Jude Webber, de Buenos Aires, escreveu para o semanário inglês Financial Times (li no UOL, em tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves):
“A surpreendente decisão da Argentina de pagar sua dívida de US$ 6,7 bilhões em moratória ao Clube de Paris de credores ocidentais usando fundos do Banco Central é um passo bem-vindo em direção ao fim de seu isolamento financeiro internacional, mas não adianta para aproximá-la de um retorno aos mercados de capital globais.
O momento do anúncio feito na terça-feira (2) parecia destinado a aliviar os temores que varreram Wall Street nas últimas semanas de que, com opções de crédito limitadas, um crescimento mais lento, políticas opacas sobre a inflação e a receita de suas principais exportações agrícolas apertadas pela
queda do preço das commodities, a Argentina pode estar rumando para outro calote.
"O governo está mudando de rumo... É um passo na direção certa, embora um passo muito caro", disse Pablo Goldberg, analista do Merrill Lynch em Nova York. "Mas não acho que isso deva ser visto como o início de uma mudança séria e significativa na orientação das políticas."
Uma importante produtora de soja e óleos vegetais, a segunda maior economia da América do Sul foi cortada dos mercados de capitais desde que entrou em moratória da maior dívida soberana da história, em uma crise em 2001-02.
Processos dos detentores dos títulos, que recusaram uma reestruturação em 2005 e hoje têm a receber US$ 29 bilhões, incluindo juros, impediram a Argentina de recorrer aos mercados de capital desde então.
As autoridades vêem os planos da Corporação para o Desenvolvimento Andino e do Banco Interamericano de Desenvolvimento de emitir dívida em pesos como um sinal bem-vindo do aprofundamento dos mercados locais, uma importante fonte de financiamento do governo. Mas o governo argentino tornou-se cada vez mais dependente de sua rica aliada, a Venezuela.
No entanto, os mercados ficaram assustados no mês passado depois que o governo vendeu um título de sete anos para Caracas com uma taxa de juros de quase 15%, somente para ver o presidente venezuelano, Hugo Chávez, vendê-lo imediatamente, fazendo despencar os títulos em Buenos Aires e provocando uma recompra de emergência da dívida pelo governo argentino, para restabelecer a confiança.
Diante disso, a Argentina não deveria ter problemas. Os gastos públicos continuam altos, mas há superávit comercial e orçamentário, o Banco Central tem US$ 47 bilhões em reservas e o governo diz que a economia cresceu 8% no primeiro semestre deste ano. Há sinais de desaceleração, mas um crescimento sólido é esperado para o ano inteiro.
No entanto, os investidores ficaram preocupados com sua recusa a abordar problemas como a desconfiança quase universal dos dados oficiais sobre a inflação, e o medo de que o país possa ter dificuldades para cumprir as obrigações financeiras em 2009.
Michael Gavin, economista chefe do fundo hedge Citadel Investment Group, notou "uma falta de disposição para aumentar ou adiar a exposição à dívida argentina".
Falando sob a condição de anonimato, uma autoridade sênior disse ao "Financial Times": "É importante que o governo tenha uma estratégia de financiamento, o que infelizmente não tem até agora. O que deixou isso claro foi a colocação para a Venezuela, o que demonstrou, para dizer o mínimo, falta de profissionalismo. Parecia improvisação".
Eduardo Blasco, da consultora argentina Maxinver, disse que o país precisava no máximo encontrar US$ 15 a 20 bilhões no próximo ano - cerca de 5% do PIB. "Em qualquer país normal as pessoas ririam da idéia de ter de encontrar 5% do PIB provocaria um calote... mas não se trata de números, os números na verdade são administráveis."
A presidente Cristina Fernández disse que a decisão do Clube de Paris demonstrou a "disposição [da Argentina] a pagar" suas dívidas.
Mas sua decisão de pagar aos credores ocidentais de uma tacada vai sair mais cara do que renegociar a dívida, uma opção que ela recusou porque significaria submeter-se ao escrutínio do Fundo Monetário Internacional, que ela acusa pelas políticas que levaram à crise de 2001-02.
O país saldou sua dívida ao FMI de US$ 9,5 bilhões em 2006 em uma operação semelhante e nunca mais quer se endividar com o credor global.
Daniel Marx, um ex-secretário das Finanças da Argentina, diz que acertar a dívida com o Clube de Paris teria apenas um impacto limitado para melhorar o sentimento sobre a saúde financeira da Argentina. "Lidar com o departamento
de estatísticas teria muito mais impacto", ele disse.
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