domingo, 10 de março de 2013

CHÁVEZ MORREU COMO OBJETO DA HISTÓRIA



Como tantos personagens da América Latina, Hugo Chávez morreu como objeto da história.

Por Paulo Moreira Leite, na revista “Istoé”

“Não teve direito a contar sua própria versão dos fatos. Não foi ouvido nem pôde explicar-se. Foi explicado, analisado e julgado – por adversários e inimigos.

Num continente onde a elite política convive com a má consciência de quem nada fez de relevante pela melhoria das condições de vida do povo, mas nem por isso abre mão de 100% do conforto que só um imenso egoísmo social permite, o combate a toda liderança nascida fora de seu berço é uma necessidade permanente.

Se ainda em 2012, 58 anos depois daquele tiro no peito, ainda se publicam livros em que Getúlio Vargas é chamado de fascista, salazarista, franquista...

Sabemos o que se faz com Lula. Imagine-se o que será feito com Chávez.

Embora um de seus antecessores estivesse na lista de autoridades pagas pela CIA, Chávez é chamado de inimigo da democracia.

Embora tenha sido vítima de um golpe de Estado articulado por empresários e militares conservadores e com apoio imediato de Washington, foi chamado de autoritário. Fez um governo que pela primeira vez enfrentou um ambiente de desigualdade social histórica e foi chamado de populista. Melhorou a saúde pública, especialmente os índices de mortalidade infantil, para patamares aplaudidos pela OMS. Foi chamado de demagogo.

A retórica é conhecida. Para se recordar que há muito a ser feito -- o que é certíssimo --, tenta-se minimizar o pouco que conseguiu ele realizar, ainda que este seja essencial para quem não tinha nada.

É um problema de ponto de vista. É assim na história daqueles que não conseguiram o direito de narrá-la. Mas algo está mudando e Chávez, com suas qualidades e seus defeitos, é parte dessa novidade. Sempre se evitará comparar Hugo Chávez com seus adversários, por uma razão muito simples. 

Na soma de qualidades e defeitos, acertos, erros e desastres, seus antecessores foram muito piores. E é por isso que, mesmo com inflação alta, crescimento baixo e até falta de comida em determinados momentos, nunca deixou de vencer eleições, cuja legitimidade sempre foi reconhecida por observadores isentos, como Jimmy Carter.

A falta de espelho permite grandes atrocidades – morais, políticas, históricas – sem que seja possível corar de vergonha.”

FONTE: escrito por Paulo Moreira Leite, da revista “Istoé”. Transcrito no portal de Luis Nassif (http://www.advivo.com.br/blog/luisnassif/paulo-moreira-leite-chavez-morreu-como-objeto-da-historia). [Imagem do Google adicionada por este blog ‘democracia&política’].

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