quarta-feira, 24 de setembro de 2008

E AS LIÇÕES DO JOHN BUNYAN?

Li ontem no site Terra Magazine o texto abaixo, de Cláudio Lembo. O autor é advogado, professor universitário e político. Foi governador do estado de São Paulo entre 31 de março de 2006 e 31 de dezembro de 2006.

“Quem percorreu os longos anos do último século conheceu situações extravagantes. Conviveu com duas guerras mundiais, ambas suportadas na tolice de dirigentes de estados nacionais europeus.

Morreram milhões de pessoas e, no segundo conflito, as batalhas não se limitaram a meras ações militares. Transformaram a população civil em alvo preferencial da violência.

Não bastaram as guerras. Totalitarismos assenhorearam-se dos destinos de dois povos particularmente cultos - alemão e russo - e castraram as liberdades.

Foram além. Conceberam áreas de pleno terror, como os campos de extermínio idealizados pelos nazistas e os gulags edificados pelos comunistas.

O fascismo e o comunismo aniquilaram séculos de elaboração de idéias e instituições dirigidas à preservação da liberdade individual e dos mecanismos de limitação do Estado.

Foi tudo por água abaixo. Ou melhor, substituíram a boa água pelo sangue derramado pelas vítimas de colossais agressões antes desconhecidas pela História do Ocidente, salvo nas estreitas masmorras da Inquisição.

Houve mais. Crises econômicas na Alemanha antes do nazismo e a partir dos Estados Unidos nos anos amargos do crack de 1929. As sociedades viveram as conseqüências da má gestão econômica.

Milhares de trabalhos foram elaborados. Autores dedicaram-se a estudos sobre o tema. Conferências internacionais desenvolveram-se. Escolas foram criadas para a reflexão sobre os dois casos.

Tudo em vão. Nada se aprendeu. Ao contrário, a vaidade, inerente aos humanos, avolumou-se na mente dos operadores da economia. Mostraram-se incapazes de antever o futuro, a partir dos eventos citados.

Nada valeram as situações vividas. Ao contrário, agravaram-se. Quando os Estados Unidos conheceram a crise de 1929 ainda se encontravam presentes os princípios e os valores dos primeiros colonizadores.

A ética calvinista contava com espaços entre os americanos. Na Alemanha, a atenuante para a situação se colocava os efeitos do Tratado de Versalhes, documento considerado injusto e opressivo por intérpretes isentos.

Agora não há desculpas. Um bando de desavisados assumiu a direção de instituições financeiras e transformaram propriedades imobiliárias em meros registros contábeis.
Multiplicaram garantias reais ao infinito e no infinito encontraram o nada. O episódio lembra o Encilhamento, descrito por Taunay, ocorrido no Segundo Império, aqui no Brasil.

Não houve perdão. Até o hoje, o acontecimento - local e limitadíssimo - é examinado por quem aprende com a História. Bem diferente do que acontece com os operadores das economias centrais.

Querem amealhar seus proveitos de pronto. Lixe-se o público. Onde está o trust tão cantado em verso e prosa? Dilapidou-se a confiança, base fundamental do capitalismo.

É amargo o que se desenrola presentemente nos Estados Unidos. A empáfia das autoridades monetárias americanas se encontra corroída. Foram incapazes de fiscalizar suas próprias instituições financeiras.

Ofereceram tantas lições a todos os povos do mundo. Não foram capazes de cuidar de seu próprio quintal. Um quintal que desconsidera os valores centrais da cultura americana.

O capitalismo, antes modelado pela religião, se transformou em dramática máquina de ganho fácil. Sem limites e escrúpulos. As autoridades federais dos Estados Unidos esqueceram de agir.

Sempre prontos a dar lições aos outros povos, os dirigentes dos Estados Unidos necessitam recompor seus próprios princípios. Reavivar os seus valores morais.
As autoridades estadunidenses encontram-se obrigadas a uma profunda autocrítica. Fraudou-se, na crise atual, o mais significativo para um povo: o conceito de honra. Ou, o sentimento de confiança.

A linguagem singela do povo - como descrita por John Bunyan [autor do livro The Pilgrim'Progress, clássico da literatura puritana]- aponta para os princípios satânicos da vaidade e da hipocrisia. Eles aniquilam uma sociedade, no interior da Cidade da Destruição.”

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