O Jornal do Brasil publicou o seguinte artigo de Mauro Santayana (li no blog “De um sem Mídia”):
“Irritou-se o Estado de Israel com a visita anunciada do presidente do Irã a Brasília. Não se tratou de uma declaração, comum na diplomacia, de que Tel Aviv lamentava o encontro entre Ahmadinejad e Lula, o que marcaria uma posição, mas seria tolerável. Israel foi além, ao convocar o embaixador brasileiro para ouvir suas queixas e ao recomendar, publicamente, que cancelássemos o encontro. A resposta de Lula e Amorim se fez em termos diplomáticos, mas firmes.
Seria reduzir o país a um sobanato, se sua diplomacia pedisse licença a outrem para receber um chefe de Estado estrangeiro. O país tem mantido sua linha de coerência contra o racismo, qualquer racismo – é importante que se ressalve. Como explicou Celso Amorim, não concordamos com as críticas do presidente do Irã a Israel e não aceitamos a sua negação do Holocausto. Como o presidente Obama, defendemos a existência de dois Estados independentes no antigo território da Palestina.
O Estado de Israel se encontra em momento difícil. Ele ainda não se consolidou na História. Sessenta anos é pouco tempo para confirmar-se um Estado nacional, sobretudo quando o território é contestado pelos vizinhos, nas circunstâncias muito peculiares de sua criação. Muitos pensadores judeus, ainda que em minoria, retornam à ideia de que seria melhor para o seu povo integrar-se plenamente à humanidade, mantendo, é certo, seus valores religiosos e sua cultura. Entende-se que, perseguidos durante séculos, eles quisessem dispor de um lar nacional. Compreende-se, mais ainda, que a estupidez do nacional-socialismo, depois do antissemitismo que se exacerbara em toda a Europa no século 19, tornasse dramática e urgente essa necessidade. O fato é que a ocupação da Palestina pelos judeus europeus, com o apoio das Nações Unidas, significou o sofrimento para milhões de outras pessoas – incluídos judeus sefaraditas. Os palestinos não tinham como lhes fazer frente, do ponto de vista bélico, e têm sido massacrados desde então. A consequência da injustiça não poderia ser outra: Israel não terá paz, enquanto não reconhecer o direito dos palestinos.
Os israelenses sempre contaram com o apoio dos Estados Unidos, mas o povo norte-americano está hoje reexaminando seu destino no mundo. Há, pela primeira vez na História, com o fim da bipolaridade, e o surgimento de novos centros de poder, a constatação de que os impérios se tornaram peremptos. Estamos condenados a encontrar forma de coexistência entre povos, civilizações, culturas e crenças religiosas, sem a coação de umas sobre as outras. É alentador que a consciência dessa necessidade esteja ganhando os povos. O mundo, para o bem e para o mal, se tornou transparente, e começamos a compreender que nele há espaço para todas as culturas, menos aquelas que pretendam eliminar as outras. Fora disso, será o impensável. Nessa nova realidade, Israel acabará sendo compelido a respeitar o direito do povo palestino ao seu espaço nacional.
Todo o poderio militar – e nuclear – de que dispõe é inútil, sem o apoio de Washington e de países da Comunidade Europeia. Cresce a oposição, externa e interna, à sua política, depois dos bombardeios contra os vizinhos encurralados na Faixa de Gaza. Até mesmo seus soldados denunciaram os crimes de tortura e o assassinato, frio, de civis palestinos, entre eles crianças e velhos indefesos, sob o estímulo dos fanáticos religiosos, que os incitavam ao extermínio total da população, nos recentes massacres. O Brasil faz bem em não aceitar o protesto de Israel, que pode erguer arbitrários muros em fronteira ilegítima, mas não tem o direito de controlar a porta de nossa casa.
Mais do que os jornalistas e as empresas de comunicação, os cidadãos devem saudar o fim da Lei de Imprensa. O STF, mantendo-se na sua prerrogativa de tribunal constitucional, não poderia deixar de considerá-la contrária aos dispositivos da Carta Política. Isso não significa permissão para que os jornalistas caluniem, difamem e injuriem. Se o fizerem, estarão incursos na legislação penal ordinária, como qualquer pessoa. São duas coisas distintas: a liberdade de imprensa e a violação do direito individual à honra. O Congresso terá que assegurar, pela lei, o direito de resposta. O jornalista, ao redigir um texto, deve entender que só ele, e mais ninguém, é responsável pelas consequências de seus atos.”
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