“Haddad lidera reformas indispensáveis para tirar a cidade do caos. A velocidade dos ônibus já deu um salto de 45%. Mas o “dinheiro grosso” barra novos avanços.
Por Saul Leblon
A velocidade dos ônibus em São Paulo registrou um salto de 45% em 2013 (de 14,2 kms/h para 20,6 kms /h).
Três milhões de pessoas ganharam 38 minutos por dia fora das latas de sardinha, que agora pelo menos andam.
Embora a maioria ainda desperdice mais de duas horas diárias em deslocamentos pela cidade, é quase uma revolução quando se verifica a curva antecedente.
Ninguém pagou mais por isso: as tarifas estão congeladas desde junho sob a pressão de protestos legítimos liderados pelo “Movimento Passe Livre”.
Financiar a tarifa e modernizar o sistema com 150 km de corredores exclusivos (as faixas já passam de 290 km) , seria a tarefa do aumento progressivo do IPTU previsto pelo prefeito Fernando Haddad.
A coerência entre os meios e os fins é irretocável.
1/3 dos moradores mais pobres de SP não pagariam nada de IPTU em 2014; os demais, em média, contribuiriam com um adicional de R$ 15,00 ao mês. Os boletos dos mais ricos, naturalmente, transitariam acima da média.
O matrimônio de interesses expresso na aliança entre FIESP, PSDB e a toga [TJSP e STF] colérica implodiu esse reajuste.
Como Nero, eles querem ver São Paulo pegar fogo para culpar os adversários (os cristãos, no caso do imperador).
Em meio às labaredas, emergiria o palanque conservador como a escada Magirus que os reconduziria com segurança ao [Palácio] Bandeirantes e, quem sabe, ao Planalto.
O “dinheiro grosso” fornece a gasolina; o tucanato fino de Higienópolis entra com o maçarico.
‘Bum!’, diz a mídia obsequiosa que estampa a foto de Haddad com a legenda: “o culpado é o oxigênio”.
Depois de subtrair R$ 40 bilhões por ano do sistema público de saúde, ao extinguir a CPMF, eles não hesitam, agora, em usar o sofrimento da população como recheio do seu pastel de vento eleitoral.
É o de sempre, ataca Haddad: “a coalizão da casa-grande contra a senzala”.
Eles retrucam estalando o chicote da mídia.
A rede de ônibus da capital (linhas e fretados) transporta 68% das população e ocupa somente 8% das vias urbanas.
A frota de automóveis transporta 28% e ocupa cerca de 80% do espaço das vias.
A informação é da urbanista Raquel Rolnik, em artigo reproduzido no portal “Viomundo”.
A rigor, portanto, a mobilidade melhorou para a maioria dos habitantes da cidade, com uma redistribuição pontual do uso do espaço viário.
Mas a emissão conservadora atiça o fim de ano da classe média com bordão do caos no trânsito –por "culpa do privilégio concedido aos ônibus".
Na edição de sábado (21/12), o jornal “Folha de SP” estampa a manchete capciosa em seis colunas, no caderno “Cotidiano”: ‘Trânsito piora, e ônibus anda mais rápido’.
No manual de redação dos Frias, “trânsito” é sinônimo de “transporte individual”...
Há um traço comum entre esse entendimento do que seja interesse coletivo e individual e o belicismo conservador contra o programa ‘Mais Médicos’.
O programa subverteu a lógica protelatória e alocou médicos estrangeiros, cubanos em sua maioria, ali onde os profissionais locais não querem trabalhar: periferias conflagradas e socavões distantes.
Produz-se, assim, uma mudança instantânea na vida de 16 milhões de brasileiros até então desassistidos.
Quantos não morreriam à espera do longo amanhecer incremental preconizado pelo conservadorismo?
A dimensão estrutural desse antagonismo perpassa a luta pelo desenvolvimento brasileiro desde Getúlio.
Reformas de base ou a delegação do futuro da economia e do destino da sociedade aos mercados?
Em 1964, o pelourinho midiático, a FIESP e o tucanismo, na versão udenista, resolveram a pendência da forma sabida.
Meio século depois, São Paulo reproduz em ponto pequeno a mesma confluência de interesses que se reivindica o direito consuetudinário de tocar fogo no canavial e estalar o açoite para fazer a moenda girar.
Primeiro, a garapa; o resto a gente conversa depois.
Com a tigrada guardada nas senzalas.
Ou imobilizada em ônibus-jaula.
A gestão Haddad precisa modular o ‘timming’ de suas ações para discuti-las antes com a população.
Tem agora um inédito conselho de participação popular para isso.
Mas é indiscutível que o prefeito lidera hoje um conjunto de reformas imperativas, as reformas de base da São Paulo do século XXI.
Sem elas, a cidade afundará no destino que lhe reservou a elite brasileira branca e plutocrática: ser um exemplo de viabilidade de uma das mais iníquas versões do capitalismo no planeta.
Esse é o embate dos dias que correm na metrópole.
Diante dele, o silêncio de quem liderou os protestos de junho chega a ser desconcertante.
Mas não é inédito.
Há inúmeros antecedentes gravados na história com os predicados de cada época .
E nenhum deles é inocência.”
FONTE: escrito por Saul Leblon em editorial do site “Carta Maior” (http://www.cartamaior.com.br/?/Editorial/Tocar-fogo-em-SP-meta-do-conservadorismo-em-2014/29865).
Nenhum comentário:
Postar um comentário