.php?id_noticia=167731&id_secao=9) [imagens do Google adicionadas por este blog ‘democracia&política’. Postagem por sugestão do leitor Probus]

3 comentários:

Probus disse...

Israel contra o Irã

Ameaças, ameaças e só ameaças. Não passa disso.

05/11/2011, Uri Avnery, Gush Shalom
[Bloco da Paz]

Traduzida pelo pessoal da Vila Vudu

“Não há nem uma pequena, mínima, possibilidade de Israel atacar o Irã.”

(“As ameaças de Israel contra o Irã”, Uri Avnery, 5/4/2010, Counterpunch

Todos conhecem a cena, dos tempos de escola: o menino baixinho briga com o menino muito maior e grita para os companheiros: “Me segurem! Me segurem... Ou eu quebro a cara dele!”

O governo de Israel está fazendo exatamente isso. Todos os dias, em todos os canais de televisão, algum figurão do governo israelense grita que, agora sim, agora sim, Israel vai quebrar a cara do Irã.

O Irã está próximo de produzir bomba nuclear. Israel não pode permitir. Então... Israel vai detonar o Irã, reduzir o Irã a cacos.

Binyamin Netanyahu repete isso em todos os seus incontáveis discursos, inclusive no discurso de abertura da sessão de inverno do Parlamento israelense. Ehud Barak, também. Todos os comentaristas comentam o assunto. E a imprensa amplifica o som e a fúria. Mas o jornal Haaretz publicou na primeira página uma grande foto dos sete ministros mais importantes de Israel (o “septeto da segurança”): três a favor do ataque, quatro contra.

Há um ditado alemão que diz: “Revolução muito alardeada não quer acontecer”. Vale também para guerras.

Artefatos nucleares vivem sob estrito controle militar. Muito muito estrito. Hoje, o controlador militar das bombas atômicas israelenses apareceu sorrindo, deixando a coisa andar. Os meninos – o primeiro-ministro e o ministro da Defesa de Israel, exatamente os dois patrões do controlador militar das bombas israelenses – estão só brincando de atacar o Irã.

O respeitado ex-chefe, por muitos anos, do Mossad, Meir Dagan, falou publicamente contra qualquer ideia de Israel atacar o Irã. “Nunca ouvi ideia mais estúpida em toda a minha vida” – disse Dagan. Explicou que entende como seu dever alertar Israel contra a ideia de atacar o Irã... desde que ouviu falar dos planos de Netanyahu e Barak.

Na 4ª-feira, Israel enfrentou um tsunami de “notícias vazadas”: Israel testara um míssil capaz de transportar uma bomba atômica e “entregá-la” a mais de 5 mil km de distância, adiante, até, daquele país... vocês sabem qual. E a Força Aérea de Israel acabara de encerrar manobras na Sardenha, distância de voo maior, até, da que nos separa daquele país... aquele, vocês sabem qual. E na 5ª-feira, o Comando Doméstico fez exercícios por toda a cidade e arredores, na Grande Telavive, com sirenes berrando por todos os lados.

São movimentos que sugerem fortemente que tudo não passe de encenação. Talvez para assustar os iranianos. Talvez para empurrar os EUA a tomar ações mais extremas. Talvez, sim, toda a encenação tenha sido previamente combinada com os EUA. (Vazamentos britânicos também diziam que a Royal Navy britânica está em treinamento, preparando-se para apoiar um ataque dos EUA ao Irã.)

Vez ou outra, Israel usa a tática de agir como se os israelenses fôssemos doidos de hospício (“O dono da banca enlouqueceu” – como se ouve pelos mercados e feiras, sobre preços baixos demais). Israel cansou de ouvir conselhos dos EUA. O que temos de fazer é bombardear, bombardear, bombardear, bombardear.

Calma. Falemos sério, por favor. ISRAEL NÃO ATACARÁ O IRÃ. É isso. Ponto final.

Muitos dirão que me arrisco demais. Não seria melhor acrescentar “provavelmente”, ou “quase com certeza”? Não. Não acrescento coisa alguma. Repito e repito: ISRAEL NÃO ATACARÁ O IRÃ.

Depois da aventura de 1956 em Suez – que acabou por ordem do presidente Dwight D. Eisenhower – Israel nunca mais se envolveu em nenhum tipo de operação militar importante, sem a expressa autorização dos EUA.

Probus disse...

Os EUA são hoje o mais confiável apoiador com que Israel ainda conta (além das ilhas Fiji, da Micronesia, das ilhas Marshall e de Palau). Destruir essas relações será como cortar a mangueira de ar do escafandro. Para chegar a esse ponto, é preciso ser mais do que meio maluco: é preciso ser doido furioso.

Além do mais, Israel não pode entrar em guerras sem o apoio dos EUA, porque todas as bombas e todos os aviões de Israel vêm dos EUA. Em guerra, é preciso receber suprimentos, peças de reposição, todos os tipos de materiais. Durante a guerra do Yom Kippur, Henry Kissinger manteve uma linha de suprimentos, por avião, que operava 24 horas por dia. E a guerra do Yom Kippur foi piquenique, comparada com o que seria uma guerra contra o Irã.

EXAMINEMOS o mapa – providência que se recomenda sempre, antes de guerras.

http://redecastorphoto.blogspot.com/2011/11/israel-contra-o-ira.html

A primeira coisa que chama a atenção é o muito estreito Estreito de Ormuz, por onde passa 1/3 de todo o suprimento de petróleo transportado por petroleiros, para todo o mundo. Passa por aquela garganta praticamente todo o petróleo produzido na Arábia Saudita, Estados do Golfo, Iraque e Irã.

De ponta a ponta, o estreito mede cerca de 35 km. É a mesma distância de Gaza a Beer Sheva que, semana passada, os rojões de fabricação caseira da Jihad Islâmica cruzaram sem problema algum.

No instante em que o primeiro avião israelense entrar no espaço aéreo do Irã, o estreito será fechado. A Marinha do Irã tem mísseis em navios, no mar. Mas nem serão necessários. Para fechar Ormuz, bastam os mísseis em terra.

O mundo já está balançando, à beira do abismo. A pequena Grécia oscila, ameaçando cair e levar com ela grossas fatias da economia mundial. Ormuz fechado, e cortado o suprimento de quase 1/5 de todo o petróleo que as nações industriais do planeta consomem, é catástrofe difícil de imaginar.

Para reabrir o estreito à força, seria necessária grande operação militar (com muitos “coturnos no solo”, inclusive), maior que todas as dificuldades que os EUA enfrentam hoje no Iraque e no Afeganistão. Os EUA têm dinheiro para tudo isso? Ou a OTAN? Israel não compete nessa liga “de cima”. Mas, mesmo assim, estará terrivelmente envolvido na ação, no mínimo, na condição de alvo.

Em manifestação de unidade que só se vê muito raramente, todos os chefes dos serviços secretos israelenses, inclusive os principais diretores do Mossad e do Shin Bet, já se manifestaram publicamente, todos contrários à ideia de atacar o Irã. É fácil entender por quê.

Não sei, sequer, se a operação seria possível. O Irã é país de grande território, quase do tamanho do Alasca; as instalações nucleares estão dispersas por todo o território e, muitas delas, são subterrâneas. Ainda que se usassem bombas de penetração profunda, que explodem sob o chão, fornecidas pelos EUA, toda essa gigantesca operação só conseguiria conter os esforços iranianos por alguns poucos meses. Israel pagaria preço altíssimo, por resultados magros.

Claro também que, se a guerra começar por ação de Israel, imediatamente choverão mísseis sobre Israel – não só do Irã, mas também do Hezbollah e, talvez, também do Hamás. As cidades israelenses não são adequadamente defendidas contra ataques dessa magnitude. Morreriam muitos israelenses. As mortes e a destruição em solo israelense tornam totalmente proibitivo qualquer movimento de guerra contra o Irã.

Repentinamente, a mídia israelense só fala dos três submarinos israelenses, que logo serão cinco, talvez seis, se os alemães forem compreensivos e generosos. Os jornais dizem, abertamente, que esses submarinos garantem a Israel a possibilidade de “um segundo ataque nuclear” (?!), caso o Irã use ogivas nucleares (que o Irã não tem!) contra Israel. Mas o Irã pode usar armas químicas, claro, dentre outras armas de destruição em massa.

Probus disse...

E há também o preço político. O mundo islâmico fervilha. O Irã não é exatamente muito popular em parte do mundo islâmico. Mas, se Israel atacar o Irã, o ataque contra um dos principais países do mundo muçulmano unirá instantaneamente sunitas e xiitas, do Egito e Turquia ao Paquistão e mais. Israel estaria correndo o risco de converter-se em mansão de luxo, numa selva em fogo.

FATO É QUE toda essa conversa sobre guerra ao Irã, em Israel, serve a vários objetivos políticos, da política interna de Israel.

Sábado passado, os movimentos sociais de protesto voltaram às ruas. Depois de pausa de dois meses, grande número de manifestantes reuniram-se em Telavive, na Praça Rabin. Foi caso excepcional porque, no mesmo dia, vários rojões do Hamás estavam sendo disparados contra cidades próximas da Faixa de Gaza. Até agora, em situação semelhante, as manifestações sempre foram canceladas. Os problemas de segurança sempre foram vistos como maiores que quaisquer outros. Dessa vez, não. E as ruas encheram-se de manifestantes e protestos.

Havia também quem acreditasse que a euforia do festival Gilad Shalit teria apagado da opinião pública israelense a ideia de protestar contra o governo de Netanyahu. Não apagou.

Outro fenômeno curiosíssimo: a mídia, depois de vários meses aliada aos manifestantes que enchiam as ruas, acaba de mudar de lado. Repentinamente, todos os jornais, inclusive o Haaretz, opõem-se aos manifestos populares. Como que obedecendo a uma só voz, todos os jornais de Israel escreveram, na manhã seguinte aos protestos, que lá se reuniram “mais de 20 mil” pessoas. Bem. Estive lá e tenho alguma experiência com essas coisas. Havia naquela praça, no mínimo, 100 mil pessoas, a maioria, jovens. Mal se conseguia andar.

Os protestos tampouco acabaram, como dizem os jornais. Longe disso. Mas... que ideia melhor, para fazer calar os que clamam por justiça social, do que pôr-se a falar sobre a “ameaça existencial”?

Além do mais, para fazer as reformas que a sociedade exige, é preciso dinheiro. Ante a crise das finanças mundiais, o governo luta para reduzir o déficit do orçamento, temeroso de pôr em risco a posição de Israel no ranking dos países confiáveis para investimento externo. Assim sendo... de onde sairia o dinheiro para as tais reformas? Só há três fontes plausíveis: das colônias exclusivas para judeus nos territórios palestinos ocupados (mas... que estado judeu atrever-se-ia a pedir dinheiro aos colonos?); os judeus israelenses ortodoxos (idem); e o gigantesco orçamento militar.

Criada a possibilidade de guerra contra o Irã, a guerra mais crucial da história de Israel, quem sugeriria que se tocasse no sacrossanto orçamento militar? O país precisa de cada shekel, para comprar mais aviões, mais bombas, mais submarinos. Escolas e hospitais, é claro, que esperem.

Por isso, do ponto de vista de Netanyahu, Mahmoud Ahmadinejad é a salvação. Onde estaria Netanyahu, hoje, se não houvesse Ahmadinejad?

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03/04/2010: Me segurem!

Por Uri Avnery

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23/05/2010

Como Israel está destruindo Israel

Aleluia! O mundo detesta Israel!

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