sexta-feira, 26 de abril de 2013

Delfim Netto : “A POLÍTICA DE DESVALORIZAÇÃO MONETÁRIA”


Da “Folha”


Por Antonio Delfim Netto

“Quando em 2010 o ministro Mantega usou a expressão "guerra cambial", para caracterizar a consequência não intencional da política de afrouxamento monetário dos bancos centrais dos países desenvolvidos, foi submetido a um impiedoso ataque dos sacerdotes que se supõem os guardiões da "verdadeira" teoria econômica com relação à qual, aliás, diziam que ele teria pouca familiaridade...
  

Assistimos a um festival externo e interno de obviedades e cinismo. Ben Bernanke, do FED, declarou que o valor do dólar americano flutuava "ao sabor do mercado" e que nunca fora objeto de preocupação explícita da política econômica dos EUA. Mario Draghi, do Banco Central Europeu, disse quase a mesma coisa. Revelou que o valor do euro era sim uma preocupação da política econômica da Comunidade Europeia, mas não era seu objeto.

As respostas ignoravam o problema levantado pelo ministro brasileiro. Ele nunca afirmou que havia uma política explícita de desvalorização das moedas. O que ele afirmou, e afinal verificou-se que é verdade, é que, mesmo não tendo essa intenção, a política monetária que expande a liquidez para combater a recessão produz aquele efeito colateral. E o que importa é o efeito da medida, não a sua intencionalidade.

Pois bem. Um recente e competente trabalho dos economistas Reuven Glick e Sylvain Leduc ("Unconventional Monetary Policy and the Dollar", abril, 2013), do “Federal Reserve Bank” de San Francisco, concluiu que, "mesmo quando o FED não objetiva o dólar, o anúncio de mudanças na política monetária pode alterar o seu valor. Antes da crise financeira de 2007-2009, o valor do dólar costumava cair quando o FED reduzia taxa básica ("federal funds"). Desde a crise, os anúncios da expansão monetária, através de mecanismos não convencionais (o "monetary easing"), têm tido efeito semelhante no valor do dólar".

O trabalho mostra que as "surpresas" produzidas pelo aumento da liquidez que resulta da política monetária laxista têm efeito substancial sobre o valor do dólar. "De fato --conclui o artigo--, um afrouxamento monetário não esperado que reduz em 1% a taxa de juros dos bônus do Tesouro de longo prazo, produz, em 30 minutos, um declínio de 3% do valor efetivo do dólar".

Como todo trabalho econométrico, esse também espera contestação. Enquanto ela não vier, temos de nos render ao fato de que o ministro tinha alguma razão.

Isso mostra como é ilusória a ideia que, em algum lugar ou em algum tempo, tenha existido um sistema de câmbio ‘livremente flutuante’, independente das políticas fiscal e monetária.”

FONTE: escrito por Antonio Delfim Netto. Publicado na “Folha de São Paulo” e transcrito no portal de Luis Nassif  (http://www.advivo.com.br/blog/luisnassif/a-politica-de-desvalorizacao-monetaria-por-delfim-netto). [Imagens do Google adicionadas por este blog ‘democracia&política’].

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