Embaixador Arnaldo Carrilho
Artigo
de Arnaldo Carrilho, primeiro
embaixador do Brasil (2009-12) na Coreia do Norte
“Fosse
ainda vivo, o teórico da propaganda política e da publicidade comercial, Edward
Bernays, franziria o cenho diante das invectivas
bélico-nucleares do governo norte-coreano contra o norte-americano.
Por
outro lado, as reações de Washington à mobilização gigante e à declaração de
guerra do país fundado por Kim Il-sung e dirigido por seu
neto Kim Jong-un revelam inegável
preocupação com uma das nove nações nuclearizadas do planeta.
Jamais
se chegou a um consenso sobre a origem da divisão da península coreana durante
a Conferência de Potsdam (1945): partira
de Stalin ou de Truman? Curiosa proposta essa, de criarem-se duas áreas de
ocupação num país não beligerante.
Kim
Il-sung
Na
prática, a divisão territorial de um povo muito antigo acoplada às explosões
atômicas de Hiroshima e Nagasaki e às invasões soviéticas da Manchúria e do
Japão marcaram o início da Guerra Fria. Na prática, convém repetir, porque a
tomada de Berlim e a mentalidade antianarquista e anticomunista reinante nos
EUA não devem ser esquecidas nessa ontologia guerreira de disputas ideológicas
em aparência, conquanto intrinsecamente estratégicas.
Os
EUA se empenharam desastradamente em “não perder a China”, conceito vezeiro no
Departamento de Estado, de modo que os ocupantes designados teriam de ser
implacáveis. Até 1948, data oficial da desocupação, registraram-se massacres de
mais de 200 mil pessoas. Os massacres de esquerdistas e sociais-democratas, já
empregando “mão de obra” nacional, estão inscritos como ultrajes históricos dos
coreanos. Já da ocupação soviética ao norte comenta-se pouco, salvo quanto ao
treinamento de tropas e entrega de equipamento militar.
Kim
Jong-un
Os
norte-coreanos, e também multidões no mundo inteiro, forçoso reconhecê-lo,
acham justo que, no processo de desenvolvimento nuclear, suas forças armadas
contem com armas e explosivos originados em tais pesquisas.
Em
outras palavras, como os cinco do Conselho de Segurança das Nações Unidas não
puseram cobro ao aperfeiçoamento de seus artefatos nucleares, outros países
asiáticos - Índia, Paquistão, Israel e RPDC (República Popular Democrática da
Coreia) - decidiram adotá-los. Com a saída da última do TNP (Tratado de Não
Proliferação) em 2006, nenhum deles se vê obrigado a proibir os engenhos, mas
só um é sancionado, a Coreia do Norte.
fronteira
N-S no Paralelo 38
O
problema central da questão coreana é o da sua reunificação: duas ocupações
depois de 1945, uma guerra em que pereceram 2,5 milhões de civis, um armistício
com o sul que acaba de ser denunciado e uma fronteira tida como “desigual” pelo
norte, na verdade, tornaram-se empecilhos menores que o causado pela falta de
negociações de Pionguiangue (Pyongyang, em grafia prosódica inglesa) com
Washington. Não que inexistam contatos.
Há,
porém, equívocos, que se acumulam nas incursões diplomáticas que houveram. A
militarista RPDC tem opositores em Washington, e não apenas nas hostes mais
acirradamente anticomunistas dos republicanos: o Pentágono, eis aí.
Mapa do conflito coreano
de 1950 a 1953
Se
a China é crescentemente visada e a Rússia passou a dispor de prioridades nas
pranchetas de planejamento militar dos EUA, não é difícil inferir-se que o
regime sem par da RPDC, verificando que é, mais que abandonado, acuado com
severíssimas sanções das Nações Unidas, reage conforme suas prementes
necessidades de fazer-se valer perante o mundo.
A
questão coreana é um tema que merece mediações, envolvendo Washington
principalmente, Moscou, Pequim, Seul e Tóquio.
Por
que não encarregar do assunto emissários especiais de países não nuclearizados
e fora dos esquemas de alianças defensivas? Por que não um membro do mecanismo
BRICS?
Afinal,
o vienense Edward Bernays precisa do seu merecido descanso, após 104 anos de
existência."
FONTE: escrito por Arnaldo Carrilho, consultor de
negócios com o Oriente Médio e Ásia. Foi o primeiro embaixador do Brasil
(2009-12) na Coreia do Norte. Postado por Castor Filho no blog “Redecastorphoto” (http://redecastorphoto.blogspot.com.br/2013/04/crise-na-coreia-acumulo-de-equivocos.html) [Imagens do google adicionadas por este blog 'democracia&política' por dificuldade do blogspot em fazer upload das imagens originais].
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